DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO

 

  1. Conceito e Objecto do Direito Internacional Público

De acordo com Amaral, o DIP “é o conjunto de princípios e regras destinados a reger os direitos e deveres internacionais, tanto dos Estados ou outros organismos análogos, quanto dos indivíduos” (Amaral, 2010, p. 15). Essa definição ressalta a natureza abrangente do DIP, que não se limita apenas aos Estados, mas também incorpora os actores não estatais em seu escopo regulatório. Por outro lado, Nguyen (2003, p. 39) destaca a distinção entre DIP e Direito Internacional Privado, enfatizando que o primeiro regula as relações entre Estados, enquanto o segundo trata das relações entre particulares e pessoas morais privadas.

Varella (2019, p. 22) argumenta que, com o processo de globalização económica, esses dois ramos do direito estão se a transformar e a se fundir progressivamente. Enquanto o DIP tende a se privatizar, permitindo a participação de actores não estatais e incorporando normas comuns e uniformes aplicadas globalmente, o Direito Internacional Privado está a se politizar, à medida que questões relacionadas aos direitos humanos, meio ambiente e comércio internacional ganham destaque na arena internacional.

No que diz respeito ao objecto do DIP, conforme explicado por Amaral (2010, p. 15), não se restringe mais apenas às relações diplomáticas, comerciais e ao direito de guerra, como era tradicionalmente entendido. Actualmente, o DIP desempenha uma função muito mais ampla na organização da sociedade internacional. A Corte Internacional de Justiça (CIJ), órgão jurídico e consultivo das Nações Unidas, enfatiza que o DIP deve cumprir objectivos principais: a redução da anarquia nas relações internacionais e a satisfação de interesses comuns entre os Estados.

 

  1. Características do Direito Internacional Público

O DIP possui características próprias que o distinguem de outros ramos do direito, conforme descrito por Varella (2019, p. 26). É importante compreender essas características para uma análise e compreensão desse campo do direito. A seguir, exploramos as características do DIP.

O DIP é um conjunto normativo, ou seja, é composto por regras e princípios que regulam as relações entre os Estados e outros actores internacionais. Essas normas podem ser obrigatórias ou não, dependendo de sua aplicação e aceitação pelos Estados. Assim como no direito interno, o DIP também possui normas vinculativas que impõem obrigações aos sujeitos de direito (Baptista, 1998, p. 29).

Contrariamente à ideia de que o DIP é um “direito sem dentes”, ou seja, carente de capacidade de aplicar sanções efetivas, Varella argumenta que o DIP possui sim um “poder de sanção, em caso de violação. A construção de regras internacionais mais rígidas está presente em diversos temas: direito internacional económico e humanitário são exemplos constantes” (Varella, 2019, p. 27). Com o aumento da internacionalização económica, política e cultural, o DIP tem adquirido maior capacidade de impor sanções em caso de violações, conforme referido por Varella na citação anterior.

 

  1. Sujeitos do Direito Internacional Público

O DIP reconhece uma variedade de entidades como sujeitos legítimos de suas normas e princípios. Esses sujeitos desempenham papéis distintos e têm diferentes responsabilidades no cenário internacional. A seguir, apresentamos os sujeitos do DIP segundo a caracterização de Mazzuoli (2011).

 

  1. Os Estados

Em primeiro lugar, temos os Estados, que são considerados os sujeitos clássicos e fundamentais do DIP.

São os Estados os sujeitos cldssicos (Originários ou tradicionais) do Direito Internacional Público, além dos mais importantes dentro do contexto das relações internacionais. São eles as pessóas jurídicas de Direito Internacional por excelência, encontrando-se, aInda hoje, em uma posição absolutamente dominante nas escalas de valor e importância daqueles que actuam no Direito Internacional Público (Mazzuoli, 2011, p. 403).

Cada Estado possui sua própria personalidade jurídica, reconhecida pelos demais membros da comunidade internacional. Os Estados têm o direito de celebrar tratados, estabelecer relações diplomáticas e participar de organizações internacionais. Além disso, têm obrigações perante o Direito Internacional, e seu descumprimento pode resultar em responsabilização internacional.

 

  1. Colectividades Interestatais

Em segundo lugar, encontramos as Colectividades Interestatais, mais comumente conhecidas como Organizações Internacionais. Essas entidades são formadas por Estados por meio de tratados internacionais para alcançar objectivos específicos, como a cooperação económica, a paz mundial ou a proteção ambiental (Nguyen, 2003). As organizações internacionais têm personalidade jurídica própria, mas suas competências são limitadas aos termos estabelecidos em seus estatutos ou tratados constitutivos. Alguns exemplos incluem as Nações Unidas, a Organização Mundial do Comércio e a União Europeia.

 

  1. Colectividades Não Estatais

Além dos Estados e das Organizações Internacionais, segundo Mazzuoli (2011, p. 405), o DIP reconhece Coletividades Não Estatais como sujeitos relevantes. Isso inclui diversos grupos e movimentos que buscam alcançar objectivos políticos, sociais ou humanitários no cenário internacional.

  • Os Beligerantes: são grupos armados que se rebelam contra o governo de um Estado, muitas vezes em busca de mudanças políticas ou separatismo. Eles podem ser reconhecidos como beligerantes por outros Estados, adquirindo certos direitos e deveres internacionais, como o direito ao bloqueio e à captura (Mazzuoli, 2011, p. 405).
  • Os Insurgentes: buscam modificar o sistema político vigente, mas sem atingir o status de beligerância. Seus direitos e deveres dependem do reconhecimento por parte de outros Estados (Mazzuoli, 2011, p. 406).
  • Os Movimentos de Libertação Nacional: surgiram durante os processos de descolonização e lutam pela independência de seus povos ou contra regimes opressores. Seu reconhecimento como sujeitos do Direito Internacional é limitado e depende do contexto (Mazzuoli, 2011, p. 406).
  • Soberana Ordem Militar de Malta: uma instituição com origens históricas e religiosas que busca conservar prerrogativas de um ente independente e soberano. Seu reconhecimento como sujeito de Direito Internacional é controverso na doutrina, e suas relações diplomáticas com outros Estados são baseadas mais em cortesia do que em reconhecimento formal (Mazzuoli, 2011, p. 407).

Conclusão

O DIP é um campo dinâmico e crucial que regula as relações entre os Estados e outros sujeitos internacionais em um mundo cada vez mais interconectado. Ao longo deste trabalho, exploramos os conceitos, características e sujeitos do Direito Internacional Público, bem como seu papel na ordem jurídica global contemporânea.

Ficou posto que o DIP abrange uma ampla gama de temas, desde questões tradicionais como guerra e diplomacia até desafios modernos como comércio internacional, direitos humanos e protecção ambiental. Sua evolução reflecte a crescente complexidade das relações internacionais e a necessidade de uma ordem jurídica global robusta para lidar com os desafios do século XXI.

Ao discutir as características distintivas do DIP, percebemos sua natureza normativa e obrigatória, bem como seu crescente poder de sanção em casos de violação. De igual modo, destacamos a importância dos sujeitos do DIP, incluindo Estados, organizações internacionais e colectividades não estatais, e examinamos o papel central do Estado como sujeito soberano e autónomo.

No entanto, o DIP enfrenta desafios significativos, como a eficácia das normas internacionais, a coerção legal em nível global e a tensão entre soberania estatal e responsabilidade internacional. Portanto, é essencial continuar a aprimorar e fortalecer o DIP por meio da cooperação internacional, do respeito ao Estado de Direito e da promoção dos direitos humanos e da justiça global.

 

 

 

Referências Bibliográficas

Amaral, R. C. (2010). Direito internacional público e privado. 6ª ed., Porto Alegre: Verbo Jurídico.

Baptista, E. C. (1998). Direito internacional público: Conceitos e Fontes. Volume I. Lisboa: Lex.

Baptista, E. C. (2004). Direito internacional público: Sujeitos e Responsabilidades. Volume II. Coimbra: Almedina.

Mazzuoli, V. O. (2011). Curso de direito internacional público. 4ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais.

Varella, M. (2019). Direito internacional público. 8ª ed., São Paulo: Saraiva.

Nguyen, Q. D. (2003). Direito internacional público. 2ª ed., Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.