O conceito de "ironia" em sentido romântico em Schlegel

F. Schlegel(1772-1829) partiu do classicismo de Winckelmann e das teorias de Schiller, mas evoluiu e deu consistência autónoma ao seu pensamento, sobretudo a partir da leitura da "Doutrina da ciência" de Fichte, e com Schelling.

A concepção do infinito é ideia central do seu pensamento, bem como de todo o pensamento romântico. Ora, podemos chegar ao infinito pela filosofia ou pela arte. Mas, tanto numa como na outra, nos valemos de meios finitos. E aqui reside precisamente a verdadeira dificuldade: encontrar o acesso ao infinito com os meios finitos. Schlegel tentou se mover em ambas as direcções, mas, em filosofia, criou apenas um conceito verdadeiramente original, o de "ironia"; o resto permaneceu fragmentário e apenas esboçado.

Sua teoria da arte constitui o melhor que ele deu a sua época. Retomado de Sócrates, seu conceito de "ironia" é profundamente ampliado e modificado.

Em Sócrates a "ironia" era a simulação do jogo do adversário, com o objetivo de refutar o próprio adversário mediante suas próprias armas. Já em Schlegel a ironia supõe outros horizontes teóricos: pressupõe a concepção do infinito como o objetivo ao qual se deve chegar e a inadequação de todo pensamento que vise ao infinito, enquanto é sempre pensamento determinado.

Ora, a ironia se insere nesse contexto como a atitude espiritual que tende a superar e dissolver esse "determinado" e, portanto, tende a impelir sempre para mais além.

A ironia, portanto, tende a suscitar um sentimento de contradição não eliminável entre condicionado (finito) e incondicionado (infinito) e, ao mesmo tempo, o desejo de eliminá-la e, por isso, o sentimento da "impossibilidade e necessidade da perfeita mediação" ao mesmo tempo.

Desse modo, a "ironia" posiciona-se sempre acima de todo o nosso conhecimento, de toda a nossa acção ou obra. Em conclusão, a nova "ironia" posiciona-se como o sentido de inadequação em relação a infinitude de todo fato ou ato do espírito humano, exercendo nela papel decisivo o elemento do "espirituoso" ou "brincalhão", ou seja, do humor. Esse conceito de "ironia" é quase o pendante, de tonalidade aparentemente classicizante, mas na realidade profundamente romântico, do sentimento sério da Sehnsucht (ansiedade), que descrevemos.

O filósofo Nicolai Hartmann nos deu disso caracterização muito eficaz: "Schlegel estava profundamente convicto da inexprimibilidade e da incompreensibilidade mística de tudo o que últimomo e autêntico objecto do pensamento.

Assim, o 'espirituoso' (no sentido de humor) com que, no fim, o pensamento ironiza a si mesmo e se suprime é precisamente a admissão profundamente justa e grandiosa de sua própria impotência. Com isso, mediatamente, é a reabilitação do irracional limitado e expulso pelo pensamento.

Trata-se de 'pressagioso girar em torno do inabordável', de salto do pensamento no vazio, que certamente nunca levaria terreno sólido, mas que carrega consigo a consciência imediata desse terreno solido, isto é, aquele que só è real enquanto o pensamento abandona conscientemente a si mesmo. A forma desse 'abandono de si' é a ironia, o espirituoso (o humor), o riso sobre si mesmo".

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Giovanni Reali e Dário Antiseri - Do Romantismo até aos nossos dias