É sabido que o sistema comercial de tipo monopolista implantado pela Coroa Portuguesa, tendia a exigir preços elevados pelos artefactos vendidos e a oferecer preços reduzidos pelas matérias-primas compradas. Além disso, dificilmente conseguia abastecer o mercado africano com os artigos de maior procura. Reunidas estas condições para o desenvol-vimento de prósperos contrabandos, Angoche surgiu como centro ideal para o efeito. É que o desvio, para Norte, da rota entre o litoral e o planalto aurífero já se encontrava consolidado por ocasião da chegada dos Portugueses.

Os islamizados que dominavam o comércio com o inte-rior agiam como sujeitos económicos independentes e, recorrendo ao vale do Zambeze, procuraram evitar a interferência do xeique de Sofala. As mercadorias importadas partiam de Angoche em zambucos até ao delta do Zambeze, onde eram descarregadas na capital de um chefe poderoso denominado Mongualo que cobrava direitos e alugava canoas para o longo transporte fluvial até ao mercado de Utonga, perto da actual Sena.

Seja como for, uma vez instalada a feitoria de Sofala notaram os Portugueses que o intercâmbio comercial decaía de modo alarmante. Melhor informados e após um período de relações pacíficas com Angoche decidiram atacar o sultanato em 1511. Todavia, não deixaram no local qualquer guarnição. Acresce que, nesse mesmo ano, tiveram que libertar o xeique aprisionado, trocando-o pelo comandante de um barco naufragado. A. Lobato considera que esta acção redundou num completo fracasso político porque cedo o sultanato conseguiu restabele-cer-se.

A lenta extinção do primeiro período de prosperidade de Angoche está estreitamente relacionada com o progressivo domínio do vale do Zambeze pelos Portugueses e seus agentes, domínio que provocou a in-terrupção das ligações comerciais daquele porto com o planalto aurífero. Mas para esse declínio também contribuíram as rivalidades internas entre as linhagens dirigentes. Segundo tradições recolhidas por E. Lupi foi Inhanandare, filho de Xosa e neto de Hassani, imigrante de Quílua, que deu início à linhagem que se arrogava o direito exclusivo de exercer o cargo de sultão.

Os restantes filhos do fundador e de sua esposa macua Muana Moapeta, deram origem a outras três linhagens: Inhamilala, M’bilinzi e Inhaitide. Os membros destas quatro linhagens dirigentes recebiam colectivamente a designação de Inhapaco, clã matrilinear da Muana Muapeta. A necessidade de combinar dois direitos sucessórios radicalmente distin-tos o patrilinear dos islamizados e o matrilinear dos Macuas deu origem a um complexo sistema dualista e de alternância que, na segunda metade deste século, foi causa de prolongada guerra civil, saldada pela expulsão dos Inhanandare da área do poder. No final do século o comércio tinha importância tão reduzida que o feitor português acabou por ser retirado.

Bibliografia  

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