Localização do Estado de Gaza:

No seu auge “o Império de Gaza integrava a baía de Maputo e o rio Zambeze, correspondendo às actuais províncias de Maputo, Inhambane, Gaza, Manica e Sofala“.

Do Mfecane à formação do Império de Gaza

Antes do século XIX, as bacias do rio Limpopo e do rio Incomáti nunca tinham sido incluídas em unidades políticas externas de tipo territorial, e até princípios do mesmo século havia muitos reinos com agregados populacionais entre três a vinte mil habitantes. O nível da vida dos chefes, superava ao da população devido a tributos que dela recebiam.

A situação anteriormente descrita, alterou-se como consequência de um período de lutas violentas e de transformações políticas conhecidas por M’fecane, na região de Zululândia, e seguido por um extenso movimento de migrações, encetado pelo grupo Nguni.

Causas do Mfecane

“Crescimento da actividade comercial com a Baía de Maputo. Os Nguni exportavam marfim e importavam lingotes de latão e braceletes e têxteis, provocando conflitos inter – linhagens para o controlo das rotas comerciais ao longo do litoral e para o interior“. (Serra, 2000)

No fim do século XVIII e início do século XIX, os conflitos agudizaram pela crise ecológica, que deu lugar sucessivos anos de seca e fome, devido a extinção das pastagens, escassez de recursos hídricos, manadas de elefantes e de bovinos;

Consequências do M’fecane;

Durante as lutas para o controlo dos poucos recursos naturais, o número de unidades políticas, que estava acima de 20 reinos extinguiu, reduzindo-se para dois grandes reinos: o de Mtétua chefiado por Dinguisuaio e Nduandue dirigido por Zwide.

Ngungunhane, imperador de Gaza

Entre 1816 a 1821, eclodiu uma guerra entre estes dois reinos, que culminou com a captura e morte de Dinguisuaio. Este foi substituído por Tchaka (1818 – 1828), e logrou sucessos sobre os Nduandue submetendo uma parte deles. Em 1820 e 1821 umas partes dos Nduandue, temendo do Tchaka Zulu fugiu para terras longínquas onde se sentisse apaziguada, e entre os Nguni emigrantes, encontravam-se: – Três grupos a mando de Zuangendaba, Nqaba Msane e Nguana Maseko que se fixaram por algum tempo, em Niassa e Tete por volta de 1890; – um grupo chefiado por Sobhuza orientou-se para o norte e formou o reino Swázi; – outro grupo chefiado por Mzilikazi deslocou-se para oeste depois para o norte e formou o reino Ndebele; e ainda um grupo Nguni chefiado por Soshangane ou Manicusse veio para o sul de Moçambique. e de acordo com Cabral ( l97l), entre os anos 1821 a 1830, como consequência do M’fecane, Soshangane e seus guerreiros, instalados em Delagoa Bay (Maputo) formaram  um grande império, que ia desde o rio Incomáti até ao Zambeze, cujo a capital era Chaimite, apelidou-o com o nome do clã do seu avô Gaza.

A sucessão dos reis

Após a morte de Soshangane (1821 – 1858) em Bilene, que foi o fundador e primeiro imperador do Estado de Gaza, sucedeu-se um período de guerras entre seus filhos: Mawewe exilado e morto na Suazilândia, que o sucedeu, e Muzila que depois de derrotar o irmão tomou o poder transferindo a capital do império para Mossurize na província de Manica.

Foi em Mossurize em que o neto do Soshangane de nome Ngungunhane ou Leão de Gaza (1884 a 1895), ascendeu ao poder, transferindo em 1889 a capital daqui para Manjacaze que significa grande força. a mudança da capital deveu-se pelas seguintes razões: – Evitar possíveis pressões e ataques dos ingleses e portugueses que cobiçavam o ouro e o marfim em Manica; e – o vale do rio Limpopo e as regiões circunvizinhas possuíam todos os recursos que começavam a escassear em Mossurize.

Organização sócio – política do Estado de Gaza

O Estado central Nguni exibia uma divisão nítida entre as classes sociais.

Classe dominante

O grupo Nguni é que formava a classe dominante. No núcleo central, encontrava-se no topo:

– Uma alta aristocracia de elementos da linhagem do rei (descendentes do avô e do bisavô paterno do rei);

– Uma média aristocracia composta por Nguni de menor categoria; e

– Ainda uma camada de assimilados cativos de guerra designados por “cabeças” (tinlhoko). Os rapazes assimilados eram integrados em regimentos que tardiamente serviam de funcionários administrativos e militares dos Nguni na administração territorial, e as mulheres capturadas eram oferecidas como esposas dos Nguni isentos ao lobolo.

A classe dominante incorporava também as populações para fornecer tributos em géneros, rapazes e raparigas.

Classe dominada

A classe dominada era formada pelos grupos Tsonga, Chopi e Chona, estando sujeita às seguintes obrigações:O lobolo em Moçambique

– Pagamento da renda em produtos, trabalhos, moedas; bem como a

– Garantia da segurança militar aos exércitos e mensageiros.

Actividades económicas no Estado de Gaza

As actividades económicas que ditaram o desenvolvimento do Estado de Gaza foram:

– Criação de gado bovino e trocas comerciais com a exportação de marfim e escravos e importação de tecidos, artigos de ferro e cobre com a Baía de Lourenço Marques, eram actividades monopolizadas pelos Nguni que constituíam a Classe dominante; enquanto que;

– A caça ao elefante, a pesca, a recolecção e agricultura, cultivando a mapira, mexoeira, amendoim e milho eram da inteira responsabilidade da classe dominada para o seu auto – sustento, bem como para o pagamento de tributo a classe dominante. Para além destas, destaca-se também:

– A produção artesanal, donde surgiram especialistas como: ferreiros, produtores de artigos de madeira, tecelões e oleiros, sem nenhum estatuto social. Certos homens em número reduzido comercializavam: tecidos, enxadas e peles de gatos selvagens muito procurados na Zululândia e na Swazilândia. A enxada importada da Europa a partir de década 50 servia também como moeda.

Ideológica no estado de Gaza

O exercício do poder real, entre os Nguni, não estava dissociado da prática das crenças e exercício das cerimónias mágico – religiosas. Anualmente, o rei dirigia alguns rituais ligados ao ciclo agrário. Ex: o Nkwaya ou Incuala era o ritual mais importante que se celebrava em Fevereiro e que era determinada pelo aparecimento dos primeiros frutos, porque ele libertava as tensões sociais e transformava-as em factor de unidade e de prosperidade.

O rei participava igualmente em cerimónias que tinham por objectivo: dar força aos homens que partiam para a guerra (Mbengululu).

As principais batalham que decorreram no Estado de Gaza

Entre outras, as principais batalhas de resistência no Império de Gaza contra os invasores portugueses, deram-se todas no ano de 1895, a mencionar: a Batalha de Marracuene que se deu a 2 de Fevereiro, Batalha de Magule a 8 de Setembro e a Batalha de Coolela que se travou no dia 7 de Novembro. Em todas as batalhas, o Exército de Ngungunhane não conseguiu vencer o seu inimigo devido às seguintes razões:

– Superioridade militar dos invasores (metralhadoras e canhões);

– Falta de unidade entre os moçambicanos; e

– Traição de alguns chefes, que contribuíram para a prisão de Ngungunhane.

Decadência do Estado de Gaza (1895)

“A destruição de Gaza e de Gungunhana constituía uma prioridade do governo português, por isso, foi convocado António Ennes para comissário régio de Moçambique.

Os Portugueses enviaram um ultimato a Ngungunhane no dia 15 de Outubro do mesmo ano, exigindo a entrega de Matibejane e Mahazul, o que não lhes foi aceite, e assim iniciaram com os ataques as invasões contra o seu império.

O Império de Gaza conheceu o princípio do seu fim após a vitória dos Portugueses na Batalha de Marracuene a 2 de Fevereiro de 1895.

No âmbito diplomático, Énes vendo o Estado de Gaza como um enorme obstáculo de transpor, todavia pretendendo impor forçosamente o prestígio Português nos pequenos regulados; fazer alianças com chefes submetidos/amedrontados para cercar o império e dominar Ngungunhane, enviou vários emissários portugueses para contactá-lo, como forma de impedi-lo que ganhasse força no campo militar; convencê-lo de que não haveria de ser agredido militarmente; e impedir sua aliança com os ingleses.

No âmbito militar, António Énes realizou um ataque violento que desorganizou Gaza. Em Setembro de 1895, as tropas portuguesas avançaram em três colunas diferentes. Uma, optou pelo rio Incomáti, outra, pelo rio Limpopo e a terceira – a mais importante, ia por Inhambane, descendo o rio Inharrime. A coluna do Incomáti foi a primeira a entrar em combate com as forças de Ngungunhane, entretanto, saía a de Inhambane, comandada por Mouzinho de Albuquerque, e que se compunha de infantaria e artilharia. A batalha deu-se no vale de Coolela em 7 de Novembro de 1895, com sucesso outra vez para os portugueses. Ngungunhane, desmoralizado, refugiou-se em Chaimite mas foi traído, e Mouzinho de Albuquerque conseguiu prendê-lo a 28 de Dezembro do mesmo ano, dava-se então o fim do Estado de Gaza. Ngungunhane foi deportado para Portugal, depois para Açores, onde viria a morrer em 23 de Dezembro de 1906.


Bibliografia

CABRAL, R. Costa. História de Moçambique. Edições: Afrontamento; Porto – l97l.

COSSA, Hortência & MATARUCA, Simão. Moçambique e a sua Historia – 12ª classe; Beijing, Diname e.e., s/d.

MEDEIROS, Eduardo, ADAMOVITCH, Leonardo, MORAIS, João at al. História de Moçambique; 2ª Ediçao; Maputo; Editor: tempo, sob autorização da UEM; 1988.

RECAMA, Dionísio Calisto. História de Moçambique, de África e Universal; Plural Editores, Lda. Maputo – 2004.

SERRA, Carlos. História de Moçambique; Maputo, Livraria Universitária, Universidade Eduardo Mondlane, Volume – 1.