Por Catarina Muchanga

1. A diversidade de concepções e de perspectivas da relação natureza-sociedade


A problemática das sociedades hodiernas incide na instabilidade da noção desenvolvida pelo homem na sua relação com a natureza. Tendo projectado uma visão simplista, perpectuando a ideia de que estas são separadas uma da outra, considerando o homem um ser superior a natureza. Neste contexto, propõe-se no presente titulo apresentar as diversas discussões históricas da relação entre natureza e sociedade.

 

1.1. Concepção da natureza na era primitiva


Desenvolve-se nesta época a noção do homem enquanto um ser totalmente dependente da natureza, na medida em que este via a natureza como uma espécie de espelho das suas necessidades. Quando se olha sob a perspectiva do relacionamento dos seres humanos é possível de facto perceber um vínculo de reverência, sacralidade e até temor, aqui as leis na natureza funcionavam em plena harmonia com o ritmo da vida. Nota-se uma visão meramente contemplativa do homem em relação a natureza, nas palavras de Capra,

a natureza era vista como mãe nutriente”(CAPRA, 1982: 47).

 

 

1.2. Concepção da natureza na idade média


Nesta época, desenvolveu-se uma visão do homem enquanto um ser superior á natureza, esta visão deve-se até certo ponto a concepção que se tinha do homem na idade média, assim, nas palavras de Albuquerque (2007: 42), o homem seria autorizado por Deus a explorar a natureza, isto é, o homem submete a natureza á sua vontade, pois Deus teria criado a natureza para tornar possível a existência do homem e, assim, aquela estaria subordinada a este.

Esta concepção abriu espaço para a ideia de que o homem podia se aproveitar da natureza para satisfazer seus interesses, inclusive económicos. Aliás, foi a partir dessa abordagem que a modernidade lançou a sua concepção, levando-a às suas últimas consequências.

 

1.3. Concepção da natureza na idade moderna


Tradicionalmente considerado, a modernidade data entre 1453-1789, marcado por muitas mudanças filosóficas, sociais, etc. No entendimento de Albuquerque (idem, p. 46), foi nesse período que ocorreram modificações profundas no modo de homem conceber e relacionar-se com a natureza. Como anteriormente referido, esta visão deve-se a noção do homem nesta época.

A concepção da realidade como intrinsecamente racional e possível de ser plenamente captada pelas ideias e conceitos, lançou as bases para um entendimento completamente inovador da natureza que deu origem à ciência clássica, onde prevalece o ponto de vista mecânico.

A natureza por ser racional seria um sistema ordenado de causas e feitos necessários cuja estrutura profunda e invisível seria matemática. Assim, a realidade seria um sistema de causalidades racionais rigorosas de serem conhecidas e transformadas pelo homem. (ALBUQUERQUE, 2007: 47).

Essa nova concepção fez com que o homem moderno passasse a enxergá-la não mais como uma natureza orgânica voltada para a salvação e manutenção da vida do homem e sim como uma máquina possível de ser controlada, utilizada e explorada através do conhecimento científico e suas tecnologias. Nota-se aqui um total equilíbrio, pois, tomado a natureza como objecto, o homem a torna vítima até as últimas consequências, transformando-a e menosprezando-a tragicamente.

O fortalecimento desta concepção encontra seus alicerces na filosofia de Descartes que olha o homem como senhor e dominador da natureza.A partir das perspectivas mencionadas acima, nota-se o desenvolvimento de noções que tomam a relação homem (sociedade) e natureza como elementos separados um do outro, porém, é relativamente neste aspecto que se levanta a complexidade de Edgar Morin, que aliás, será objecto de análise no título a seguir.

 

2. Concepção da relação natureza e sociedade à luz da complexidade de base


Partindo das concepções desenvolvidas na ciência clássica, sobretudo nos primórdios do século, XVI, onde preconizava-se tecnicismo na relação do homem com a natureza, uma visão engendrada pela modernidade, que olhava para o homem como dominador da natureza. Essa visão fundou perspectivas reducionistas, simplistas e imperialistas e definiram a relação sociedade e natureza como relação de dependência.

Portanto, a nova teoria da complexidade contrapõe-na, lançando as bases de um novo modo de compreender a realidade, buscando substituir o mecanicismo pela interconexão, visto que os fenómenos da cultura e da natureza estão intimamente integrados e devem ser considerados em suas íntimas relações. Nas palavras de Morin

devemos repudiar a ideia de simplificação em proveito duma ideia matriz da complexidade” (MORIN, 1997: 139).


Para compreender a ideia da complexidade, devemos antes de mais olhar para o conceito de sistema, que conforme entende Morin (idem, p. 142), sistema é a inter-relação de elementos diversos, constituindo uma entidade ou unidade global. Neste contexto, o sistema seria o conceito piloto e guia de leitura para todos os fenómenos organizacionais físicos, biológicos, antropológicos, etc., resultantes das interacções entre um observador e o universo fenoménico que permite representar e conceber unidades complexas, constituídas por inter-relações organizacionais entre elementos, acções ou outras unidades complexas.

Nestes termos, afirma o autor que a noção de sistema não é simples nem absoluta, comporta na sua unidade, relatividade, dualidade, antagonismo etc. deste modo, o problema da sua inteligibilidade abre uma problemática da complexidade.

No entendimento de Morin (ibidem), o sistema é o conceito complexo de base, concernindo a organização, porque não é redutível a unidades elementares, conceitos simples; isto é, torna-se conceito de base porque pode dissolver-se em sistemas de sistemas de sistemas, onde, segundo o autor, aparecerão as máquinas naturais e os seres vivos, e estas máquinas, estes seres vivos, são também sistemas.

Portanto, o sistema será a raiz da complexidade.Partindo desse entendimento, no fundamento na natureza há uma complexidade desconhecida, pois já não existe nenhuma base empírica simples, pois, como afirma o autor o simples não passa dum momento arbitrário de abstracção.

Dum meio de manipulação arrancado às complexidades. Não se pode a partir disso entender a relação sociedade e natureza como elementos simples e separados, elas devem ser norteadas pelos princípios da concepção inclusiva.

Como entende Mascovici (apud Vargas, 2003: 42), a relação natureza-sociedade não se excluem mutuamente, a primeira existe em toda parte, não surgiu com o homem e a segunda nos abrange como resultado de nossa interacção, o homem situa-se na confluência da estrutura e do movimento de ambas; assim entre a natureza e sociedade existe uma relação de ser e de pertença.

A dimensão natural e social deve ser sempre analisada integralmente. Além demais, como destaca Morin(1977: 344), a physisé insimplificávele a sua complexidade desafia totalmente o nosso entendimento. Assim, na sua divisão na natureza em natureza da natureza e natureza como característica, afirma que a primeira é naturalmente misteriosa e incognoscível, ainda por se desmistificar e a segunda é crida pelo homem e então racional e artificial.

 

CONCLUSÃO


A relação sociedade e natureza foi concebida por vários autores em perspectivas diferentes, tendo sido concebida numa primeira instância como de total dependência do homem em relação a natureza, porém, de outro lado, este seria o dono e total possuidor da natureza, dito de outro modo, o homem seria o senhor da natureza, com possibilidade de dominar e até transformá-la ao seu critério.

Esta noção teria sido grande influência da visão macanicista que adveio com a modernidade advogada por Galileu e Newton, que conferiam a legitimidade e validez aos saberes que separavam o homem da natureza, ideia esta sustentada sobretudo pelo pensamento cartesiano.

Nesta perspectiva, contra a visão Cartesiana emerge um novo modelo de pensamento que se propõe o propósito de pensar a relação sociedade e natureza em óptica diferente, este, pretende interligar o que está separado, neste contexto, entre a sociedade e natureza deve-se projectar uma visão que tome como ponto de partida a complexidade de base, de modo que não se considere esses elementos na sua simplicidade mas como uma unidade complexa.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


ALBUQUERQUE, B. P. (2007). As relações entre o homem e a natureza e a crise sócio-ambiental. Rio de Janeiro, [s.n.].

CAPRA, Fritjof. (1982). Trad. Álvaro Cabral. O ponto de mutação: a ciência, a sociedade e a cultura emergente.São Paulo, Bantam.

MORIN, Edgar. (1977). Trad. Maria Gabriela de Bragança. O método 1: a natureza da natureza. 2. ed., França, Seuil.

VARGAS, F. A. (2003?). A relação natureza-sociedade. [s.l.], [s.n.].