O Parentesco

O termo parentesco é usado no sentido amplo — significando tanto os laços de sangue (consanguinidade) e os laços de afinidade (casamento). E no sentido restrito — baseia-se em laços de sangue.

Segundo Salazar (1995:46) o parentesco é uma relação humana universal com base biológica e com variações nos significados sócio-culturais particulares.

O parentesco é de grande importância na vida quotidiana desde o período clássico.

Questões como o divórcio, que nos parece tão moderna, é muito antiga noutras culturas (concedida a petição dos dois) ou também o aborto que nutras culturas é admitido como algo normal. Também o termo das relações sexuais fora do matrimónio que apenas são proibidas nuns 5% das culturas, e noutras são permitidas, mas com certas condições. O parentesco é o sentido sócio-cultural dos laços de sangue, tem uma base biológica mais precisa de uma interpretação e reconhecimento social (ex: o caso dos pais adotivos).

O parentesco é um tipo de relação social pautada. As funções que satisfaz o parentesco são:

  • Económicas (subsistência e controlo do sistema de reprodução);
  • Psicológicas (seguridade emocional);
  • Sócio-económicas (regulamentar as formas de intercâmbio, organizar os casamentos) etc.

Grupos de parentesco

Os Antropólogos estudam as definições, limites e relações dos grupos de parentesco (igual a divisões sociais com vínculos relevantes, como por exemplo: os descendentes do mesmo avô). Em muitas culturas quando o antepassado comum fica no passado, fica no esquecimento e os seus descendentes não são considerados parentes entre si. Em muitas outras culturas os grupos de parentesco estão ligados com um TOTEM (deus primitivo de certas tribos americanas), que tem um objeto emblemático com o qual se estabelece uma relação especial.

Os termos de parentesco são as palavras para definir parentes numa língua particular, isto é, uma construção social (ex: em muitas sociedades a mesma palavra designa o pai e o irmão da mãe; o termo avô pode designar o pai do pai ou o pai da mãe, mas também pode designar o irmão da mãe).

Lévi Strauss, afirma existirem três tipos de laços de parentesco unidos por:

  1. Laços de sangue — descendência, consanguinidade, relação entre pais e filhos, entre irmãos, etc. A relação biológica entre indivíduos parentes por sangue, origina descendência cultural, e pode ser de linhagem quando este grupo de descendência se mantém unido de um antepassado comum a uma distância de quatro ou cinco gerações, onde cada um pode definir-se em relação a ele como filho, neto, bisneto, tetraneto, linhagem de parentesco estreito em unidade aberta exogénica.
  2. Laços de afinidade — casamentos, parentes afins originados pelo matrimônio.
  3. Laços fictícios, adoção — parentes originados pela adoção

Segundo Salazar (1995:46) os grupos de parentesco destingem-se em:

  • Parentes biológicos ou “cognados” — são definidos pela relação genealógica (ex: irmão da mãe) de filiação.
  • Parentes afins ou “agnados” — são aqueles que se obtêm por vínculos como o casamento, portanto pode incluir elementos para além dos esposos (pais dos esposos, irmãos, grupos de parentesco).
  • Parentesco bilateral (i.e: Portugal e Espanha) — é uma relação genealógica estabelecida através dos homens e das mulheres, isto é, os tios por via materna ou paterna são o mesmo tipo de parentes.

O parentesco é construído culturalmente, isto é, alguns parentes biológicos são considerados parentes e outros não.

Os membros de um grupo de parentesco podem ter obrigações comuns para com os vinculadores, por exemplo: vingar a morte (na Polinésia).

Também pode existir a idéia de “limpeza de sangue” no grupo de parentes. Durante o Este Novo, em Portugal existia a expressão “lavar a honra com sangue”, que consistia em matar a esposa quando era apanhada junto com um amante.

Descendência ou Linhagem

Na antropologia clássica apresentam-se seis sistemas básicos de terminologia que tem em conta os termos que se usam para designar os parentes (pai, mãe, irmão, irmã, primo, prima, e t c), as oposições de gerações de linhas, de gênero e de idade. Em conseqüência temos:

  1. O sistema Sudanês: tem um termo para cada um dos seus parentes considerados.
  2. O sistema Esquimal — tem só sete termos e não faz referencia nem de gênero nem de linha de primos; é o mais semelhante aos sistemas comuns ocidentais, que se podem considerar como uma variante esquimal puro.
  3. O sistema Hawaiano — considera quatro termos para designar os 16 parentes fundamentais: um termo para o pai e tios; um termo para mão e tias; um termo para irmã e primas e outro para irmãos e primos.
  4. O sistema Inoquês — usa só 6 termos: mãe, pai, irmã, irmão, prima cruzada e primo cruzado.

Primos cruzados são filhos de irmãos de sexos opostos. E primos paralelos são filhos de irmão do mesmo sexo.

  1. O sistema Crow — dá-se em sociedade de linhagem matrilinear.
  2. O sistema Omaha — segue a linhagem patrilinear.

Temos ainda alguns como:

  • O Clã (grupos de pessoas dotadas de um nome de descendência único — grupo exogénico);
  • Prátria: conjunto de clãs;
  • Tribo: conjunto de fratrias. Estes termos estão em desuso atualmente na Antropologia cultural.

Na Antropologia contemporânea é notável:

  • A descendência ou linhagem unilinear ou unilateral.
  • Patrilinear — transmite-se através de homens, é reconhecida como0 descendência masculina ou agnática.
  • Matrilinear — transmite-se através das mulheres, é reconhecida como descendência feminina ou uterina.
  • Na descendência ou linhagem bilinear ou bilateral, reconhecem-se os dois grupos contemporaneamente e misturam-se os aspectos de cada uma das descendências.

Em certos casos faz-se a distinção entre génitos ou pai biológico e a paternidade sociamente reconhecida, sem se concentrarem estas duas funções necessariamente na mesma pessoa.

  • Descendência unilinear dupla

Aceitando a descendência fundamentalmente unilinear, em certos casos pode se aceitar alguns aspectos da descendência patrilinear, e em outros matrilineares. Misturam-se as descendências.

Terminologia do parentesco

Segundo o estudioso L. Morgam pode se definir como o sistema simbólico de denominação das posições relativas aos laços de descendência e de afinidade. Trata-se do conjunto de termos que se usam para dirigir-se aos parentes. Indicam-se dois tipos de terminologia ou sistemas: descritiva e classificatória.

Sistemas ou terminologias

  • Descritivas: usa-se um termo diferente para designar cada parente. As sociedades mais complexas (ou modernas) usam terminologia descritiva.
  • Classificatório: usa-se um termo para designar uma classe ou grupos de pessoas. As sociedades de pequenas escalas usam preferencialmente os sistemas classificatórios.

A Família

Para Lévi Strawss (1974:17) a família — é um grupo social que tem origem no casamento, é uma união legal com direitos e obrigações económicas, religiosas, sexuais e outro tipo. Mas também está associada a sentimentos como o amor, o afecto, o respeito ou o temor. Afirma ainda o mesmo autor que a família é necessária para a reprodução social de um grupo humano, pois garante a sobrevivência, a continuidade biológica e social do próprio grupo.

A família, diz Robert Rowland (1997) é consequência das relações de parentesco, é um grupo doméstico co-residente e com limites variáveis segundo os contextos culturais.

Tipos de família

  • Família nuclear: grupos de parentes formados pelos pais e os filhos que residem juntos, e os filhos também a herdar os pais;
  • Família extensa ou “Souche” (alargada);
  • Família de orientação: aquele onde um nasce e aprende a ser criança;
  • Família de procriação: aquela que formamos no momento do nosso casamento, quando um se casa e tem filhos.

Orlando Gomes, toma uma posição legal que inclui o companheirismo como espécie de família, não apenas sob aspecto formal, mas também quanto aos efeitos da união extra-matrimonial constituída e mantida. Defende que a família deriva de três fontes: o casamento, o concubinato e a adoção. Diz-se, em conseqüência, que há três espécies de família:

  • A família legitima;
  • A família natural e
  • A família adotiva.

De regra, porem, o termo família usa-se para designar família legitima. Entende-se que somente o grupo oriundo do casamento deve ser denominado família, por ser o único que apresenta os caracteres de moralidade e estabilidade necessários ao preenchimento de sua função social, mas é forçoso reconhecer que uniões constituídas fora do casamento, à sua imagem e semelhança, também justificam a designação e merecem proteção jurídica.

Organização sócio-política e a célula de produção

O casamento marca a entrada de jovens a vida adulta e redefine as relações entre os pais de ambos os cônjuges, que passam a tratar com certa diferença. Espera-se que o casal se torne uma célula econômica e política com algum grau de interdependência em relação aos respectivos pais, embora a cooperação e a solidariedade que existe entre eles jamais cessem.

Em principio e de acordo com as tradições étnicas um dos cônjuges recém casado deve mudar para casa dos sogros e prestar-lhes “serviço” de assimilação na nova vida e nova família, por um período aproximado a um ano, por vezes ate o nascimento do primeiro filho, assumindo algumas responsabilidades econômicas, sócio-políticas, etc. Em muitas sociedades constrói-se a nova casa da família conjugal ao lado dos sogros.

Nalgumas sociedades, as famílias conjugais são unidades residenciais de parentesco que se articula em famílias extensas; as extensas constituem a principal unidade de produção e de consumo. A família extensa é a unidade política básica, e sua articulação recíproca se dá por meio de uma rede de transações econômicas, laços políticos e vínculos de parentesco que abrange virtualmente, embora em diferentes graus, todos co-residentes. Esta é a única indicação de que a residência é o principal factor estrutural nessa organização social, com ligação a um ascendente comum de referencia para toda descendência.

Portanto a família constitui uma célula de produção, para a consolidação da família conjugal com o nascimento dos filhos e que se baseia tanto na educação dos filhos, nas actividades que geram sustento, na partilha quotidiana do alimento, quanto na prática do resguardo de parto.

Em algumas etnias persistem e conservam certa organização social e política, assim como as práticas culturais tradicionais, mas vão caindo em desuso ou praticamente em desaparececimento.

A título de exemplo, nas regiões onde viveram os Índios, alguns aspectos ainda mantidos da sua organização social são, por exemplo: o facto de homens ao casarem, irem trabalhar para o sogro até que este os libere de suas actividades (como por exemplo: o trabalho nas roças, a caça, a pesca, etc.). Esse facto se observava mesmo com a Arara (homens e mulheres) que se casasse com índios de outra etnia, principalmente de Gavião.

Pelo que foi possível constatar com os idosos, faziam festas tradicionais (por exemplo: a festa da colheita do milho, arroz, etc.), e havia também a reclusão de jovens até o momento de casamento

As casas das aldeias não seguem a arquitetura tradicional, são de madeira (algumas já de tijolos), contendo salas e dois/ três quartos e a cozinha é construída separadamente, como um apêndice á casa, feita de palha e paxiuba. É o lugar mais fresco para se ficar durante o período de dia em que o calor é mais intenso. Atualmente não há registros da existência de índios do grupo “pé preto “entre a Arara.

O uso do Poder

Para Max Weber (cit. Baladier, 1987: 45), o poder é a possibilidade de que um actor social imponha a sua vontade sobre os outros, de que uma pessoa dirija a sua vontade uma relação social. Esta utilização da vontade pode adotar mecanismos de negociação, manipulação, consenso, conflito, etc.

Segundo este autor, o poder de legitimidade pode ser de três tipos: legal, tradicional e carismático. No contexto familiar, predominam os poderes, legal e tradicional este último  o mais notável em algumas sociedades conservadoras, que se baseia na crença dos segredos das tradições de acordo com o costume, isto é, gerontocracia ( poder dos mais velhos com base na sua maturidade, patriacalismo, patrimonialismo).

Apesar de existirem políticas que tendem a persuadir a desigualdade, poder e gênero, “a casa é de facto, o lugar mais perigoso da sociedade moderna. Em termos estatísticos, seja qual for o sexo ou idade, uma pessoa estará mais sujeita à violência em casa do que na rua ou nas saídas à noite”

O estudo da violência conjugal pode ser analisado sob diversas perspectivas que privilegiam dimensões de análise distintas do mesmo fenômeno. Este pode ser estudado do ponto de vista do poder, da desigualdade de recursos, da inexistência ou insuficiência de controlo social, do gênero, etc. de seguida analisaremos algumas teorias que dão sustentabilidade à análise sociológica no fenômeno violência doméstica/poder.

Desta forma, se visualizamos a família segundo a teoria dos recursos (Blood e Wolfe, 1960), como um sistema de poder que possui, e que lhe é auferido pela sociedade, para manter a ordem social de estratificação sexual.

Este poder, que leva ao domínio do homem sobre a mulher, assenta em estruturas sociais que envolvem a família, como tribunais e a polícia; doutra forma, poder-se-á dizer que o uso da força sobre a mulher é legitimado pelas instituições de autoridade. Como afirma Ana Vicente, “outro forte contributo para a violência endêmica será a indiferença e tolerância por parte das autoridades, polícias, religiosas, civis, empresariais, militares, profissionais, as quais, ao nível da decisão, são constituídas predominantemente por pessoas do sexo masculino”

Goode visualiza a família como um sistema de poder afirmando que o homem faz o uso da “força”, do poder que possui, para manter a estabilidade na família. Este ponto de vista é contraposto por Dobash, argumentando que esta estabilidade familiar é enganadora no sentido em que torna a família num sistema desigual e o casal assimétrico, em termos de poder, sempre em prejuízo para a mulher

Outra forma de abordar os conceitos de poder e de recursos é através da tese de “inconsistência de status” (Weber) que, quando aplica à violência conjugal ou da relação de parentesco, pretende analisar o desequilíbrio ao nível do status entre os cônjuges. Esta desigualdade deriva do facto de uma família ou um elemento da ter acesso a mais recursos que o outro. Acrescenta ainda que, o facto de atualmente a mulher ascender a domínios que anteriormente pertencia ao homem, pode levar a um desfasamento entre o status que tradicionalmente é atribuído ao homem e aquele que realmente é praticado. Esta inconsciência poderá levar a conflitos pois, o homem vê a sua posição de dominação cada vez mais ameaçada

No entanto, é preciso sublinhar que esta tendência para algum nivelamento de poder entre homem e mulher é continuamente acompanhada pela persistência da distribuição desigual de poder entre o casal, mantendo, em geral a mulher numa posição inferior relativamente ao homem, nomeadamente na divisão sexual do trabalho, na divisão de tarefas domesticas, e no cuidado com os filhos. Estas taferas tendencialmente exclusivas às mulheres estão a sobrecarregá-las uma vez que, apesar de já estar garantida a presença feminina no mercado de trabalho, estas não deixam de realizar as suas lidas domesticas, originado o que se chama de dupla jornada. Onde exerce o poder de influencia para a educação das crianças.

Diferenciação social

Muito embora a existência de hierarquia social faça com que a diferenciação social tenha uma dimensão universal, cada sociedade, pela sua cultura e percurso histórico, manifesta de diferentes formas. As teorias sobre a diferenciação social radicam no evolucionismo oitocentista: assim como na natureza se manifestam diferenciações que permitem o estabelecimento de classificações rurais (por gênero, espécie ou subespécie), na sociedade humana os indivíduos e os grupos ocupam diferentes posições, segundo diferenciação da natureza múltipla.

A literatura oral

Habitualmente costuma-se chamar de dialeto qualquer expressão linguística que não seja reconhecida como língua oficial de um país (ausência literária ou de tradição literária). Assim um dialeto pode ser tanto uma variedade lingüística regional do idioma oficial quanto uma língua sem qualquer parentesco com ele.

Em relação à presença de literatura, é preciso lembrar que algumas línguas ágrafas, como as nativas da África e da América, têm rica literatura oral, transmitida por gerações em séculos desde os primeiros contactos com parentes até outras relações. Mas para as línguas européias, ciosas de sua tradição escrita, elas não possuem literatura simplesmente por não produzirem livros.

A questão delicada é a que diz respeito ao “prestígio” de uma variedade. Alguns falares, mesmo próximos língua padrão, são estigmatizadas por motivos históricos ou sociais. Ex: no Brazil, que busca lugar no olimpo do Primeiro Mundo, tudo o que lembra o passado rural é alvo de desprezo. Daí o preconceito contra o dialeto, neste caso concreto, o dialeto caipira e o nordestino foram eleitos como ícones do atraso cultural.

Na tentativa de estabelecer distinção entre a língua e dialeto que não se apoiasse em factores políticos ou sociológicos, alguns buscam critérios relacionados aos aspectos comunicacionais. Onde dois falares podem ser considerados dialetos da mesma língua se os falantes conseguem compreender-se mutuamente; caso contrario teremos duas línguas diferentes. Ex: falantes de Gitonga e de Cicopi; Citswa e Xangana; do português e do espanhol, podem entender-se relativamente, portanto seriam dialetos.

Há que realçar que,os falares vão diferindo pouco a pouco à medida que nos deslocamentos num dado território, é natural que a comunicação entre os moradores de duas aldeias vizinhas seja total, ao passo que o diálogo entre habitantes de cidades distantes  milhares de quilômetros é quase impossível.

Estima-se que nos próximos cem anos 90% das línguas desaparecerão, a maior parte por não ter o status de idiomas nacionais, sendo muitos casos línguas ágrafas, de comunidades tribais. A causa dessa extinção em massa de línguas é a pressão dos idiomas doutras culturas (“civilização”), seja idioma nacional do país. Portanto há necessidade de cada Estado promover essas línguas para o seu rejuvenescimento.

Na carta publicada pela UNESCO, em París,1989, recomenda-se que a literatura Oral/Tradicional/Popular faz parte do patrimônio universal da humanidade, que ela é vínculo por excelência de afirmação da identidade e, simultaneamente aproximação entre os povos, visa estusiasmar a reflexão sobre o ensino desta disciplina a nível escolar e universitário

Bibliografia:

FONSECA, Claudia. De afinidades a coalizões: uma reflexão sobre a transpolenização entre gênero e parentesco em antropologia. Ilha 5(2), 2004, pp5-31.

IVALA, A. Zacarias; et. al. Antropologia cultural, plano de estudo e Apontamento. Nampula. 2007.

NY,Albany, Ecological LiteracyEducation end the transition to a Posmodem World. State Universityof  New York Press, 1992

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www.infopedia.pt/diferenciacaosocial

www.aldobizzocchi.com.br/artigo52.asp

http://pib.socioambiental.org/pt/povo/karo(1217)