Definição

Colonatos eram regiões cujo ordenamento era destinado a fixação de colonos europeus que foram organizados numa tentativa de recriar em Moçambique a pequena propriedade rústica portuguesa. Por outro lado os colonatos tinham objectivo de construir barreiras ao avanço de qualquer movimento nacionalista que na altura emergia por quase toda África e dava em Moçambique os primeiros sinais.

Colonização branca em Moçambique

Os imperialistas tinham privilegiado sempre a transferência do fluxo de emigrantes de Portugal e das ilhas para África em alguns aspectos Portugal assemelha-se a uma ilha como a sua adjacente madeira é uma comunidade que as pessoas tiveram de abandonar a fim de arranjar emprego e por vezes mesmo sobreviverem.

No Século XIX Brasil e estados unidos da América foram os principais destinos dos emigrantes, cujas remessas cobriam normalmente os défices de balança de pagamentos de Portugal verificou-se também emigração das ilhas atlânticas, o que constituiu em particular um factor na experiencia de vida dos madeirenses e cabo verdeanos. No entanto poucos emigrantes tinham ido para os territórios portugueses em África, a excepção dos condenados que ate década de 1930, continuavam a ser enviados para Angola e Moçambique a fim cumprirem as penas.

Tinham sido introduzidos desde finais do Século XIX os esquemas de colonização e as viagens subsidiadas para emigrantes, depois da I GM registou-se uma colonização maciça de emigrantes brancos cheios de esperança em ambas principais colónias. Contudo estes esquemas iniciais não foram considerados plenamente. Os emigrantes portugueses não possuíam uma especialização e muitas vezes eram analfabetos desprovidos de capital, pelo que as autoridades coloniais achavam com frequência que eles v tinham de ser sustentados pelo orçamento colonial.

Os que se haviam instalado nas zonas rurais vinham-se embora, mudavam para as cidades, onde ficavam no desemprego e se estabeleciam como comerciantes itinerantes e mais tarde como motoristas de pesados ou então emigravam outra vez para África do sul ou na Rodésia. Consequentemente em 1928 existiam provavelmente apenas 18000 portugueses brancos em Moçambique. Quando Salazar veio ocupar o poder viu que as somas gastas com os emigrantes brancos podiam ser objecto de cortes, permitindo o equilíbrio dos orçamentos coloniais.

Durante a década de 1910, todos os governadores-gerais da colónia de Moçambique tentaram sem sucesso mobilizar investimentos para o desenvolvimento do Limpopo. Apenas o governador Manuel Moreira de Fonseca iniciou actividades concretas ao mandar estudar a viabilidade da irrigação do vale e conseguiu arrecadar algumas verbas para financiar o estudo.

Entretanto na década de 1920 iniciaram estudos com o engenheiro Inglês Jhon Aylmer Balfour em coordenação técnica do engenheiro António Trigo de Morais. Durante a pesquisa os dois engenheiros tiveram desentendimentos, que foram arbitrados pelo alto-comissário Hugo de Azevedo Coutinho que decidiu confiar-lhes em separado a pesquisa, onde o primeiro esteve na povoação de Ngajane em 1924, e o segundo foi confiado em conhecer o leito de Limpopo desde a nascente até a Foz .

A prática da cultura do algodão no vale de Limpopo

Em 1932 a cultura de algodão era feita por machambeiros que tinham charruas, mas a partir de 1942, esta cultura generalizou-se pela primeira quando o governo português percebe que não se obtinham lucros suficientes se a produção continuasse a ser feita pelos pequenos grupos de machambeiros, assim decidiram que todos deviam cultivar o algodão. Com o aumento da necessidade do algodão, os machambeiros passaram a ser obrigados a abandonar as suas machambas de milhos para priorizar o cultivo de algodão mas estes procuravam em simultâneo cultivar o algodão e o milho em suas machambas, o que levava-os a ser castigados pela polícia colonial. Após a colheita o algodão era classificado em categorias (primeira e segunda), o que era articulado pelos compradores de modo a lhes beneficiar e pagar um valor inferior ao que era de facto devido.

A criação do colonato do Limpopo

Os colonatos foram criados em zonas agrícolas de grande fertilidade, nos principais vales fluviais (Limpopo-1954 e Revué), e nas terras altas de Lichinga e Montepuez. Na província de Manica tínhamos o colonato de Sussundenga e em Niassa o colonato da nova madeira, próximo de Lichinga.

A conjuntura política marcada pelo fim da IIGM repercutiu na rápida apreciação, revisão e aprovação do projecto de irrigação de Limpopo.

O colonato do Limpopo foi criado no âmbito do I Plano de Fomento (1953-1958). Este plano, segundo o governo português, constituiu uma tentativa de reunir um conjunto diversificado de empreendimentos destinados a promover o desenvolvimento nas províncias ultramarinas e tinha como objectivo explorar sistematicamente os recursos dos territórios, estabelecer famílias portuguesas e regular o movimento dos trabalhos Africanos.

O aproveitamento dos recursos incluindo povoamento, transportes e comunicação, eram também zonas estratégicas do futuro desenvolvimento agro-industrial. Devido á combinação de factores económicos e geográficos, a sede do colonato foi estabelecida em Ngajane.

Estes grandes projectos de engenharia destinavam-se a congregar vários aspectos de desenvolvimento. A Barragem iria fornecer energia eléctrica, represaria água para a irrigação e controlo de cheias numa área reservada de 31.000ha, distribuídos em 6.000ha de lameiro comunitário, 4.500ha de exploração leiteira e 1.500ha de luzernal, a área remanescente dessa distribuição construiu-se as aldeias e as respectivas roças irrigadas.

Por outro lado, o sistema de regadio tinha objectivos económicos e políticos. Visava aumentar a produção nacional de arroz, reduzir a dependência de alimentos básicos provenientes dos países vizinhos e trazer de Portugal várias famílias de camponeses pobres, atingindo-se assim o problema de desemprego na Metrópole. O objectivo político era de reforçar a ocupação portuguesa em Gaza cuja maior parte dessa área foi demarcada nos territórios dos conselhos de Guijá e Bilene, uma importante infra-estrutura de transportes, como estradas e caminho-de-ferro.

Vale sublinhar que os projectos de engenharia foram construídos com intuito de explorar os recursos naturais e povoar o vale de Limpopo. Contudo os colonos brancos que eram enviados no vale a maior parte eram analfabetos e desprovido de capital tendo se envolvido com as mulheres nativas e invadiam propriedades dos camponeses locais.

O povoamento do colonato de Limpopo

A partir da década de 1940, sobretudo a pós a II GM, o governo português, de acordo com o projecto já formulado de manter as colónias com o estatuto de províncias ultramarinas incentivou a imigração branca. Onde a maioria dos imigrantes eram camponeses oriundos das regiões mais pobres, que vinham atraídos pelos recursos postos a sua disposição, essencialmente terras expropriadas aos camponeses locais.

Com a criação do colonato de Limpopo em 1954, Onde foram instaladas as primeiras 10 famílias vindo de Portugal que foram distribuídas em duas aldeias pilotos, uma na povoação de Ngajane, e a outra á Montante aldeia de barragem, dando inicio ao povoamento do Limpopo. Todavia, o plano de urbanização do colonato foi concebido de modo a que os aglomerados populacionais se organizassem em forma de aldeias de povoamento agrupados, criando-se assim, uma réplica da família católica portuguesa que segundo Salazar era forma fundamental para o seu regime.

Deste modo, com a necessidade de se resolver o problema de um crescente número de desempregados nas zonas urbanas da metrópole, viu-se oportuno a alocação de colonos nestas regiões agrícolas cujas passagens e custos de instalação foram assegurados pelo Estado colonial português através de verbas orçamentadas pelos planos de fomento.

 Ressalta-se, entretanto, que neste período, a maioria dos trabalhadores em Moçambique eram nativos africanos que se viam compelidos pela política do trabalho obrigatório, que foi reintroduzido em 1926. Por outro lado, muitos dos colonos vindos da metrópole, não conseguiam levar a cabo os trabalhos no interior daquele território e se dirigiam para as cidades costeiras.

Entretanto, no início da década de 50, com o desenvolvimento dos colonatos, as famílias rurais receberam consideráveis empréstimos e subsídios para a implementação dos mesmos. Por outro lado, Salazar pretendia criar colónias multi-raciais. Morais, apud. Ferreira (2005), afirma que:

A obra do povoamento que se pretende realizar, enraizada no regadio, é para os brancos e para pretos e situa-se no caminho seguido por Portugal desde sempre na sua acção civilizadora. É uma obra em que a vida em conjunto de brancos e pretos será fraternalmente ligada pelo anseio engrandecimento espiritual e material da nação (p. 28).  

Do exposto pode perceber-se que o objectivo de Salazar era de criar uma classe de agricultores africanos que se tornariam apoiantes do regime através da incorporação no estado colonial. Foi nessa perspectiva que em 1959, permitiu-se a entrada de agricultores africanos nos colonatos, na mesma base que os portugueses. Não obstante, entre negros existia diferenciação social, este facto notava-se pelo facto de alguns dominar as técnicas de produção e poderem aumentar a sua produção com bons resultados. Neste sentido, os camponeses mais favorecidos pelo governo português eram os assimilados pelo facto de ter certo nível de escolaridade, dominavam as técnicas de produção e apresentavam bons resultados nas suas colheitas.

Posse de terra e conflitos

A emigração massiva de trabalhadores acelerou, a deterioração das actividades de produção agrícola alimentar. Para este agravamento, contribuíram também a expropriação dos terras agrícolas férteis dos vales do Incomati e do Limpopo, a favor dos colonos portugueses. Os camponeses, tanto ricos como pobres, foram obrigados a ceder o seu lugar aos colonos trazidos de Portugal com o objectivo de cumprirem a missão civilizadora.

Estes colonos eram camponeses pobres e na sua maioria analfabetos. Nas obrigações contratuais, esses colonos estavam proibidos de assalariar trabalhadores ou possuírem outras ocupações, isto constituiu um mecanismo de controlo social que o governo português encontrou para que os colonos brancos não se transformassem em exploradores ou agricultores autónomos, mas sim em verdadeiros camponeses que estariam ao serviço do Estado. Ainda assim, a partir dos anos 50, mas sobretudo na década de 60,em algumas áreas do vale do Limpopo, começou a surgir uma produção camponesa comercial pela criação de cooperativas.

Os bens como a terra, a habitação, o gado que eram entregues aos colonos, eram propriedade do Estado Colonial. Se o colono resolvesse abandonar ou fosse expulso do colonato, perdia todos os bens que poderiam ser seus se cumprisse escrupulosamente todas as suas obrigações contratuais. Fundamentalmente os que exploravam as terras dos Colonatos em regime de fruição gleba eram obrigados a pagar à BTL (Brigada Técnica de Limpopo) um 1/6 e um 1/10 do valor da produção agrícola respectivamente. De referir que todos os ocupantes das terras do regadios não possuíam direitos de propriedades definitivas sobre terra, nem sobre residência, gado e outros bens, salvo se já tivesse pago os montantes correspondentes aos bens postos à sua deposição pelo Estado através da BTL.

 Para adquirir o título de propriedade era muito difícil, devido aos custos dos bens postos a disposição dos colonos; as proporções de terra atribuídas aos colonos (4 ha), não permitiam a curto prazo o pagamento da divida existente; a estrutura fundiária adaptada, baseada em parcelamento de pequena e média dimensão não permitia o retorno rápido do investimento feito para além de que maior parte dos colonos não tinham experiência da agricultura irrigada e do cultivo de certas culturas.

A posse de terra no colonato de Limpopo era diferenciada em 4 grupos a saber: Colonos brancos, Colonos negros, Agricultores em regime de fruição de gleba, Agricultores com terras apenas no sequeiro.

Colonos brancos eram atribuídos casas de habitação tipo 3 mobiladas, estábulo para a guarda de animais e de instrumentos de trabalho, uma área irrigada de 4 ha e 24 ha de terra de sequeiro, gado e subsídio de alimentação no 1º ano de instalação. Beneficiavam também de assistência médica gratuita e de assistência técnica nos trabalhos agrícolas a título de empréstimo, usufruíam de maior privilégio, eram protegidos pela BTL, possuíam as terras de melhor qualidade e com fácil acesso a água, possuíam um contracto com a brigada.

Colonos negros a segurança de posse de terra eram assegurados pelo contrato que possuía e garantida pela maior produção. A sua permanência no regadio, como colonos, era importante para materializar o ideal da criação de sociedades luso-tropicais. A seguir aos colonos brancos, eram os que detinham maior privilégio;

 Agricultores em regime de fruição de gleba possuíam menos segurança na posse de terra no regadio, uma vez que exploravam áreas de regime probatório. As suas terras iam até um máximo de dois hectares e eram de pior qualidade. Não gozavam de nenhum direito exceptuando o crédito da campanha e a qualquer altura podiam ser afastado do regadio;

Agricultores com terras apenas no sequeiro este tinham segurança de posse de terra no sequeiro. No entanto, estavam no processo de requerer terras do regadio. Era nesse grupo que se seleccionavam os agricultores em regime de fruição de gleba.

A situação de posse de terra durante o período de funcionamento do Colonato não deve ser vista de uma forma linear. Visto que, à medida que os anos iam passando, e tendo em conta as condições reais, os mecanismos de gestão da terra também se foram alterando no sentido de uma melhor adaptação aos interesses políticos, económicos e sociais do governo colonial. O que mostra que durante os 20 anos de funcionamento do colonato de Limpopo houve alterações que foram ditadas pelas necessidades e exigências que foram acentuadas em 1959 com a entrada de africanos dentro do colonato o que obrigou a BTL a alterar duas categorias e alargando os privilégios. Por exemplo os agricultores negros passaram a ter estatuto de colonos e beneficiando-se de habitação e acesso ao crédito.

A relação entre o colonato e população local

Como já referiu-se, Portugal ao instalar o colonato pretendia reunir um conjunto diversificado de empreendimentos destinados a promover o desenvolvimento da metrópole e povoar o vale do Limpopo.

A instalação do colonato em 1954, nesta região de vale de Limpopo, implicou a expropriação das terras férteis dos camponeses locais. À medida que colonatos aumentavam, novas áreas ficavam abrangidas e o processo de expulsão também avançava igualmente sob pagamento de uma indemnização monetária que não era suficiente para garantir a produção agrária.

A população que era retirada das suas terras era indemnizada só os seus bens e imóveis (habitação e outras benfeitorias), não antes de se fazer o inventário dos mesmos. O que trouxe fúria as populações não apenas pela suposta indemnização que era insignificante, mas também porque entre a terra e a sua família existia uma relação que não era simplesmente económica, mas também, social, cultural, politica e religiosa.

A implementação do colonato pelo governo era uma necessidade e as pessoas independentemente da sua vontade tinham que aderir procurando outras zonas para o exercício das suas actividades ou aceitando a assimilação visto que, a legislação só admitia ser pertencer ao colonato o individuo que fosse assimilado e não podia ter mais que uma mulher o que entrava em contraste com a cultura moçambicana a sul do país, que tradicionalmente os homens são polígamos.

No entanto, nem todos os camponeses cujas terras foram abrangidas pelo projecto, aceitaram entrar para o Colonato, pós muito deles achavam que o projecto tirou as suas terras, assim a população fugia para outras regiões e para África do sul por pensar que haveria xibalo novamente e, também não aceitaram que o branco distribuísse terra porque ele não era nativo. A maior parte dos camponeses preferiram fugir para outras regiões para dar continuidade à actividade que vinha desenvolvendo, que eram agricultura e criação de gado.

O fim do colonato

Em 25 de Junho de 1964, teve iniciou a guerra de libertação nacional de Moçambique sob comando da FRELIMO que teve um impacto directo na gestão do colonato pela Brigada. No qual as derrotas da FRELIMO foram comemoradas abertamente pelos brancos e o avanço da guerra clandestinamente aplaudido pelos negros.

Não obstante, os colonos brancos achavam que a guerra não colocava em causa a sua presença e legitimidade o que veio se alterar inesperadamente a partir de 1974 por causa das mudanças políticas em Portugal (revolução de 25 de Abril). O ano de 1974 foi considerado como de amargura e ressentimento pelos colonos brancos porque foram obrigados a abandonar o colonato, já que as populações não desejavam a sua permaneça na região.

Por outro lado, com o prenúncio da descolonização os colonos ansiavam por protecção física e material, perante manifestações do racismo bem como de um regime de inspirações marxistas leninista que emergia na colónia, dando inicio do êxodo de centenas de milhares de colonos brancos para Portugal, África do sul, Brasil e América do Norte.

Por outro lado, esteve na origem do abandono do colonato do Limpopo um outro factor fundamental (antes do golpe Estado) que se circunscreve nos deveres e obrigações que eram muito pesados na comparação com os seus direitos.

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