Abordagem da aprendizagem social

De acordo com a teoria social cognitiva, a observação permite que as crianças aprendam muito sobre comportamentos típicos do género antes de realizá-los. Elas podem combinar mentalmente observações de múltiplos modelos e gerar suas próprias variações comportamentais. Em vez de ver o ambiente como uma dádiva, a teoria social cognitiva reconhece que as crianças seleccionam ou mesmo criam seus ambientes através de suas escolhas de companhias e actividades.

Entretanto, os críticos dizem que a teoria social cognitiva não explica como as crianças diferenciam entre meninos e meninas antes de terem um conceito de género, ou o que inicialmente motiva as crianças a adquirir conhecimento de género, ou como as normas de género tornam-se internalizadas – perguntas que outras teorias cognitivas tentam responder.
Colello 1983, afirma que para esses teóricos, a socialização – o modo como uma criança interpreta e internaliza experiências com os pais, professores, colegas e instituições culturais – desempenha um papel central no desenvolvimento do género. A socialização começa na primeira infância, bem antes da compreensão consciente do género. Gradualmente, à medida que a criança começa a regular suas actividades, os padrões de comportamento passam a ser internalizados.

A criança não mais precisa de elogios, de reprimendas ou da presença de um modelo para agir de maneira socialmente aprovada. As crianças sentem-se bem consigo mesmas quando vivem de acordo com seus padrões internos, e sentem-se mal quando não o fazem. Uma parte substancial da passagem do controle socialmente orientado para a autor regulação do comportamento relacionado ao género pode ocorrer entre os 3 e os 4 anos.

Influências da família

Para Bueno 1993, quando perguntaram a David, o neto de 4 anos da governadora da Louisiana, Kathleen Blanco, o que ele queria ser quando crescer, ele não soube dizer. Desdenhou todas as sugestões da mãe – bombeiro, soldado, policial, piloto de avião. Finalmente, ela perguntou se ele queria ser governador. “Mamãe”, ele respondeu, “eu sou um menino!” A resposta de David ilustra como pode ser forte a influência da família, mesmo promovendo
preferências contrárias ao estereótipo. Geralmente, porém, a experiência na família parece reforçar as preferências e atitudes típicas do género.

As meninas têm mais liberdade que os meninos para escolher roupas, jogos e colegas
Em famílias igualitárias, o papel do pai na socialização de género parece especialmente importante.

 Os irmãos também influenciam o desenvolvimento de género. Crianças pequenas com um irmão  mais velho do mesmo sexo tendem a ser mais típicos do género do que aquelas cujo irmão mais velho é do sexo oposto

Influências dos colegas

Anna, aos 5 anos, insistia em se vestir de um modo diferente. Ela queria usar leggings com saia por cima e botas – dentro e fora de casa. Quando a mãe perguntou por que, Anna respondeu: “Porque Katie se veste assim e Katie é a rainha das meninas!”.

Mesmo na segunda infância, o grupo de colegas é uma influência importante na tipificação de género. Aos 3 anos, as crianças geralmente brincam em grupos segregados por sexo que reforçam o comportamento tipificado por género e a influência do grupo igual aumenta com a idade (Martin et al., 2002; Ruble e Martin, 1998). As crianças que brincam em grupos do mesmo sexo tendem a ser mais tipificadas por género do que crianças que não o fazem.

Influências culturais

Quando uma menina no Nepal tocou no arado que seu irmão estava usando, ela foi repreendida. Assim ela aprendeu que, sendo mulher, ela deve abster-se de acções que seu irmão deveria executar nos Estados Unidos, a televisão é um formato importante para a transmissão de atitudes culturais em relação ao género. A teoria da aprendizagem social prevê que as crianças que vêem muita televisão ficarão mais tipificadas por género ao imitarem os modelos estereotipados que aparecem na tela. Evidências impressionantes nesse sentido surgiram de um experimento natural realizado em várias cidades canadenses com acesso a transmissão de televisão pela primeira vez. Crianças que tinham atitudes relativamente não estereotipadas apresentaram um aumento acentuado nas visões tradicionais dois anos mais tarde (Kimball, 1986).

Para Bueno, (1993:99), aos 3 anos de idade, finge que os pedaços de cereal flutuando em sua tigela são “peixinhos” nadando no leite, e ela “pesca,” colherada por colherada. Após o desjejum, ela coloca o chapéu de sua mãe, pega uma pasta, e é uma “mamãe” indo para o trabalho. Ela dirige seu triciclo pelas poças, entra em casa para dar um telefonema imaginário, transforma um bloco de madeira em um caminhão e diz “Vrum, vrum!”. O dia de Carmen é uma brincadeira após a outra. Seria um erro desdenhar das actividades de Carmen como se fossem “apenas diversão.” Embora o brincar possa não parecer servir a um propósito óbvio, ele tem funções importantes no momento e no longo prazo o brincar é importante para o desenvolvimento saudável do corpo e do cérebro. Ele permite que as crianças envolvam-se com o mundo à volta delas, usem sua imaginação, descubram formas flexíveis de usar objectos e solucionar problemas e preparem-se para papéis adultos.

O brincar contribui para todos os domínios do desenvolvimento. Por meio dele, as crianças estimulam os sentidos, exercitam os músculos, coordenam a visão com o movimento, obtêm domínio sobre seus corpos, tomam decisões e adquirem novas habilidades. À medida que separa blocos de diferentes formatos, conta quantos consegue empilhar ou quando anuncia que “minha torre é maior que a sua”, ela está lançando as bases para os conceitos matemáticos (p.99)

Contudo as crianças precisam de muito tempo para brincadeiras exploratórias livres. Hoje, muitos pais expõem crianças pequenas a vídeos e brinquedos com orientação académica. Essas actividades podem – ou não – ser valiosas em si, mas não se interferirem no brincar dirigido à criança.

Crianças de diferentes idades têm diferentes estilos de brincar, brincam de coisas diferentes e passam quantidades de tempo diferentes em vários tipos de brincadeiras (OLIVEIRA,2000:199)

As brincadeiras físicas, por exemplo, começam na primeira infância com movimentos rítmicos aparentemente sem objectivo. À medida que as habilidades motoras grossas se aprimoram, as crianças exercitam seus músculos correndo, pulando, saltando e arremessando objectos. Ao final desse período e no início da terceira infância, brincadeiras impetuosas envolvendo luta, chutes e perseguição tornam-se mais comuns, especialmente entre meninos.

Contudo os pesquisadores classificam o brincar das crianças de várias formas. Um sistema de classificação comum é por complexidade cognitiva. Outra classificação é baseada na dimensão social do brincar.

Níveis cognitivos do brincar

Na visão de Lagrange 1974, aos 3 anos, falava pela boneca, com uma voz mais grave que a sua própria. Miguel, aos 4 anos, usava uma toalha de cozinha como capa e voava como o Batman. Essas crianças estavam envolvidas em brincadeiras ligadas a pessoas ou situações fictícias – um dos quatro níveis do brincar identificados por Smilansky (1968) que apresentam níveis crescentes de complexidade cognitiva.

Os níveis são jogo funcional, jogo construtivo, jogo dramático jogos com regras. Embora certos tipos de brincadeiras sejam mais comuns em determinadas idades, os tipos de brincadeiras podem ocorrer em qualquer tempo

.O nível mais simples, que começa durante a primeira infância, é o jogo funcional (às vezes denominado jogo locomotor), consistindo na prática repetida de movimentos musculares largos, como rolar uma bola. O segundo nível, o jogo construtivo (também denominado jogo com objectos), é o uso de objectos ou materiais para fazer coisas, como uma casa de blocos ou um desenho com lápis de cor. As crianças passam estimados 10 a 15% de seu tempo brincando com objectos.

O terceiro nível, o jogo dramático (também chamado de jogo de faz de contajogo de fantasia ou jogo imaginativo), envolve objectos, acções ou papéis imaginários; ele baseia-se na função simbólica que emerge durante a última parte do segundo ano (Piaget, 1962). O jogo dramático envolve uma combinação de cognição, emoção, linguagem e comportamento sensório-motor. Ele pode fortalecer o desenvolvimento de conexões densas no cérebro e fortalecer a posterior capacidade para pensamento abstracto. Estudos revelaram que a qualidade do jogo dramático está associada à competência social e linguística.

A dimensão social do brincar

Oliveira 2000, verificou que quando a criança fica mais velha, seus jogos tendem a se tornarem mais sociais – isto é, mais interactivos e mais cooperativos. A princípio as crianças brincam sozinhas, depois ao lado de outras crianças e finalmente juntas. Hoje, porém, muitos pesquisadores consideram simplória a caracterização de Parten sobre as brincadeiras infantis. Crianças de todas as idades se envolvem em todas as categorias do brincar descritas por Parten

Como o género influencia o brincar

Aos 3 anos de idade as meninas têm muito maior probabilidade de brincar com bonecas e conjuntos de chá enquanto os meninos preferem armas e caminhões de brinquedo, as meninas tendem a escolher outras meninas como companheiras de brincadeira, e os meninos preferem outros meninos um fenómeno conhecido como segregação de género.

A tendência dos meninos a serem mais activos e fisicamente agressivos comparados com os estilos de brincadeiras mais sustentadoras e afectuosas são prováveis contribuições para a segregação de género. Meninos brincam espontaneamente nas calçadas, nas ruas ou em terrenos vazios; meninas tendem a escolher actividades mais estruturadas e supervisionadas por adultos E isso não parece ser dirigido por influências sociais. Independente do grupo cultural ao qual pertencem, os meninos tendem a participar de brincadeiras mais exploradoras, e as meninas apreciam brincadeiras mais simbólicas e de faz de conta.

Como a cultura influencia o brincar

Os valores culturais afectam os ambientes lúdicos que os adultos constroem para as crianças e esses ambientes por sua vez afectam a frequência de formas específicas de brincar entre culturas Um estudo de observação comparou 48 crianças coreano-americanas e 48 anglo-americanas de classe média em pré-escolas separadas as pré-escolas anglo-americanas encorajavam o pensamento independente, o envolvimento activo na aprendizagem, os intercâmbios sociais entre crianças e as actividades colaborativas com os professores.

A pré-escola coreano-americana enfatizava o desenvolvimento de habilidades escolares e a realização de tarefas. Não causa surpresa que as crianças anglo-americanas envolviam-se mais em jogos sociais, enquanto os coreano-americanos interessavam-se mais por jogos paralelos e pela desocupação. Ao mesmo tempo, as crianças coreano-americanas brincavam mais cooperativamente, muitas vezes oferecendo brinquedos umas às outras – muito provavelmente um reflexo da ênfase de sua cultura na harmonia do grupo. As crianças anglo-americanas eram mais agressivas e geralmente respondiam negativamente às sugestões das outras, reflectindo a competitividade da cultura norte-americana

Formas de disciplina

No campo do desenvolvimento humano, a disciplina refere-se aos métodos de moldar o carácter e ensinar autocontrolo e comportamento aceitável. Pode ser uma poderosa ferramenta para a socialização com o objectivo de desenvolver a autodisciplina. Quais as formas de disciplina que funcionam melhor? Os pesquisadores têm considerado uma ampla variedade de técnicas. Reforço e punição “Você é um ajudante maravilhoso, Nick! Muito obrigada por arrumar seus brinquedos.” A mãe de Nick sorri calorosamente para seu filho enquanto ele coloca seu caminhão caçamba dentro da caixa de brinquedos. As palavras e as acções dela fornecem uma disciplina gentil ao seu filho e o ensinam que guardar seus brinquedos é um comportamento positivo que deve ser repetido.

 Os pais às vezes punem os filhos para acabar com um comportamento indesejável, mas geralmente eles aprendem mais com um reforço para o bom comportamento. Os reforços externos podem ser tangíveis (divertimentos, mais horas de brincadeira) ou intangíveis (um sorriso, uma palavra de elogio, um abraço, mais atenção ou um privilégio especial). (FURTADO,1998)

Qualquer que seja o reforço, a criança deve vê- -lo como uma recompensa e deve recebê-lo de modo razoavelmente coerente depois de apresentar o comportamento desejado. Eventualmente, o comportamento deve fornecer um reforço interno: uma sensação de prazer ou de realização.

Raciocínio indutivo, afirmação de poder e retirada do amor Quando Sara pegou um doce em uma loja, seu pai não fez um discurso sobre honestidade, bateu nela, ou disse que ela tinha sido uma menina má. Em vez disso, ele explicou como o dono da loja seria prejudicado por ela não ter pago pelo doce, perguntou-lhe como ela achava que o dono da loja poderia se sentir, e então levou-a de volta à loja para que ela devolvesse o doce.

As técnicas indutivas, como as que o pai de Sara usava, visam encorajar o comportamento desejável ou a desencorajar o comportamento indesejável por meio da argumentação com uma criança. Elas incluem estabelecer limites, demonstrar as consequências lógicas de uma acção, explicar, discutir, negociar e obter ideias da criança sobre o que é justo. As técnicas indutivas são geralmente o método mais eficaz para conseguir que as crianças aceitem os padrões parentais (COLELLO,1983:85).

Duas outras amplas categorias de disciplina são afirmação de poder retirada temporária do amor. A afirmação de poder visa interromper ou desencorajar comportamento indesejável por meio da aplicação física ou verbal do controle parental; ela inclui exigências, ameaças, retirada de privilé- gios, palmadas e outros tipo de castigo. A retirada do amor pode incluir ignorar, isolar ou mostrar desagrado por uma criança. Nenhuma dessas é tão eficaz quanto o raciocínio indutivo na maioria das circunstâncias, e ambas podem ser prejudiciais.

Comportamento pró-social

Aos 3 anos e meio, respondeu às queixas de dois colegas de pré-escola que não tinham massa de modelar suficiente, seu brinquedo favorito, dando-lhes metade da sua. Alex estava demonstrando altruísmo:

Motivação para ajudar outra pessoa sem expectativa de recompensa. Acções altruístas como a de Alex geralmente acarretam custo, autos sacrifício ou risco. O altruísmo é a essência do comportamento pró-social, actividade voluntária que tem por objectivo beneficiar outrem.

A análise do comportamento cooperativo revelou três preferências por compartilhar recursos: uma preferência por compartilhar com pessoas próximas, reciprocidade (uma preferência por compartilhar com pessoas que compartilham com você), e reciprocidade indirecta (uma preferência por compartilhar com pessoas que compartilham com outras). Em uma série de experimentos com crianças de 3 anos e meio, os pesquisadores foram capazes de demonstrar funcionais em crianças pequenas.

Relacionamentos com outras crianças

Para Oliveira 2000, embora as pessoas mais importantes no mundo de uma criança pequena sejam os adultos que tomam conta dela, o relacionamento com irmãos e colegas torna-se mais importante na segunda infância. Praticamente todas as actividades e questões de personalidade características dessa idade, do desenvolvimento do género ao comportamento pro-social ou agressivo, envolvem outras crianças. Examinaremos primeiro os relacionamentos com irmãos e então de crianças que não têm irmãos. Então, exploraremos os relacionamentos com o grupo de iguais e com os amigos

Lagrange 1974:99, afirma que as primeiras brigas entre irmãos, mais frequentes e mais intensas, são por direitos de propriedade – quem é dono de um brinquedo ou quem tem o direito de brincar com ele. Embora adultos irritados possam nem sempre ver dessa maneira, brigas e reconciliações entre irmãos podem ser vistas como oportunidades de socialização, quando as crianças aprendem a defender princípios e a negociar desacordos.

Outra arena para socialização é o jogo dramático conjunto, irmãos que frequentemente brincam de “fazer de conta” desenvolvem uma história de entendimentos compartilhados que lhes permite resolver mais facilmente os problemas e aceitar as ideias um do outro.

 

Bibliografia

BUENO, M. J. Psicomotricidade, Teoria & Prática: estimulação, Educação e Reeducação Psicomotora com Actividades Aquáticas. São Paulo: Lovise, 1998.

COLELLO, S. M. G. Pedagogia da Infância. Revendo Essa Antiga Parceria.  São Paulo, 1993.BORNSTEIN, M. G. Factores da Socialização. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. FONSECA, V. da. PsicomotricidadeSão Paulo: Martins Fontes, 1983.FURTADO, V. QRelação entre Desempenho Psicomotor e aprendizagem da Leitura e EscritaCampinas, Campinas, 1998. LAGRANGE, G. Manual de Psicomotricidade. Lisboa: Estampa, 1974.OLIVEIRA, G. de C. Psicologia da Infancia: Educação e Reeducação. São Paulo: Vozes, 2000.