Na idade média a forma estadual tende a perder-se, sendo usualmente os vínculos políticos substituídos por vínculos pessoais. Sensivelmente até à Revolução Francesa (momento de ruptura quanto ao sistema de Relações Internacionais) pode falar-se numa Europa das Pátrias por oposição à Europa dos Estados, inaugurada pelo acto de conquista.

Mesmo durante o período Renascentista e Absolutista, em que os tentáculos Estaduais alastram, fazendo diminuir a privatização da autoridade, outrora verificada, pode-se falar de uma Europa de Base nacional. O momento decisivo de ruptura parece ser, efectivamente, a Revolução Francesa. Pode-se indicar como Carta de Direito Público da Europa, anterior ao Congresso de Viena, o Tratado de Vestefália, que pôs termo à Guerra dos Trinta Anos. Este Tratado, regulando diferenças confessionais e territoriais que estiveram na origem dessa guerra, contribuiu decisivamente para a ruína do Sacro Império Romano-Germânico e para o fim da hegemonia dos Habsburgos na Europa.

Com a abdicação de Napoleão Bonaparte em 1814 e o consequente fim da Era Napoleónica, as potências que se envolveram nas guerras empreendidas pelo imperador francês articularam-se na capital da Áustria, Viena, para traçar os rumos que a Europa tomaria a partir daquele momento. A essa articulação deu-se o nome de Congresso de Viena.

No período de 2 de Maio de 1814 e 9 de Junho de 1815 aconteceu na capital da Áustria uma conferência com os representantes das grandes potências europeias, o que conhecemos como Congresso de Viena. Esta reunião teve como líderes a Áustria, Rússia, Prússia e Inglaterra

Causas do Congresso de Viena

Os governos da Áustria, Prússia, Rússia e Grã-Bretanha concluíram uma aliança em Março de 1814 e juntos representavam o principal instrumento da derrota de Napoleão. O tratado de Chaumont foi assinado em 9 de Março de 1814, um mês antes da primeira abdicação ao trono do francês.

Posteriormente a convite das potências vitoriosas, assinaram aderiram ao tratado, que celebrava a paz, a França, Suécia e Portugal (9 de Março de 1814) e a Espanha em 20 de Julho. O tratado estabelecia que todos os governos deveriam enviar representantes plenipotenciários para um congresso que seria realizado em Viena.

Objetivos do Congresso de Viena

O objectivo principal do Congresso, era refazer a Carta da Europa depois da queda do Império Francês, Tratou-se, pois, de fazer uma regulamentação internacional do território Europeu, Desde logo se pode afirmar a ruptura com o momento anterior (de Diplomacia Agressiva, Revolucionária e Contestatária). Tratou-se efectivamente de um processo pacífico e de certa forma conciliador de regulação da vida internacional.

Os líderes participantes do Congresso de Viena ainda propuseram a defesa de dois princípios gerais: o princípio da legitimidade e o equilíbrio do poder. O primeiro determinava que as dinastias que detinham o poder no período anterior ao processo revolucionário francês deveriam reassumir seus tronos e territórios. O segundo pregava que as potências que ganharam a guerra contra a França teriam o direito sobre territórios fora do continente europeu e poderiam permanecer com aqueles que já lhes pertenciam por merecimento pela participação na luta contra Napoleão Bonaparte. Entre os países que se articularam no Congresso de Viena, a Inglaterra foi o que mais se beneficiou a longo prazo, pois conseguiu garantir a hegemonia militar e comercial nos oceanos, além de grande influência política e económica no continente.

Entretanto, esse retorno à antiga ordem que caracterizou as propostas das potências vencedoras também implicava uma redefinição do mapa geopolítico da Europa, que havia sido profundamente afectado pelo império napoleónico. Para tanto, o czar russo, Alexandre I, propôs a criação de uma aliança.

A Santa Aliança e o Congresso de Viena

Como uma forma de se organizar contra futuros movimentos que colocassem em perigo tudo que havia sido decidido com o Congresso de Viena, foi criado um pacto militar que se denominou Santa Aliança. Proposta pelo Czar da Rússia, ela tinha como principal objectivo fazer com que houvesse uma ajuda mútua das monarquias europeias, tudo em nome da paz, da justiça e da religião. Se por acaso algum movimento liberal ou revolução burguesa tentasse se inflamar contra as atitudes tomadas, a Santa Aliança entraria em acção e evitaria que algo maior ocorresse. Este pacto conseguiu por fim a diversos movimentos liberais, como o movimento de cunho nacionalista, que tentava a todo custo obter a unificação da Alemanha, em 1821.

Porém, com a saída da Inglaterra, que não aceitava que tropas fossem enviadas para a América Latina com a finalidade de reprimir os muitos levantes que ameaçavam o colonialismo, o pacto começou a ruir. Os Ingleses possuíam seus interesses próprios, lucravam com a expansão comercial e queriam conseguir novos mercados com seus produtos industrializados, ficando assim contra a política da Santa Aliança, desaprovando a presença dos militares nas colónias da América.

Países participantes no Congresso de Viena

O congresso foi presidido pelo estadista austríaco Príncipe Klemens Wenzel von Metternich, contando, ainda, com a presença do seu Ministro de Negócios Estrangeiros e do Barão Wessenberg, como deputado. A Prússia foi representada pelo príncipe Karl August von Hardenberg, o seu Chanceler e o diplomata e académico Wilhelm von Humboldt.

O Reino Unido foi, inicialmente, representado pelo seu Secretário dos Negócios Estrangeiros, o Visconde de Castlereagh. Após Fevereiro de 1815, por Arthur Wellesley, Duque de Wellington. Nas últimas semanas, após Wellington ter partido para dar combate a Napoleão, foi representado pelo Conde de Clancarty;

A Rússia foi defendida pelo seu Imperador Alexandre I, embora fosse nominalmente representada pelo seu Ministro de Negócios Estrangeiros;

A França estava representada pelo seu Ministro de Negócios Estrangeiros Charles-Maurice de Talleyrand-Périgord;

A Áustria estava representada pelo seu general-chefe, Metternich.

Inicialmente, os representantes das quatro potências vitoriosas esperavam excluir os franceses de participar nas negociações mais sérias, mas o Ministro Talleyrand conseguiu incluir-se nesses conselhos, desde as primeiras semanas de negociações (BURNS 2005:91).

O congresso nunca teve uma sessão plenária de fato: as sessões eram informais entre as grandes potências.

Devido à maior parte dos trabalhos ser feita por estas cinco potências (com algumas questões dos representantes de Espanha, Portugal, Suécia e dos estados alemães), a maioria das delegações pouco tinha que fazer. Por isso, o anfitrião, Francisco II, Imperador do Sacro Império Romano-Germânico, oferecia entretenimento para as manter ocupadas. Isso levou a um comentário famoso pelo Príncipe de Ligne: le Congrès ne marche pas; il danse (o Congresso não anda; ele dança).

Decisões tomadas no Congresso de Viena

A divisão territorial não satisfez a nenhuma das potências participantes, porém foi restabelecido o equilíbrio entre essas:

  • O Tratado de Paris obrigou a França a pagar 700 milhões de indemnizações as nações anteriormente por ela ocupadas. Seu território passou a ser controlado por exércitos aliados e sua marinha de guerra foi desactivada. Suas fronteiras permaneceram as mesmas de 1789. Luís XVIII, irmão de Luís XVI foi reconhecido como novo Rei;
  • A Rússia anexou parte da Polónia, Finlândia e a Bessarábia;
  • A Áustria anexou a região dos Balcãs;
  • A Inglaterra ficou com a estratégica Ilha de Malta, o Ceilão e a colónia do Cabo, o que lhe garantiu o controlo das rotas marítimas;
  • A Turquia manteve o controlo dos povos cristãos do Sudeste da Europa;
  • A Suécia e a Noruega uniram-se;
  • A Prússia ficou com parte da Saxónia, da Vestefália, da Polónia e com as províncias do Reno;
  • A Bélgica, industrializada, foi obrigada a unir-se com à Holanda formando o Reino dos Países Baixos;
  • Os Principados Alemães formaram a Confederação Alemã com 38 Estados, A Prússia e a Áustria participavam dessa Confederação;
  • A Espanha e Portugal não foram recompensados com ganhos territoriais, mas tiveram restaurado as suas antigas dinastias.

Os princípios básicos do congresso de Viena

O princípio da legitimidade

Defendido, sobretudo, por Talleyrand, a partir do qual se consideravam legítimos os governos e as fronteiras que vigoravam antes da Revolução Francesa. Atendia os interesses dos Estados vencedores na guerra contra Napoleão Bonaparte, mas, ao mesmo tempo, buscava salvaguardar a França de perdas territoriais, assim como da intervenção estrangeira. Os representantes dos governos mais reaccionários acreditavam que poderiam, assim, restaurar o Antigo Regime e bloquear o avanço liberal. Contudo, o acesso não foi respeitado, porque as quatro potências do Congresso trataram de obter algumas vantagens na hora de desenhar a nova organização geopolítica da Europa.

O princípio da restauração

Era a grande preocupação das monarquias absolutistas, uma vez que se tratava de recolocar a Europa na mesma situação política em que se encontrava antes da Revolução Francesa -que guilhotinou o rei absolutista e criou a República; que acabou com os privilégios reais e instituiu o direito legítimo de propriedade aos burgueses. Os governos absolutistas defendiam a intervenção militar nos reinos em que houvesse ameaça de revoltas liberais.

O Princípio do equilíbrio

A organização equilibrada dos poderes económicos e políticos europeus, dividindo territórios de alguns países como a Confederação Alemã, que foi dividida em 39 Estados, tendo a Prússia e a Áustria como líderes e anexando outros territórios a países adjacentes, como o caso da Bélgica, que foi anexada à Holanda.

Directrizes do Congresso de Viena

Momento de reacção conservadora na Europa, articulado na presença de representantes dos diversos países vencedores de Napoleão, o objectivo declarado deste fórum era o de solucionar os problemas suscitados no continente, desde a Revolução Francesa (1789), e as conquistas napoleónicas. Temia-se uma nova revolução.

As directrizes fundamentais do Congresso de Viena foram: o princípio da legitimidade; a restauração; o equilíbrio de poder e, no plano geopolítico, a consagração do conceito de “fronteiras geográficas”.

Restauração e legitimidade

Essa directriz estabelecia que deveriam voltar ao trono (restauração) os legítimos governantes (legitimidade), que estavam no poder antes da Revolução. As antigas dinastias reinantes retornam ao poder. Essa posição foi defendida pelo representante francês, Talleyrand, garantindo, com isso, que os Bourbons retornassem ao poder com a anuência dos vencedores. Talleyrand usou, também, o conceito de legitimidade para evitar que a França, derrotada, perdesse território para seus vizinhos, isto é, conseguiu restaurar as antigas fronteiras (consideradas “legítimas”), anteriores a 1790.

Equilíbrio de poder e fronteiras geográficas

Na visão de Burns (2005:101),Outra decisão importante das grandes potências reunidas em Viena foi a consagração da ideia de balança do poder. Segundo essa perspectiva, considerava-se que só fora possível o fenómeno Napoleão, na Europa, porque ele havia juntado uma tal soma de recursos materiais e humanos que, aliados à sua capacidade política e militar, provocaram todo aquele período de guerras.

As grandes potências decidiram, então, dividir os recursos materiais e humanos da Europa, de tal maneira que uma potência não pudesse ser mais poderosa que a outra (balança e equilíbrio de poder). Sendo assim, nenhum outro Napoleão atrever-se-ia a desafiar seu vizinho, sabedor de que este contaria com os mesmos recursos.

Sendo esse o critério estabelecido, trataram de pô-lo em prática, resultando num mapa europeu em que as etnias e as nacionalidades não foram levadas em consideração, tal como aconteceu com a partilha da Polónia, por exemplo.

Uma vez estabelecida a paz, haveria a necessidade de manutenção de exércitos? Os estadistas reunidos em Viena foram unânimes em responder afirmativamente. Tratava-se de manter forças armadas exactamente para preservar a paz alcançada. A garantia da paz residia, a partir de então, na preservação das fronteiras geográficas estabelecidas justamente para evitar que qualquer potência viesse a romper o equilíbrio, anexando recursos de seus vizinhos e pondo em risco todo o sistema de estados europeus. O princípio geopolítico das “fronteiras geográficas” perdurou até o término da Segunda Guerra Mundial, quando esse conceito foi substituído pelo conceito de “fronteiras ideológicas”, no contexto da Guerra Fria.

Consequências do Congresso de Viena

A Europa nos tempos pré-revolucionários deviam ser restauradas e que cada país devia readquirir essencialmente os territórios que possuía em 1789. De acordo com esse princípio Luís XVIII foi reconhecido como o soberano “legítimo” da França, ao mesmo tempo que se confirmava a restauração da Casa de Orange na Holanda, da Casa de Sabóia no Piemonte e na Sardenha, e dos reis Bourbons da Espanha e das Duas Sicília.

A França foi obrigada a pagar uma indemnização de 700.000.000 de francos, mas as suas fronteiras permaneceram, em essência, as mesmas que em 1789. Outros arranjos territoriais também obedeceram ao critério da volta ao status quo. Permitiu-se que o papa recuperasse as suas possessões temporais na Itália; a Suíça foi restaurada como uma confederação independente, com a sua neutralidade garantida pelas potências principais, ao passo que o reino da Polónia, fundado por Napoleão, era abolido e o país novamente dividido entre a Rússia, a Áustria e a Prússia.

A Rússia anexou parte da Polónia, Finlândia e a Bessarábia.

A Áustria anexou a região dos Balcãs.

A Inglaterra ficou com a estratégica Ilha de Malta, o Ceilão e a Colónia do Cabo, o que lhe garantiu o controlo das rotas marítimas.

O Império Otomano manteve o controlo dos povos cristãos do Sudeste da Europa.

O Reino Unido, o controle de Portugal, Brasil e Algarve.

A Suécia e a Noruega uniram-se.

A Prússia ficou com parte da Saxónia, da Vestefália, da Polónia e com as províncias do Reno.

A Bélgica, industrializada, foi obrigada a unir-se aos Países Baixos, formando o Reino dos Países Baixos.

Os Principados Alemães formaram a Confederação Alemã, com 38 Estados. A Prússia e a Áustria participavam dessa Confederação.

A Espanha e Portugal não foram recompensados com ganhos territoriais, mas tiveram restaurado as suas antigas dinastias. Portugal foi elevado a Reino Unido.

 

Bibliografia

Burns, Edward McNal, História da Civilizacao Ocidental: Do homem das cavanas as noves especiais, Vol. 2, S. Paulo: Globo, 2005SOBOUL, Albert. A revolução francesa. São Paulo: DIFEL, 1985.HERMET, Guy. História das Nações e dos Nacionalismos na Europa. Lisboa: Editorial Estampa, 1996.MOORE JUNIOR, Barrington. As origens sociais da ditadura e da democracia. São Paulo: Martins Fontes, 1983TOCQUEVILLE, Alexis de. O antigo regime e a revolução. Brasília: UNB, 1989.HOBSBAWM, Eric. A era dos Impérios. São Paulo: Paz e Terra, 2006.KENNEDY, Paul. Ascensão e queda das grandes potências. Rio de Janeiro: Elsevier, 1989.