
Diferente de Rousseau, Voltaire assumiu o papel de um típico historiador iluminista, explicitado no Dicionário filosófico de 1747, especialmente no verbete história, deixando registrado mais do que sua própria concepção o paradigma de sua época.
Para Voltaire, a “história é a narração dos fatos considerados verdadeiros, ao contrário da fabula, narração de fatos considerados falsos”.
A história se dividiria em:
- “História das opiniões”, responsável por uma simples coletânea “dos erros humanos”.
- “História das artes”, considerada como “a mais útil de todas”, por “unir o conhecimento da invenção e do progresso das artes à descrição de seus mecanismos”.
- “História natural, impropriamente denominada história”, a medida que “parte essencial da física”.
- “História dos acontecimentos”, dividida em “sagrada e profana”, cabendo a primeira a narrativa de “uma sequência de operações divinas e miraculosas”, e a segunda a narração dos feitos dos homens.
Segundo Voltaire, a origem de toda história estaria nas narrativas, que perderiam “gradativamente a probabilidade” de verossimilhança de geração para geração, degenerando “com o tempo” e passando a constituir mais uma “fabula” do que uma história propriamente dita.
Por este motivo, as narrativas sobre a “origem” de todos os “povos” seriam sempre “absurdas”, uma vez que estariam envoltas por uma aura de fabuba; ou seja, seriam por um lado “uma pintura viva da natureza” e por outro uma obra da “imaginação”.
Portanto, ao contrário de Rousseau, para Voltaire, o estudo da história “moderna”, leia-se contemporânea, seria mais recomendado, já que “menos fabulosa” do que a antiga, onde “as coisas prodigiosas [são] improváveis”.
Nas palavras de Voltaire, “o único meio de conhecer com relativa certeza alguma coisa sobre história antiga” seria através dos monumentos, fazendo parte destes não só as obras arquitetônicas e artísticas, como também os documentos.
Sendo dos documentos escritos na antiguidade escassos, raros períodos desta época poderiam ser conhecidos com segurança quanto sua verossimilhança.
Na verdade, ele assume a postura que tornaria típica de um historiador cientificista, afirmando que só podemos reconstituir o passado a partir de documentos que comprovem os fatos narrados.
Dentro desta concepção, a história, mesmo na narrativa moderna, não ofereceria certezas, mas sim “probabilidades”, uma postura que seria adotada pelos historiadores somente no século XX.
Seria impossível reconstituir qualquer período histórico sem recorrer à imaginação, pois a memória reteria os fatos, mas a imaginação seria responsável por sua composição, ao que Voltaire termina concordando com Rousseau.
No entanto, apesar de recomendar o estudo da história contemporânea, por ser mais certa e segura, para Voltaire, a utilidade da história não estaria em tornar possível um melhor conhecimento do presente.
Em concordância com o paradigma histórico iluminista, seria dever da história “mostrar nossos deveres e direitos sem ter aparência de nos querer ensina-los”.
Segundo explicitado no verbete “cadeia dos acontecimentos”, do Dicionário filosófico”, embora “os acontecimentos” estejam “encadeados uns nos outros por uma fatalidade invencível[,] (…) nem todo movimento” se propaga “progressivamente, até dar a volta ao mundo”; de modo que “ao acontecimentos presentes não [são] as crias de todos os acontecimentos do passado”, mas teriam “linhas diretas colaterais”.
Portanto, escrever a história não seria apenas realizar uma “coletânea de jornais”, mas sim retratar “detalhes, fatos, (…) datas precisas, (…) costumes, (…) leis, (…) usos (…), comércio, (…) finanças, (…) agricultura, (…) [ou] população”.
O que seria necessário para ilustrar um exemplo do passado, instruindo o homem sobre seus deveres e direitos; sendo a história antes memória do que ciência