Excerto do Fédon:
"Assim Morreu Sócrates"
Eis minha prece: assim seja"! Logo que acabou de falar, sem parar, sem demonstrar a mínima resistência ou enjôo, bebeu até ao fundo.
Então nós, que quase todos havíamos feito o máximo até aquele momento para não chorar, ao vermos que bebia, que já tinha bebido, não pudemos mais conter-nos; minhas forças foram ultrapassadas e minhas lágrimas, a mim também, correram abudantes, de tal forma que, com a face, velada, chorava até me fartar sobre minha sorte (pois, evidentemente não era sobre a dele) sim, sobre meu infortúnio de ser privado de semelhante companheiro! Críton, aliás, incapaz, já antes de mim, de reter as lágrimas, levantara-se para sair. Apolodoro, por sua vez, que já antes, não cessara um instante sequer de chorar, comecou, então, como era natural, a lançar tais rugidos de dor e de cólera, que esmagava o coração de todos os presentes, salvo do próprio Sócrates. "Que fazeis lá? exclamou este; sois mesmo extraordinários! Se mandei embora as mulheres, foi sobretudo pelo seguinte: para evitar da parte delas semelhante falta de medida; pois como me ensinaram, é com palavaras felizes que devemos terminar. Guardem, pois calma e firmeza"! Ao ouvir tal linguagem, sentimo-nos envergonhados e deixámos de chorar.
Ele, porém, continuava a andar quando declarou que sentia as pernas tornarem-se pesadas. Então, deitou-se de costas, como efectivamente lhe recomendara o homem. Ao mesmo tempo, este aplicava a mão aos pés e às pernas examinando-o por intervalos. Em seguida, apertou-lhe fortemente o pé, perguntando-lhe se sentia; Sócrates respondeu que não. Depois, recomeçou na parte inferior das pernas e foi subindo para mostrar-nos que já começava a esfriar e a tornar-se hirto. E, tocando-o ainda, declarou-nos, que quando chegar ao coração, nesse momento Sócrates partirá. Já tinha pois, gelada quase toda a região do baixo-ventre, quando descobriu a face, que antes cobrira, e disse estas palavras, as últimas que pronunciou: "Críton, devemos um galo a Asclépios; pois bem, pagai minha dívida, pensai nela. _ Bom! Isto será feito, disse Críton. Mas vê se não tens mais nada a dizer". A pergunta de Críton ficou sem resposta. Ao cabo de curto momento, ele teve, entretanto, um sobressalto. Então, o homem descobriu-o: o seu olhar estava fixo. Vendo isto, Críton fechou-lhe a boca e os olhos.
Assim, foi o fim que vimos dar a nosso companheiro, o homem do qual podemos dizer, com justiça, que, dentre todos os de seu tempo que nos foi dado conhecer, foi o melhor, e, além disto, o mais sábio e o mais justo.
"Assim Morreu Sócrates"
Eis minha prece: assim seja"! Logo que acabou de falar, sem parar, sem demonstrar a mínima resistência ou enjôo, bebeu até ao fundo.
Então nós, que quase todos havíamos feito o máximo até aquele momento para não chorar, ao vermos que bebia, que já tinha bebido, não pudemos mais conter-nos; minhas forças foram ultrapassadas e minhas lágrimas, a mim também, correram abudantes, de tal forma que, com a face, velada, chorava até me fartar sobre minha sorte (pois, evidentemente não era sobre a dele) sim, sobre meu infortúnio de ser privado de semelhante companheiro! Críton, aliás, incapaz, já antes de mim, de reter as lágrimas, levantara-se para sair. Apolodoro, por sua vez, que já antes, não cessara um instante sequer de chorar, comecou, então, como era natural, a lançar tais rugidos de dor e de cólera, que esmagava o coração de todos os presentes, salvo do próprio Sócrates. "Que fazeis lá? exclamou este; sois mesmo extraordinários! Se mandei embora as mulheres, foi sobretudo pelo seguinte: para evitar da parte delas semelhante falta de medida; pois como me ensinaram, é com palavaras felizes que devemos terminar. Guardem, pois calma e firmeza"! Ao ouvir tal linguagem, sentimo-nos envergonhados e deixámos de chorar.
Ele, porém, continuava a andar quando declarou que sentia as pernas tornarem-se pesadas. Então, deitou-se de costas, como efectivamente lhe recomendara o homem. Ao mesmo tempo, este aplicava a mão aos pés e às pernas examinando-o por intervalos. Em seguida, apertou-lhe fortemente o pé, perguntando-lhe se sentia; Sócrates respondeu que não. Depois, recomeçou na parte inferior das pernas e foi subindo para mostrar-nos que já começava a esfriar e a tornar-se hirto. E, tocando-o ainda, declarou-nos, que quando chegar ao coração, nesse momento Sócrates partirá. Já tinha pois, gelada quase toda a região do baixo-ventre, quando descobriu a face, que antes cobrira, e disse estas palavras, as últimas que pronunciou: "Críton, devemos um galo a Asclépios; pois bem, pagai minha dívida, pensai nela. _ Bom! Isto será feito, disse Críton. Mas vê se não tens mais nada a dizer". A pergunta de Críton ficou sem resposta. Ao cabo de curto momento, ele teve, entretanto, um sobressalto. Então, o homem descobriu-o: o seu olhar estava fixo. Vendo isto, Críton fechou-lhe a boca e os olhos.
Assim, foi o fim que vimos dar a nosso companheiro, o homem do qual podemos dizer, com justiça, que, dentre todos os de seu tempo que nos foi dado conhecer, foi o melhor, e, além disto, o mais sábio e o mais justo.
Excerto do Fédon:
"Assim Morreu Sócrates"
Eis minha prece: assim seja"! Logo que acabou de falar, sem parar, sem demonstrar a mínima resistência ou enjôo, bebeu até ao fundo.
Então nós, que quase todos havíamos feito o máximo até aquele momento para não chorar, ao vermos que bebia, que já tinha bebido, não pudemos mais conter-nos; minhas forças foram ultrapassadas e minhas lágrimas, a mim também, correram abudantes, de tal forma que, com a face, velada, chorava até me fartar sobre minha sorte (pois, evidentemente não era sobre a dele) sim, sobre meu infortúnio de ser privado de semelhante companheiro! Críton, aliás, incapaz, já antes de mim, de reter as lágrimas, levantara-se para sair. Apolodoro, por sua vez, que já antes, não cessara um instante sequer de chorar, comecou, então, como era natural, a lançar tais rugidos de dor e de cólera, que esmagava o coração de todos os presentes, salvo do próprio Sócrates. "Que fazeis lá? exclamou este; sois mesmo extraordinários! Se mandei embora as mulheres, foi sobretudo pelo seguinte: para evitar da parte delas semelhante falta de medida; pois como me ensinaram, é com palavaras felizes que devemos terminar. Guardem, pois calma e firmeza"! Ao ouvir tal linguagem, sentimo-nos envergonhados e deixámos de chorar.
Ele, porém, continuava a andar quando declarou que sentia as pernas tornarem-se pesadas. Então, deitou-se de costas, como efectivamente lhe recomendara o homem. Ao mesmo tempo, este aplicava a mão aos pés e às pernas examinando-o por intervalos. Em seguida, apertou-lhe fortemente o pé, perguntando-lhe se sentia; Sócrates respondeu que não. Depois, recomeçou na parte inferior das pernas e foi subindo para mostrar-nos que já começava a esfriar e a tornar-se hirto. E, tocando-o ainda, declarou-nos, que quando chegar ao coração, nesse momento Sócrates partirá. Já tinha pois, gelada quase toda a região do baixo-ventre, quando descobriu a face, que antes cobrira, e disse estas palavras, as últimas que pronunciou: "Críton, devemos um galo a Asclépios; pois bem, pagai minha dívida, pensai nela. _ Bom! Isto será feito, disse Críton. Mas vê se não tens mais nada a dizer". A pergunta de Críton ficou sem resposta. Ao cabo de curto momento, ele teve, entretanto, um sobressalto. Então, o homem descobriu-o: o seu olhar estava fixo. Vendo isto, Críton fechou-lhe a boca e os olhos.
Assim, foi o fim que vimos dar a nosso companheiro, o homem do qual podemos dizer, com justiça, que, dentre todos os de seu tempo que nos foi dado conhecer, foi o melhor, e, além disto, o mais sábio e o mais justo.
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