Nessa tentativa de construir uma "doutrina da ciência", um "sistema" que unificasse as três "Críticas" de Kant, Fichte utilizou muito, de modo expressamente declarado, tudo o que escreveram Reinhold, Schulze e Maimon, tanto o positivo como o negativo.

a) A "Reinhold" Fichte reconhece o mérito de ter chamado a atenção para a necessidade de reconduzir a filosofia a urn princípio único, que não se encontra tematizado em Kant e que cada qual deve procurar por sua própria conta, tendo assim "preparado a fundação da filosofia como ciência".

Entretanto, Reinhold não soube encontrar esse princípio, porque o princípio da "representação por ele indicado vale apenas para a filosofia teórica, mas não para toda a filosofia.

b) A "Schulze" Fichte reconhece o mérito de tê-lo feito reflectir muito e, com suas críticas cépticas, tê-lo feito compreender que a solução de Reinhold era insuficiente, sendo necessário, portanto, procurar o princípio único em plano mais elevado.

C) A "Maimon", julgado como "um dos maiores pensadores da época moderna", Fichte reconhece o mérito de ter mostrado a impossibilidade da "coisa em si", extraindo disso algumas consequências frutíferas , mas sobretudo aplainando-lhe o caminho para chegar as últimas conclusões que lhe permitissem unificar o sensível e o inteligível.

A grande novidade de Fichte, o golpe de génio que o levou a criaqgo da nova filosofia, consistiu na transformação do "Eu penso kantiano" em "Eu puro", entendido como intuiçã pura, que se autopõe (se autocria) e, autopondo-se, cria toda a realidade, e na relativa identificação da essência desse "Eu" com a liberdade.

Fichte insistiu várias vezes em dizer que seu sistema nada mais era do que a filosofia kantiana, exposta com procedimento diferente do de Kant. Entretanto, Kant não se reconheceu na "doutrina da ciência" de Fichte. E tinha razão: ao pôr o "Eu" como princípio primeiro e dele deduzir a realidade, Fichte criava o idealismo.

O "Eu" de Fichte é o princípio originário e absoluto de toda a realidade, e se qualifica essencialmente como actividade que antes de tudo põe a si mesma el portanto, põe todas as coisas; desse modo, o Eu e condição incondicionada de si mesmo e da realidade.

Na metafísica anterior a Fichte, a actividade, o agir, era sempre considerado consequência do ser, o ser era condição do agir; o idealismo de Fichte inverte, ao contrário, o antigo axioma e afirma que: a acção precede o ser, o ser é produto do agir. E, assim, o "Eu penso" kantiano, que era a estrutura transcendental fundamental do sujeito, torna-se em Fichte actividade, auto-intuição (a intuição intelectual que o próprio Kant considerava impossível para o homem), autoposição da qual são deduzidas todas as coisas. O "Eu absoluto" não é o "eu" do homem individual, ao qual pertence um eu sempre e em todo caso limitado pelo não-eu.