Por: Tacarindua Augusto Merisse



Perfil intelectual dos filósofos moçambicanos


Depois de manter um contacto directo (na sala de aulas, gabinetes de trabalho, café) e indirecto (através das obras literárias, artigos científicos, debates televisivos, colóquios) pretendo descrever o perfil intelectual, que também podemos chamar de linha de pensamento dos filósofos moçambicanos.

De referir que para além destes, existem outros que não é do meu domínio ou do domínio público. O critério usado para a selecção é de ser um autor de uma ou mais obras conhecidas na praça. Muito provavelmente, nos próximos posts estarão novos filósofos moçambicanos segundo um novo critério. Neste artigo apresento cinco filósofos moçambicanos, a saber:

1. Severino Ngoenha


Severino Ngoenha é um filósofo moçambicano, reconhecido em Moçambique e não só, de domínio público e o representante de todos outros filósofos moçambicanos. Em termos de perfil intelectual, Ngoenha é um filósofo reacionista, na medida em que o que ele escreve parece ser uma reacção alérgica das perspectivas económica, política, social e até educacional baseados no modelo europeu, mostrando que estes modelos quando são aplicados em África, são ineficazes.

Por exemplo, na sua obra "os tempos da filosofia" Ngoenha afirmou que a democracia ocidental é inadequada ao estilo de vida dos moçambicanos e africanos no geral. Ainda na mesma obra, mostrou que as organizações internacionais (FMI, banco Mundial) tornam Moçambique mais vulnerável. Seria melhor elaborar modelos educacional e financeiro que não se baseiam nas políticas europeias.

2. José Castiano

É provavelmente o segundo filósofo moçambicano mais mencionado na praça. Amigo de Ngoenha e já escreveram obras em comum. Em termos de perfil intelectual, Castiano é um filósofo regionalista que também pode chamar-se de filósofo localista. É localista porque em muitas ocasiões, defendeu a ideia de que o saber local, desempenha um papel fundamental na afirmação dos saberes periféricos no mercado global.

Toda ciência universal, algum dia foi local. A filosofia universal, algum dia foi grega ou egípcia. O filosofar dos africanos, consiste na consulta dos régulos locais, sobre os grandes problemas de interesse local, com vista a sistematizar estas informações para o consumo nacional e internacional.

3. Ergimino Mucale

Provavelmente o mais novo dos filósofos moçambicanos conhecidos na praça. Autor da afrocentricidade. Em termos de perfil intelectual, Mucale é sem dúvidas, um filósofo afrocêntrico. O afrocentrismo é mais ou menos uma ideologia que defende a ideia de que o pensamento político, econômico, social, cultural, etc., deve ter a África, como ponto de partida.

A ideia básica é de que quando você quer saber sobre África e ler obras europeias, há maior probabilidade de encontrar uma informação adulterada, porque a Europa não está e nunca esteve a serviço da África. A Europa tem uma visão pejorativa sobre a África. Exemplo disso é o caso de Hegel e Kant, filósofos que chegaram a afirmar que na África não existiam seres efectivamente racionais, sendo desta forma impedidos de contribuir para a construção da história universal.

4. José Blaunde

Provavelmente o menos conhecido da praça. Em termos de perfil intelectual, Blaunde é um filósofo naturalista. Ele encontra na natureza, elementos para explicar os fenómenos naturais e humanos. Considera a natureza superior ao homem.

O homem é, segundo a vontade da natureza. O homem não tem capacidade de dominar a natureza porque ele mesmo é um elemento da natureza. Quando o homem vandaliza a natureza, esta responde com violência e o homem arrepende-se.

5. Alberto Ferreira


Provavelmente o único filósofo moçambicano politicamente activo. É deputado da RENAMO. Em termos de perfil intelectual, Ferreira é um democrata. Rejeita a concentração de poderes nas mãos do presidente ou de qualquer outro órgão de soberania. Nega a existência de uma filosofia africana, outra filosofia europeia e assim por diante. O que existe para ele é a filosofia, é a ciência.

O conhecimento não pode ser tomado particularmente, mas universalmente. Todas as conquistas da ciência, são conquistas da humanidade. É mais identificado como político do que filósofo provavelmente por estar na política activa. Totalitarismo, absolutismo e monarquias são regimes políticos que não defende. É filosoficamente influenciado pelos filósofos modernos tais como John Locke, Charles de Montesquieu e Robert Dahl.