PRAZOS: é uma expressão de origem latina que significa “contrato”.

PRAZO DA COROA: é uma porção ou concessão de terra de um direito real – enfiteuse concedida pela coroa portuguesa a um indivíduo – prazeiro por um período de três gerações.

Origem e formação

Com o agravamento das contradições no Estado dos Mwenemutapa, novas unidades políticas onde o estrato dominante era formado por mercadores portugueses estabelecidos como proprietários das terras (compradas, conquistadas ou doadas), vão emergir, dando origem aos prazos.

O objectivo da criação dos prazos pela coroa portuguesa era de incrementar o povoamento da população colona; controlar as terras situadas ao longo do rio Zambeze e de ocupar efectivamente os seus territórios coloniais.

Os prazos da coroa surgiram no Vale do Zambeze entre Quelimane e Zumbo, na segunda metade do século XVI (1530). Portanto, Portugal querendo garantir e defender as rotas comerciais e uma livre circulação dos produtos de troca (ouro e marfi, tecidos, colares de missangas, armas de fogo, munições e bebidas alcóolicas) para o interior e ocupar a nossa terra de maneira mais organizada, para melhor explorar as nossas riquezas, enviou para Moçambique grupos de portugueses e cristãos de Goa que se fixaram no ale do Zambeze. Foi neste contexto da penetração portuguesa no vale do Zambeze (1530), que nasceram os prazos.

Contudo, o sistema de prazos foi posto em prática no início do século XVII quando os portugueses que aí se encontravam começaram a receber grandes extensões de terra (5 léguas = 25km2) ao longo do rio Zambeze, dadas pelo Vice-rei da Índia (em nome do rei de Portugal), por um período de 3 a 3 ou 2 a 2 gerações.

O pedido da ocupação do Prazo só podia ser feito pela filha branca do prazeiro mediante o pagamento de uma renda – o foro. Contudo, os senhores de terra não pagavam o foro e não se sentiam vassalos da coroa portuguesa, sendo que cada um era rei da sua propriedade.

A sucessão na posse do prazo era feita por via feminina descendente português, caso contrário as terras eram lhes retirada. Nesse período era difícil encontrar portugueses interessados em emigrar para África, daí foi decretada uma lei que absorvia todos os criminosos condenados à morte, aventureiros, mercadores ansiosos de se tornarem heróis nacionais com condição de irem “civilizar a África”. É assim que se diz que o prazo era o “lixo do lixo”  que compunha parte da sociedade portuguesa.

Objetivos da criação dos prazos

O governo de Lisboa, ao instituir o sistema de Prazos, pretendia:

Acelerar a colonização de Moçambique; Incrementar o povoamento da população colona;

Rentabilidade económica de Portugal;

Controlar e sedentarizar os soldados, criminosos e ventureiros;

facilitar o processo de comercialização de produtos com os árabes;

acelerar a colonização de Moçambique com o incremento da população colona.

Requisitos para a ocupação dos prazos

Ser de sexo feminino em especial viúvas dos guerreiros europeus;

Ser de origem ou descendência portuguese ou indiana;

Habitar dentro dos prazos; cumprir os deveres.

Deveres dos prazos

Praticar a agricultura; administrar a justiça, a economia, etc;

Proteger os habitantes africanos residentes nos prazos;

Proteger e auxiliar os chefes em casos de guerras;

Pagar imposto anual – foro à coroa, correspondente a 1/10 do rendimento do prazo e o recolhido dos impostos;

Expandir a civilização portuguesa e a fé cristã através dos seus domínios.

Ora, na instalação do sistema de Prazos surgiram dificuldades: a maioria dos prazeiros era constituída por criminosos, opositores políticos do regime e desertores (aquele que abandona) do exército que cumpriam penas de degredo (exílio) em Moçambique. Eram indivíduos que não se identificavam com os interesses da Coroa, e por isso, extremamente limitados para agirem como agentes executores da vontade do governo de Lisboa. Assim com o tempo, o sistema de O Prazos em vez de funcionar em função dos interesses da monarquia portuguesa, passou a funcionar em benefício dos prazeiros, que se preocupavam com a conquista e controlo de maior numero de terras e o aumento do seu poder político e militar, para garantir a sua sobrevivência.

Tentativas de regulamentar os prazos

O governo português na tentativa de disciplinar e exercer um certo controlo sobre a actividade dos prazeiros, puplicou leis que visavam introduzir reformas no sistema. Em 1667 foi publicada a primeira reforma, mas seus resultados foram nulos, pois os prazos continuavam a não respeitar a Coroa Portuguesa e continuavam a administrar os prazos a seu bel-prazer.

Em 1760, foi publicada a segunda reforma, que dentre vários aspectos especificava que: os prazos não deviam ter mais de três ou quatro léguas quadradas; os prazos só podiam ser autorizados pelo governo de Lisboa, depois de um período experimental de 4 anos; os prazeiros deveriam permitir a fixação de outros europeus dentro dos seus terrenos; deveriam contribuir na manutenção de fortes, na construção de estradas e travessias de pontes, em tempos de seca e, contribuir também em homens e armamentos para as expedições.

Apesar desta legislação ser bastante exigente, os prazeiros rejeitaram as reivindicações portuguesas quanto às suas terras. Estas contradições resultaram na instabilidade política dos prazos.

Actividades económicas

Os prazeiros gozavam de uma independência quase total:

– Fixavam os impostos (mussoco – tributo em géneros) a serem pagos pela população camponesa residente dentro do prazo e seus arredores;

– Condenavam à morte por enforcamento, chicotadas, palmatoadas a todos que se recusassem a acatar as suas leis;

– Tinham a sua própria força militar, formada principalmente por escravos e mais tarde por mercenários.

Do ponto de vista económico, até finais do século XVIII comércio do ouro e marfim configuravam a base económica de acumulação primitiva do capital dos prazeiros. Os camponeses das Mushas  tinham a seu cargo a produção material de subsistência, canalizada parcialmente para a aristocracia prazeira através da relação de produção fundamental expressa no Mussoco, uma renda em géneros.

Mais tarde, era baseada na pilhagem feita durante as incursões militares, no comércio de peles e de escravos.

Dentro dos prazos, os escravos encontravam-se divididos em dois grandes grupos com funções distintas:

Exército (A-chicunda) garantia defesa do prazo, a organização de operações de caça de elefantes e de escravos, cobrança de impostos, etc.

Domésticos: produção de alimentos, mineração do ouro e a prática de uma indústria ligeira (barqueiros, pescadores, carpinteiros, etc).

Estrutura sócio-política

A administração dos prazos era independente da coroa portuguesa e locais. O Prazo era dividido em ARINGAS e servia de defesa e era chefiado pelos FUMOS.

  • No topo encontramos osCHUANGAS vigiavam e controlavam a actuação dos Mambos e dos Fumos. Eramuma espécies de inspectores que residiam junto dos Mambos e dos Fumos e deles davam notícia regular aos prazeiros/ viviam actuação dos Fumos e Mambos;
  • A-CHICUNDAS,garantiam a segurança militar e escoamento dos produtos dos camponeses;
  • MUSSAMBAZES,eram mercadores negros especializados – comerciavam;
  • MUANAMAMBOS E MACAZAMBOS,geriam a administração interna;
  • NIACODAS E ENSACAS, mineravam;
  • MUSHAS OU CAMPONESES,tinham ao seu cargo a produção material para a subsistência e uma parte era canalizada a aristocracia prazeira através do imposto – MUSSOCO. Por outro lado, alimentavam milhares de cativos.

O aparato ideológico

Os prazeiros aproveitaram da ideologia local – as práticas mágico-religiosa, o culto dos espíritos, a invocação das chuvas, etc., garantes da reprodução e das relações da produção. À semelhança dos Mwenemutapas, os prazeiros usavam o MUAVI, uma bebedagem tóxica que se tomava para descobrir a culpabilidade de alguém num determinado delito ou acusação de feitiçaria. Recorriam também aos advinhos para realizar qualquer negócio, viagem, etc.

Os proprietários de Prazos tinham o direito de julgar as disputas locais (milandos).

Em casos de morte de um prazeiro (antes do Mambo), instalava-se a desordem, pilhagens e até homicídios e realizavam um ritual de uma situação de caos generalizado – o choriros.

Decadência

Por volta de 1730, a maior parte dos prazos existentes entraram em decadência ou tinha sido abandonado. Na primeira metade do século XIX acentuava-se a decadência dos prazos, devido aos seguintes factores:

► A competição entre os prazeiros e entre os povos vizinhos;

► A exportação dos camponeses e A-chicundas garantes da segurança militar e alimentar;

► A invasão das forcas de Báruè e Monomutapas aos Prazos entre 1820 – 1835;

►  A invasão do Nguni em 1832 em que até 1840 já tinham ocupado 28 dos 46 prazos, obrigando-os a pagar tributos;

► O despovoamento em que em fuga, os A-chicundas atacaram os prazos e destruíram as rotas comerciais do sertão;

► O baixo nível de produção provocado pelas secas, epidemias e elevadas necessidades de consumo.

 

Referencias

DHUEM. História de Moçambique: Parte I- Primeiras Sociedades Sedentárias e Impacto dos mercadores, 200/300-1885; Parte II- Agressão Imperialista, 1886-1830. 1ª Edição, Vol. I, Maputo, 2000.

KI- ZERBO, Joseph. História de África Negra. Mira Sintra, Publicações Europa – América; Vol. I, 3ª ed. 1999.

NEWITTI, Malyn. História de Moçambique. Edição, Publicações Europa – América, 1997

SOUTO, Amélia de Neves. Guia Bibliográfico para Estudante de História de Moçambique. (200/300-1930), Maputo, 1996.