Johann Georg Hamann nasceu em Konigsberg (cidade que já fora berço de Kant) em 1730. Não concluiu estudos universitários em virtude de seus múltiplos interesses e de suas leituras caóticas.

Transferiu-se para Londres, ocupando-se de comércio e de ciência das finanças, mas faliu novamente devido a variadas e obscuras vicissitudes. Mas em Londres, em 1757, seu destino foi marcado pelo encontro com a Bíblia e pela emergência de forte vocação religiosa.

Voltando a Konigsberg, passou a sobreviver como empregado alfandegário. Morreu em 1788.

Em sua maioria curtos, seus escritos são elaborados em estilo muito original, produzindo complexo jogo de citações e, sobretudo, de alusões sempre extremamente determinadas, mas muito difíceis de decifrar, até para seus leitores contemporâneos.

O intricadíssimo jogo de citações de frases e palavras, muitas vezes extraídas da Bíblia, ou então dos clássicos, tem sabor quase cabalístico para o leitor moderno. Isso, porém, deve-se sobretudo ao fato de que, por uma série complexa de razões, Hamann escolheu o caminho indireto da ironia socrática para criticar o Iluminismo.

Os "Stürmer" e os românticos se interessaram por ele, mas provavelmente mais por motivos paralelos do que por convergências. Moser o batizou de "o mago do Norte"; Goethe o chamou de "o fauno socrático"; Schlegel encontrou nos escritos elípticos do pensador uma lógica de "abreviador do universo".

Na historia do pensamento posterior, porém, nunca se impõe como um clássico. Entretanto, há algum tempo ocorre lento renascimento do interesse por ele. Com sua clareza e universalidade, a "razão" tão exaltada pelo Iluminismo constitui, na realidade, um ídolo. E os atributos divinos com os quais é incensada são fruto de despudorada superstição. Hamann contrapõe à razão abstrata a vida, a experiência concreta, os fatos reais e a história. E também faz valer energicamente contra a abstração do conceito a concretude da imagem: "Todo o tesouro do conhecimento humano e da felicidade é feito de imagens".

Contra o dualismo kantiano de "sensibilidade" e "razão", ele apresenta a linguagem como o desmentido mais belo dessa concepção: com efeito, a linguagem é a razão que se faz sensível, como o Logos ou "Verbo" divino é Deus que se faz carne. Consequentemente, em Hamann assume papel muito importante o conceito de Revelação: "O livro da criação contém exemplos de conceitos universais que Deus quis revelar à criatura através da criatura. "Os livros da aliança contêm exemplos de artigos secretos que Deus quis revelar ao homem por meio dos hornens".

Sócrates, pai do racionalismo para os iluministas, torna-se para Hamann, ao contrário, uma espécie de génio profético inspirado por Deus. Eis algumas afirmações importantes dos hamannianos "memoriais socráticos": "O que substitui em Homero a ignorância daquelas regras de arte que Aristóteles descobriu refletindo sobre ele, e a ignorância ou a violação daquelas leis críticas em Shakespeare? O gênio.

Essa é a resposta unánime. Sócrates, portanto, podia até ser ignorante, pois tinha um gênio em cuja ciência podia confiar, que ele amava e temia como o seu Deus, cuja paz lhe importava mais do que toda a razão dos egípcios e dos gregos, em cuja voz ele acreditava e através de cujo sopro [...] o vazio intelecto de um Sócrates podia tornar-se tão fecundo quanto o ventre de uma virgem intacta".

E evidente que, nesse horizonte de pensamento, a fé torna-se elemento central, apresentando-se como o fulcro em torno do qual tudo deve girar.

Hamann foi talvez o mais áspero e genial crítico do Iluminismo e o mais denodado defensor daquela religiosidade e daquele cristianismo, que o Iluminismo minara pelas raízes. Sem dúvida, ele foi profeta e corifeu de uma nova época, ainda que o espírito da nova época se tenha desviado para direções opostas às apontadas pelo "mago do Norte".