Entre 1880 e 1900, a África tropical apresentava uma situação paradoxal,
em que o processo de conquista e ocupação era ao mesmo tempo
irreversível e altamente resistível.


Irreversível por causa da Revolução industrial que permitiu aos europeus
uma vantagem decisiva em armas e facilidades nas comunicações no
interior da África e entre África e Europa graças as ferrovias, a telegrafia
e o navio a vapor.


Resistível por causa da força dos africanos e ao facto de os europeus não
terem aplicado na batalha recursos humanos e tecnológicos abundantes. 

A implementação da estratégia de penetração foi muito desordenada e
inábil, pelo que os europeus enfrentaram inúmeros movimentos de
resistência que eles próprios provocaram ou inventaram por ignorância e
medo. Face a esta realidade os europeus tinham de “obter a vitória final”,
mas depois era importante, procurar pôr em ordem o conturbado
processo.


Para tentar justificar a partilha os europeus começaram a escrever livros
sobre aquilo a que chamaram “pacificação”.


A literatura colonial sustentou durante longo tempo a ideia de que a
África era uma espécie de vazio político, onde dominavam a anarquia, a
selvajaria, a escravidão, a ignorância e a miséria. Os europeus eram assim
tidos como cavaleiros da civilização e do progresso. Também
procuravam dar a entender a ideia de ausência total do sentimento
nacional entre os africanos, que teriam, salvo algumas excepções aceite
passivamente a ocupação europeia.


Mas é irrefutável que a vitória dos europeus não foi reflexo da
insignificância da resistência africana.


Desde o início da penetração europeia o nacionalismo africano
manifestou-se de várias formas, umas desajeitadas, outras ambíguas, até à
reconquista da independência.

“Por toda a parte defenderam os africanos o seu solo e com frequência
palmo a palmo.(…) É por milhares que temos de contar aqueles que se
mataram pelas próprias mãos, de preferência a sobreviverem a
perderem a liberdade (… ) ” In Ki Zerbo, História da África Negra, vol II (pp. 96)
Os estudos sobre a resistência africana das décadas 1880 a 1900, em geral
apoiam-se ou servem para demonstrar três ideias-chave sobre a
resistência africana:


  • A resistência africana foi importante na medida em que provou que os africanos nunca se resignaram diante da invasão;
  • Longe de ser desesperada e ilógica, foi, muitas vezes, movida por ideologias racionais e inovadoras; 
  • Os movimentos de resistência não eram insignificantes, pois tiveram
    consequências importantes em seu tempo e são ainda hoje. 

Generalização da Resistência


Uma das ideias sobre a resistência africana é sustentada pelos
historiadores euro centristas e sustentava que os povos africanos viam a
chegada dos europeus como um feliz acaso que os permitiria libertar-se
das guerras internas e tribais, das epidemias, fomes e outros males que
assolavam o continente.


Segundo os teóricos desta corrente havia, entre os africanos, aqueles que
eram pacíficos e, portanto, não ofereceram resistência e outros, uma
minoria "sedenta de sangue", que protagonizaram reacções primitivas e irracionais. Portanto, para esta corrente historiográfica, os africanos
nunca protagonizaram uma acção de resistência como um "fenómeno
organizado".


É despropositado tentar, no contexto da resistência africana, distinguir as
sociedades africanas em belicosas e pacíficas, pois quase todos os estados
africanos se esforçaram por alcançar uma plataforma de colaboração com
os europeus, mas também todos eles tinham valores e interesses a
defender, mesmo com recurso às armas, se fosse necessário.


A atitude inicial dos africanos face à chegada dos europeus no Século
XIX foi muito variada, mas em geral prevaleceu a surpresa receosa ou
divertida e sobretudo a hospitalidade. Raramente foi de hostilidade. Só
quando a escravatura atingiu as pequenas tribos.


Ignorando a existência de Homens brancos (europeus), algumas
comunidades africanas viam os brancos como Homens negros e que se
tornaram brancos por serem leprosos ou como castigo de Deus por serem
infiéis. Outras julgavam que os brancos tinham poderes sobrenaturais,
enquanto outros povos, ainda, achavam que os brancos eram selvagens e
olhavam-nos com espanto e acompanhavam cada movimento seu. Os reis
não aceitavam avistar-se com eles.


Porém os primeiros viajantes (Livingstone, Caillé, Binger, Mungo Park,
etc.) são unânimes quanto à hospitalidade dos africanos. Aliás é essa
atitude que explica o sucesso de várias expedições de exploradores
europeus que por África passaram nos primeiros ¾ do século XIX.


Contudo no fim do século XIX os africanos aperceberam-se da existência
de uma nova vaga de estrangeiros cujos objectivos eram diferentes dos
primeiros. Foi nessa altura que a resistência africana começou a se
manifestar, movida pela consciência de um perigo de morte das
colectividades africanas.


Primeiro foram os chefes e as classes privilegiadas que reagiram perante
a ameaça da sua liberdade e autonomia devido a chegada dos europeus.
Depois, com a implantação do sistema colonial, a resistência generalizouse tomando diferentes formas, desde a fuga até a sublevação armada.


Como você vê, todas as sociedades africanas, desde as comunidades
nómadas até as várias sociedades centralizadas resistiram à ocupação
europeia. Como é óbvio, o nível de organização em cada uma das
sociedades reflectiu-se na intensidade que a resistência atingiu em cada
sociedade.


Um ponto assente, porém é que os africanos não assistiram indiferentes,
ou com agrado à ocupação de suas terras e nem tão pouco reagiram com
actos primitivos e irracionais diante da ocupação. Pelo contrário, um
pouco por toda África, independentemente do nível de organização de
cada sociedade, os africanos procuraram, das mais diversas formas de
lutar contra a ocupação de suas terras.