O PERIODO DO COLONIALISMO PORTUGUES A PARTIR DE 1930
Em Portugal, as dificuldades económicas e a instabilidade política, social e militar aberta após a implantação da República em 1910, criaram as condições que levariam ao golpe de Estado do general Gomes da Costa em 28, de Maio de 1926 e à implantação de um regime ditatorial em Portugal - o “Estado Novo"- edificado por Salazar, que foi essencialmente um estado corporativista, conservador, colonialista e repressivo. Apenas a crise colonial, colocada abertamente no início dos anos 70, geraria as bases para a transformação democrática de Portugal.
Em relação à Moçambique o que é que significou o Estado Novo de Salazar? Esta e outras questões procuraremos dar resposta nas linhas seguintes.
O golpe de Estado em Portugal em 28 de Maio de 1926, a ascensão de Salazar como Ministro das Finanças (1928), Ministro das Colónias (1930) e Primeiro-Ministro (1932-1968), marcou um novo período para a História de Moçambique: o Colonial-fascismo.
O governo de Salazar surgiu com uma forte componente agrária, tendo-se instalado como um governo de compromisso e arbitragem, promovendo alianças entre uma burguesia fraca mas em ascensão e os grandes proprietários fundiários bem estabelecidos, criando condições para a consolidação da burguesia portuguesa, acelerando a sua acumulação de capital à custa da repressão dos trabalhadores e da intensificação da exploração colonial e colocando Moçambique (e restantes colónias portuguesas) ao serviço dos interesses metropolitanos – É O NACIONALISMO ECONÓMICO DE SALAZAR.
A CONJUNTURA POLÍTICA E ECONÓMICA E OS MARCOS DA VIRAGEM
O NACIONALISMO ECONÓMICO DE SALAZAR
No que respeita à política colonial, o Estado Novo26 enveredou por uma política centralizada em tomo do Ministério das Colónias, interrompendo a política de autonomia que se vinha verificando desde 1914. É assim que a Companhia do Niassa não vê renovada a sua carta concessionária em 1929 e em 1942, coube a vez à Companhia de Moçambique.
Com a cessação dos poderes majestáticos da Companhia de Moçambique, assiste-se à unificação de todo o território que passa a estar sujeito ás mesmas leis e aos mesmos interesses coloniais, no quadro da política nacionalista de Salazar. Restaurava-se a ideia de um Império Colonial Português em que as colónias eram parte integrante de Portugal.
Nas colónias, o nacionalismo salazarista encontrou expressão legal no ACTO COLONIAL e na CARTA ORGÂNICA DO IMPÉRIO COLONIAL PORTUGUÊS (1930).
o Acto Colonial de 1930, espécie de Constituição para os territórios ultramarinos, havia definido como competência exclusiva do Estado a Administração e a cobrança de imposto e mesmo a exploração dos portos. Outro elemento importante foi a definição de um estatuto especial dos indígenas - base para o recrutamento da força de trabalho para as empresas capitalistas e colonos.
Na essência, o Acto Colonial visou legislar os direitos fundamentais da nação portuguesa como potência colonial histórica, definir as condições dos indígenas, delinear a administração ultramarina portuguesa e as relações entre as colónias e a Metrópole. A política colonial deste novo período baseou-se no princípio de que as colónias deviam ser fonte de matérias-primas para a Metrópole e mercados das manufacturas portuguesas bem como recipientes dos desempregados portugueses. Desta forma, Moçambique toma-se um fornecedor importante de algodão para a indústria portuguesa, consumidor do vinho e têxteis portugueses e albergue de camponeses empobrecidos em Portugal tanto em regime de colonatos como nas cidades. Com a publicação do Acto Colonial, foram definidas as linhas em que a futura economia das colónias deveria assentar, e com elas a de Moçambique: "a economia de todas as colónias deveria ser parte integrante da economia nacional".
Outros diplomas também importantes foram a Constituição Portuguesa de 1933 “a organização económica dos territórios portugueses depende da organização económica habitual dei Nação Portuguesa, e ela deve por consequência ser integrada no conjunto da economia mundial", especificando a relação entre a economia das colónias e Portugal, - a Carta Orgânica, publicada para cada colónia, e a Lei da Reforma Administrativa Ultramarina (1933). Por esta Reforma, a administração local ficou sujeita ao mandato efectivo de Lisboa, assegurando-se desta forma, os interesses da burguesia portuguesa. "(...) A imagem que Salazar queria dar era a de uma sociedade assente nos princípios católicos da autoridade e família; da probidade financeira e da moeda forte; do progresso económico planeado alcançado sobretudo com os recursos internos; da neutralidade firme e da independência nacional; e de uma missão civilizadora em África afirmada na sua forma clássica na nova Constituição aprovada para Moçambique em 1933: Constitui o principal atributo da nação portuguesa desempenhar a função histórica de possuir e colonizar os domínios ultramarinos e civilizar às populações indígenas que neles habitam, bem como e exercer a influência moral que lhes é atribuída pelo Padroado no Oriente.
Basicamente, esta legislação marcou o fim da autonomia formal da Província de Moçambique, que passou a designar-se colónia, centralizou os poderes legislativos e financeiros nas mãos do então Ministro das Colónias, procurando colocar Portugal ao nível das restantes potências europeias. O resultado desta política foi a formação e consolidação lenta mas contínua de um capital português. A grande dependência de países estrangeiros foi largamente superada através das dificuldades impostas ao capital estrangeiro e da diversificação de limites externos de capital em vez da hegemonia de uma única como acontecia com a posição da Inglaterra.
As causas do nacionalismo económico podem ser resumidas em três pontos:
- i) acabar com o "caos" administrativo;
- ii) acabar com o domínio do capital estrangeiro não português;
iii) centralização administrativa.
1.2.2. ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DO COLONIAL-FASCISMO
o Estado colonial passa a dirigir toda a política laboral, especialmente através da Direcção dos Serviços e Negócios Indígenas, tomando-se actividades exclusivas dos diversos sectores da política laboral; O Estado cria uma zona de escudo (1932), impondo um sistema de licenças de importação e exportação em relação às trocas com outros países nas operações internas da Colónia, centralizando todas as divisas nos cofres do Estado; Incrementa o sistema de agricultura forçado do algodão e do arroz, obrigando, os camponeses a vendê-los a preços e quantidades estipuladas pelo Estado. Em 1938, por exemplo, cria a JEAC (Junta de Exploração do Algodão Colonial) e em 1941 a Divisão do Fomento Orizícola. Moçambique passa a ser fornecedor de matérias-primas à metrópole, o que permitiu aos industriais portugueses o desenvolvimento da indústria têxtil e sua penetração nos mercados coloniais e internacionais competitivos; Incrementa o desei1Volvimento da cultura do chá, sobretudo na Alta Zambézia; Aperfeiçoa a cobrança do imposto indígena, diversificando as suas modalidades e aumentando os seus montantes. Assim, para além do imposto de capitação, foi introduzido em 1942 o imposto reduzido indígena para as mulheres solteiras, viúvas ou divorciadas há mais de três anos, o imposto remissivo indígena, destinados a desencorajar o não pagamento imediato do imposto de capitação, entre outros.
Limita o poder das Companhias Monopolistas. Em 1942, com a cessação dos poderes majestáticos da Companhia de Moçambique, Portugal passa a controlar efectivamente Moçambique. Introduz os Planos de Fomento.
Entretanto, o mundo é assolado por unia grave crise económica. Esta crise vai-se repercutir nos territórios portugueses, em particular Moçambique. Quais foram os efeitos da Crise Económica Mundial para Moçambique?
De um modo geral, os efeitos foram:
- i) Redução geral dos preços dos produtos agrícolas como o amendoim,milho,copra, açúcar, sisal,
- ii) Aumento do desemprego.
iii) Abandono de algumas actividades produtivas não tentáveis;
- iv) Encerramento de algumas fábricas e empresas agrícolas; Alguns proprietários de plantações para fazer face aos efeitos da crise tomaram as seguintes medidas:
- redução dos custos de produção traduzidas no abandono das actividades não rentáveis, no despedimento do pessoal, no encerramento de algumas fábricas, etc.;
- diminuição da compra de produtos agrícolas a preço muito aquém dos seus custos de produção;
- introdução de novos métodos para aumentar a produtividade, por exemplo: a traçcção animal em vez do trabalho braçal e a utilização de estrumes como fertilizantes.
Enquanto os trabalhadores moçambicanos sofriam os efeitos da crise, Portugal reforçava o seu colonialismo, fazendo com que a Colónia se convertesse na solução dos problemas económicos da sua Metrópole.
1.2.3. O CAPITAL COMERCIAL NO QUADRO DA AGRICULTURA FAMILIAR FORÇADA
O papel de Moçambique com fornecedor de matéria-prima a Portugal foi muito evidente com o algodão, o qual, produzido em regime desumano de trabalho forçado sem qualquer dispêndio do capital em salários, permitiu aos industriais portugueses:
(i) o desenvolvimento de uma das poucas indústrias portuguesas de vulto (a têxtil)
(ii) a sua penetração nos mercados coloniais e europeus com preços competitivos.
O CASO DO ALGODÃO
Uma das mais importantes indústrias portuguesas era a indústria têxtil. Antes de 1926, Moçambique e Angola, produziam cerca de 800 toneladas de algodão contra 17.000 toneladas que a indústria portuguesa necessitava anualmente).
- a) Por que razão foi "instituído o cultivo forçado do algodão e arroz em Moçambique?
- b) Como foi organizado esse processo?
- c) Quais foràm as consequências e a resposta dos camponeses?
Segundo esta lei, o governo fazia concessões de terras (algodoeiras) a Companhias que se comprometiam a erguer uma fábrica de descaroçamento do algodão e um armazém, bem como fornecer sementes à população camponesa e a adquirir destas, o algodão colhido.
Em 1932, para fazer face à baixa no preço mundial do algodão, que se verificou a partir de 1927, o Estado passou a incentivar financeiramente as concessionárias algodoeiras, comprando o algodão de 1a qualidade a 8 escudos metropolitanos contra 5 escudos no Mercado mundial.
Em 1938, com a crescente procura mundial do algodão, aumentando em consequência o seu preço, Portugal, para controlar todos os aspectos da produção e comercialização do algodão, cria a JEAC - Junta de Exportação do Algodão Colonial, com sede em Lisboa. O cultivo do algodão foi responsabilizado aos camponeses num sistema fortemente controlado por agentes da administração colonial e das companhias concessionárias. Os camponeses viam-se obrigados a cultivar o algodão com os seus próprios meios de produção e a vender a colheita a preços fixos a companhia que lhes forneceu as sementes. Este sistema reduzia o tempo e o meio do campesinato para o cultivo da sua subsistência.
Através deste organismo o governo pretendeu estabelecer um maior controlo sobre as companhias concessionárias em Moçambique. O sistema de produção camponesa mantinha-se e as companhias obrigaram-se a desenvolver, mais activamente, a cultura do algodão em concessões alargadas. Toda a exportação tinha de ser aprovada pela JEAC.
De início, em 1939, a JEAC tentou promover o aumento da cultura do algodão através
da propaganda e da persuasão. Em reuniões nos regulados escolhidos para a promoção da cultura, os administradores, chefes de posto, agentes da Junta e missionários propagandearam que o cultivo do algodão seria de grande benefício para o povo, e este aproveitaria do dinheiro da produção e de roupas baratas, de algodão, que seriam produzidas e vendidas localmente.
Mas a prática, mostrou outra realidade: a não ser quando cultivado em solos particularmente apropriados, tais como alguns existentes em Cabo Delgado, Nampula, norte da Zambézia, norte de Manica e Sofala (Chemba), o rendimento por hectare era baixo; os preços oferecidos eram baixos; os camponeses só podiam vender o algodão à Companhia que lhe havia fornecido as sementes, impedindo-o de contactar outras companhias e a viciação na classificação do algodão.
Assim, perante a intensificação desta cultura obrigatória, os camponeses começaram a protestar, fugindo para zonas onde não existia o cultivo do algodão ou para os territórios vizinhos, cozendo ou torrando as sementes antes de lançar à terra, ou mesmo juntando pedras nos sacos de algodão para aumentar o peso.
Mas, as autoridades reforçaram a vigilância organizando e controlando de perto o processo de cultivo, multo em particular através da concentração de camponeses em melhores terras algodoeiras (sistema de picadas) e imposição do prolongamento do trabalho. Apesar desta medidas, a produção algodoeira fracassou pelas seguintes razões:
- A resistência dos camponeses ao cultivo forçado do algodão (fugas);
- A diminuição drástica da produção alimentar;
- Rentabilidade reduzida por unidade de terra e os dispêndios daí resultantes;
- Enfraquecimento dos solos;
- Receio que o colonialismo tinha da reacção internacional face à violência inerente ao trabalho forçado.
OCASO DO ARROZ
A produção do arroz tinha como objectivo fundamental abastecer as necessidades alimentares da população urbana e surgiu no contexto da II Guerra Mundial em que se tornava difícil a importação do arroz do sudeste asiático (via Singapura). Na década 1929-1939, a produção e comercialização do arroz em Moçambique diminuiu, tornando-se mais barato importar arroz a granel do sudeste asiático (via Singapura). Esta importação atingiu cerca de 11.000 toneladas em 1939.
No entanto, a redução significativa da navegação comercial e o desenrolar dos acontecimentos políticos no sudeste asiático, nomeadamente. a expansão do Japão e a queda de Singapura em seu favor, provocaram a interrupção no fornecimento do arroz.
Em resposta a esta última situação. E para promover a auto-suficiência em arroz o governo colonial decidiu introduzir a produção obrigatória do arroz.
O governo decidiu criar Círculos Orizicolas e entregar o fornecimento de sementes aos camponeses africanos e a compra do produto, a concessionários europeus, num modelo repressivo semelhantes ao da cultura do algodão. Assim, é criada em 1942 a Divisão do Fomento Orizícola que tinha poderes semelhantes aos da JEAC.
OUTRAS CULTURAS: situação semelhante ocorre com a cultura obrigatória do chá e do tabaco.
A CONTINUAÇÃO DA EXPORTAÇÃO DE' Mão-de-obra E A DEPENDÊNCIA AO CAPITAL ESTRANGEIRO
O capital português, continuava fraco e pouco competitivo. Não conseguia aliciar trabalhadores com salários mais altos. Assim, para as finanças portuguesas, o trabalho migratório em si, como a obrigação do Transvaal utilizar o porto e caminho-de-ferro de Lourenço Marques, constituíam as principais fontes de receitas em divisas mais importantes.
Portanto, a política do nacionalismo económico, ao contrário de enfraquecer as ligações económicas de Moçambique com os centros mais desenvolvidos da África Austral, sob forma de fornecimento de trabalhadores migrantes e de prestação de serviços ferro portuários, intensificou-se e aperfeiçoou-se com a assinatura de acordos com a África do Sul e Rodésia do Sul. Assim, a economia colonial em Moçambique, ficou integrada no complexo económico da África Austral. As receitas de transportes e de trabalho migratório, constituíram a mais importante fonte de divisas para a economia colonial de Moçambique.