Vida e obra


Frantz Omar Fanon nascido na ilha caribenha de Martinica em 20 de Julho de 1925, foi um psiquiatra e filósofo que ficou mais conhecido como um revolucionário, tendo lutado junto às forças de resistência no norte de África, pela independência da Argélia. Foi também influente no pensamento do século XX no que concerne a temas sobre descolonização e da psicopatologia da descolonização.

Trabalhou na Argélia como médico psiquiatra no hospital do exército francês onde presenciou as atrocidades da guerra de libertação que colocou pólos opostos a frente de libertação nacional (argelina) e a dominação colonial. E diante dessa violência decide unir-se à resistência argelina e participar de forma activa na política. Fanon morreu de pneumonia em 6 de Dezembro de 1961 em Bethesda, em Maryland, EUA. Em sua homenagem, foram fundados ou remodelados centros, clínicas e hospitais e inclusive um prémio académico com o seu nome para obras excepcionais do pensamento caribenho.

Em suas obras analisou, inspirado pelos movimentos anti-coloniais, as consequências psicológicas da colonização, tanto para o colonizador quanto para o colonizado, e o processo de descolonização em seus aspectos sociológicos, filosóficos e psiquiátricos. Em sua autoria podemos mencionar obras como Os condenados da Terra (1961), Pela Revolução Africana (1964), L’An V de la Révolution Algérienne (1952) e Pele Negra, Máscaras Brancas (1952) da qual faremos menção.

Pele Negra, Máscaras Brancas


Fanon escreveu esta obra aos 25 anos, porém foi publicada quando tinha 27, tinha por destino ser a sua tese de doutorado em psiquiatria, mas foi recusada pela comissão julgadora, alegando que lhe faltavam bases físicas para fenómenos psiquiátricos. A obra foi publicada em um contexto em que o racismo contra os negros era marca dominante particularmente em sociedades anglófonas, especialmente nos EUA, Grã-Bretanha, Austrália e África do Sul. Embora recebida ao mesmo tempo com escândalo e indiferença, esta obra tornou-se um clássico do pensamento sobre a diáspora africana, do pensamento psicológico, sobre a descolonização, da teoria das ciências humanas, da filosofia e da literatura caribenha.

Para além do seu carácter sociológico, faz-se uso, na obra, de análises psicanalistas e clínicas como forma de sustentar a sua tese: racismo e colonialismo, como formas de dominação entre seres humanos e como reguladores das relações entre negros e brancos. Passamos a mencionar os argumentos por ele usados ao longo dos capítulos para defender sua tese.

O negro e a linguagem


No primeiro capítulo da obra Pele Negra Máscaras Brancas Fanon traça uma relação entre o homem negro e a linguagem do colonizador, neste argumento ele advoga que o negro tivera que se adaptar à sociedade colonial atribuindo-se diversas novas categorias desde mudanças linguísticas até relacionamentos afectivos inter-raciais.

As mudanças linguísticas ocorrem devido a opressão que o colonizado sofria pelo colonizador. Portanto, como forma de superar a inferioridade perante ao branco o negro tenta ratificar a ideia de superioridade branca em detrimento da inferioridade negra. O negro quer ser branco, o branco incita-se a assumir a condição de ser humano (FANON, 2008: 17).

Dentro da sociedade francesa, Fanon observou que o negro sofre um processo de alienação de sua própria existência, personalidade, que é escondida atrás das cortinas do racismo e do colonialismo. Como tentativa de superação o negro passa a se ver na figura do outro, ele já não é negro, é pardo, ele aproxima-se mais ao homem verdadeiro (o branco) na medida em que adoptar a língua do colono (Ibidem, p. 33).

Fanon refere que falar é estar em condições de empregar certa sintaxe, possuir a morfologia, mas é sobretudo assumir e suportar o peso de uma civilização, pois para ele ter domínio da linguagem do colonizador implica aceitar e assumir a identidade cultural que aquela língua representa. A língua torna-se um importante mecanismo de manutenção de opressões uma vez que uma pessoa branca para se referir a pessoa negra, antilhana, usa a língua crioula para que este não se torne igual.

A relação entre o negro e o branco


Fanon reflecte sobre a pretensão de cada raça quando se une a outra, e como tal relação influencia na maneira de pensar dos respectivos indivíduos. Dá-se menção a relação que há entre a mulher negra e o homem branco; e entre o homem negro e a mulher branca. Neste argumento, Fanon mostra a existência do racismo no relacionamento conjugal entre pessoas de raças diferentes. E na busca do reconhecimento, o negro procura unir-se ao branco, porém verifica-se que o racismo é mais intenso devido ao complexo de inferioridade do negro que deixa de lado a sua identidade e cultura.

Segundo Fanon (2008: 54) não há possibilidade de existir amor entre a mulher de cor (negra) e o europeu (branco) enquanto o complexo de inferioridade que caracteriza a negra não for eliminado e ser, também, uma inferioridade económica. Portanto, é uma relação que apresenta a dicotomia entre o ser e o ter. O branco tem para si a beleza e a virtude e o negro apresenta uma fusão total com o mundo, um sentimento forte com a terra e com a sua tradição.

Como forma de purificar sua raça, a mulher de cor, tenta embranquece-la, no seu corpo e pensamento, e para lograr tal intento é necessário que a mulher de cor se esforce em escolher, em suas relações, o menos negro. Sustentando essa colocação, Fanon traz o sentimento de suas compatriotas estudantes na França que confessam que não poderiam casar-se com um negro, por considerar que haviam escapado disso quando foram a Franca, e acrescentam:

não é que neguemos ao negro qualquer valor, mas é melhorar ser branco” (FANON, 2008: 58).


No que refere a relação entre o homem de cor (negro) e a mulher branca, Fanon diz que o homem negro une-se a mulher branca para se auto afirmar como pessoa. O negro tem desejo de ser branco e quer “ser reconhecido como branco e não como negro” (FANON, 2008: 69), e quem pode proporcioná-lo tal feito é a branca, amando-o ela prova que é digno de seu amor, se “sou amado como branco” então “sou branco”. Ao casar-se com uma branca, o negro casa-se também com a cultura branca, a beleza branca e a brancura branca.

Tal como acontece com a mulher de cor na Europa (França) o homem de cor também revolta-se contra a sua cultura e para saciar a fome que tem por uma branca, principalmente o de pele mais clara, chegam a ponto de renegar seus países, suas culturas, suas identidades e lá se casam, mais pelo desejo de dominar a europeia do que pelo sentimento. São catapultados por certo prazer e orgulho de desforra.

Aqui nota-se o complexo de inferioridade do negro em relação ao branco, e o problema agora é saber se é possível superar esse complexo. Ao que Fanon (2008: 59) refere que existe no negro uma exacerbação afectiva, uma raiva em que se sente pequeno, uma incapacidade de qualquer comunhão que o confina em um isolamento intolerável. A saída do isolamento implica a restituição ao outro de sua realidade humana, diferente da realidade natural, e ambas as raças devem efectuar essa operação, que se for unilateral será inútil.

Sobre o pretenso complexo de dependência do colonizado


Fanon pretende apresentar os fenómenos psicológicos que regem as relações entre o colonizado e o colonizador. Parte da pesquisa de Mannoni, que faz alusão a situação colonial, onde são analisados, no mesmo contexto, dois povos diferentes cultural e economicamente e a atitude do homem diante dessas condições.

Para além de conceber esse estudo insuficiente, por não conseguir estabelecer as verdadeiras coordenadas da situação colonial, Fanon adere a parte que pretende explicitar o carácter patológico do conflito, ou seja, onde pretende demonstrar que o branco colonizador não é movido senão pelo desejo de eliminar uma insatisfação, nos termos de super-compreensão. Deste modo vale-se o branco do “gérmen de inferioridade”, que segundo Mannoni é co-natural ao africano (ou ao malgaxe como faz referencia).

Disto pode-se perceber que o encontro face a face entre o branco (colonizador) e o negro (primitivo) gere uma situação colonial que faz aparecer uma série de problemas que só uma análise psicológica pode situar e definir. Esta situação aparece porque o complexo de inferioridade é algo pré-existente a colonização.

Faanom defende, neste capítulo, que uma sociedade é racista ou não é. E sustenta: dizer que o norte da França é mais racista que o sul, que o racismo e a coisa dos subalternos, o que, por conseguinte, não compromete de modo algum a elite, que a França é o país menos racista do mundo, é do feitio de homens incapazes de pensar correctamente (2008: 85).

É utópico procurar saber em que dois comportamentos desumanos se diferem um do outro. Daqui Fanon faz a pergunta a Mannoni, por ter dito que o racismo praticado por operários brancos na África do sul é mais intenso que dos dirigentes, “se ele não percebe que para um judeu, as diferenças entre o anti-semitismo de Maurros e o de Goebbels são imperceptíveis.

Críticas a Fanon


A primeira crítica que fazemos a Fanon está ligada à questões da linguagem, a qual ele dá um papel fundamental na relação entre o colonizador e o colonizado. Ele afirma que falar, ou usar certa linguagem, é estar em condições de empregar ou possuir a morfologia de tal ou qualquer língua, mas é sobretudo assumir uma cultura, suportar o peso de uma civilização.

Partindo dessa afirmação, podemos lembrar a Frantz Fanon que existem pessoas ou indivíduos com grande domínio sobre várias línguas, porém não renegam a sua identidade e nem carregam nas costas o mosaico cultural que tal língua representa. Conhecer ou ter domínio sobre a língua do outro pode corresponder a facilitação da comunicação entre indivíduos de raças ou culturas diferentes.

Quanto ao relacionamento conjugal entre negros e brancos, Fanon mostra-se um pouco céptico a essa possibilidade ser de amor autêntico e refere que a raça negra une-se à branca como forma de embranquecer-se e afirmar-se como pessoa. Porém esta visão pode distanciar-se do seu objectivo que é de ver um mundo livre do racismo visto que o casamento de pessoas de raças diferentes é uma forma de mostrar que negros e brancos podem coexistir num mundo de harmonia partilhando suas referências identitárias uns com os outros sem que seja uma forma de busca de conhecimento. O casamento pode ser também uma forma de desconstrução do racismo de reconhecimento da semelhança dos envolvidos, negros e brancos.

Fanon refere que para que o negro se sinta bem sucedido precisa de consagração do branco. Deste modo Fanon coloca o branco como o elo dominante das relações e como condição necessária e suficiente para que se reconheça a humanidade do africano e para que seja visto, também, como homem. Daqui percebemos que Frantz Fanon concebe o negro e seus compatriotas como seres inferiores e “branco-dependentes”. Proferindo tais palavras, ele está, ao mesmo tempo, a apoiar os ideais racistas pois é exactamente da super valorização branca e da inferiorização do negro que o racismo se alastra ao longo dos tempos.

Analisamos desta forma os argumentos trazidos por Frantz Fanon na obra Pele Negra, Máscaras Brancas que não obstante sua influência em diversas áreas de estudo e na tomada de consciência para proclamação da identidade africana apresentam suas limitações, e desta forma tentamos trazer tais limitações.

Conclusão

Perante a temática abordada sobre Frantz Fanon: Pele Negra, Máscaras Brancas, pode-se observar que abordar temas relacionados ao racismo e a suas consequências na colonização do negro nas sociedades antigas, ainda mostra-se muito pertinente para entender as formas de pensar na actualidade. Pois, ainda hoje a construção da identidade negra em algum momento depende da corroboração do branco.

Um do objectivo de Frantz Fanon, ao publicar o livro, era de ver um mundo sem diferenciação entre cores e raças, um lugar onde há espaço para todas elas, sem que haja dominados e dominadores ou distinção entre seres humanos que sejam negros, brancos, amarelos, vermelhos mais que sejam todos seres humanos.

A análise de Fanon versa sobre o seu tempo, porém muitas de suas ideias são de grande importância para a actualidade, visto a grande mobilidade e coexistência entre pessoas de raças diferentes. A sua obra da menção, de forma essencial ao problemas particulares dos negros das Antilhas o que não obstante a importante já referida deixa a desejar o facto de não dar muita importância aos problemas vividos pelos negros em outras partes do mundo.

Referência bibliográfica


FANON, Frantz. Pele Negra, Máscaras Brancas. DA SILVEIRA, Renato (Trad.). Salvador, EDUFBA, 2008.