A Europa ocidental sofreu grandes transformações económicas e sociais entre os séculos XI e XV. Pouco a pouco, desmoronou o sistema feudal que vigorou no continente ao longo de quase toda a Idade Média. Para isso, entre outros factores, contribuíram as Cruzadas, que foram expedições militares patrocinadas pela Igreja católica e organizadas pela cristandade medieval para libertar Jerusalém do domínio muçulmano.

As Cruzadas ocorreram entre os anos de 1096 e 1270 e conduziram a Europa a um momento de renascimento comercial: ao voltarem das batalhas em terras orientais, os cruzados traziam consigo produtos de luxo, como tapetes persas, porcelanas chinesas, tecidos finos ou especiarias (temperos como cravo, canela e pimenta), que atraíam a população europeia, que já não conhecia esses requintes.

Por haverem estabelecido feitorias nessas regiões mais afastadas, os europeus abriram um novo eixo comercial ligando o Ocidente ao Oriente. As principais rotas de comércio eram feitas pelo mar Mediterrâneo e estavam sob o controle de cidades como Génova, Veneza, Pisa, Constantinopla, Barcelona e Marselha. No mar Báltico e no mar do Norte, o domínio ficava por conta de cidades como Hamburgo, Bremen e pela região de Flandres (Países Baixos).

O surgimento dos Burgos e burgueses

Graças a essa retomada do comércio, muitos europeus deixaram o campo e foram viver dentro dos burgos.

Essa população, formada principalmente por artesãos, operários e comerciantes, acabou dando origem a novos burgos em vários pontos da Europa. Seus habitantes, por oposição aos nobres que viviam em castelos, ficaram conhecidos como burgueses. Com o tempo, os centros urbanos tomaram-se mais importantes que as regiões rurais. Os negócios ali aumentaram, os artesãos abriram suas próprias oficinas, comerciantes passaram a organizar feiras nas quais vendiam seus produtos.

A supervalorização do dinheiro em relação às terras

Por essa razão, o uso de moedas tornou-se essencial, substituindo o escambo ou troca de mercadorias. Isso possibilitou o aparecimento das primeiras casas bancárias, responsáveis pelas operações de câmbio e empréstimos a juros. Toda essa dinâmica fez com que o dinheiro passasse a ganhar importância e a terra e a produção agro-pecuária deixasse de ser a base da riqueza na Europa.

Gradativamente, os mercadores e banqueiros, cada vez mais ricos, conquistavam maior status social e passaram a ansiar pelo poder político. A burguesia ganhava prestígio e aproximava-se dos reis, emprestando-lhes dinheiro em troca de medidas políticas favoráveis ao comércio. Ao mesmo tempo, os senhores feudais viam-se envolvidos em dívidas, muitas delas decorrentes das altas despesas com as Cruzadas.

O Humanismo

Além de empreendimentos comerciais, o maior contacto entre os burgueses e os monarcas financiou o surgimento de novas universidades. Com a expansão comercial tomou-se necessário encontrar pessoas que entendessem de direito e comércio. A difusão do conhecimento deixou de ser algo exclusivo da Igreja católica – voltado para assuntos teológicos ou religiosos -, e o ensino tomou-se laico, voltado cada vez mais para questões mundanas.

Desse modo, o homem passou a se preocupar mais com as coisas terrenas do que com as espirituais. As aulas voltavam-se para os textos clássicos, principalmente os dos gregos e romanos, e as atenções dos estudiosos dirigiam-se a diversas áreas do saber e das artes. Iniciava-se o Humanismo, movimento cultural que viria a influenciar a Europa por quase três séculos. Até então hegemónico, o pensamento da Igreja passou a ser questionado por religiosos e filósofos leigos.

As guerras, fome e peste

Todo esse crescimento, no entanto, sofreu um forte golpe no século 14, quando a Europa entrou em crise. Mudanças climáticas geraram um grave colapso no abastecimento agrícola. Apesar dos diversos avanços tecnológicos verificados no campo – como a invenção da charrua, da ferradura, a difusão dos moinhos de vento -, as safras não eram suficientes para toda a população europeia – que duplicara entre os anos 1000 e 1300. Milhares de pessoas passaram a conviver com o problema da fome.

Entre 1346 e 1352, para piorar esse quadro, o continente foi assolado pela Peste Negra. A situação ficou ainda mais grave depois que a nobreza da França e Inglaterra deram início à chamada Guerra dos Cem Anos, conflito que se estendeu de 1337 a 1453 provocando grande número de mortos em ambos os países. Outras guerras ocorreram também na Península ibérica, na Itália e na Alemanha.

No final do século XV, o feudalismo encontrava-se desarticulado e enfraquecido. Os senhores feudais perderam poder económico e político. Começava a surgir as bases de um novo sistema, o capitalismo.

A génese do capitalismo

No meio dessa situação de fome, doenças, guerras e mortes, as camadas mais baixas da população sofriam também com a elevada carga de trabalho e com os altos impostos cobrados pelos reis. Todos esses factores provocaram diversas rebeliões populares em vários pontos da Europa. Fugindo da exploração, novas levas de servos abandonaram os feudos e dirigiram-se para as cidades, onde passaram a trabalhar como assalariados.

A ascensão da burguesia, a expansão do comércio, o aparecimento da mão-de-obra assalariada, aliados ao fortalecimento do poder real – e a consequente formação dos Estados nacionais, foram factores que abalaram de vez a estrutura feudal da Europa e provocaram o fim desse sistema no continente. No século XV, os europeus já viviam sob uma nova ordem socioeconómica: o capitalismo comercial.

Essas transformações políticas, sociais, económicas e religiosas marcaram a passagem da Idade Média para a Idade Moderna e produziram reflexos também no campo cultural, em especial das artes plásticas e da arquitectura.

A origem do capitalismo está relacionada com a formação, ainda na sociedade feudal, do trabalho assalariado e das grandes rotas comerciais.

A origem do capitalismo pode ser encontrada no processo de desintegração do chamado feudalismo. A transformação dos camponeses em trabalhadores assalariados, a retirada dos meios de produção desses últimos (ferramentas e instrumentos agrícolas, terras etc.), a formação de uma classe burguesa e o desenvolvimento do comércio estão entre as causas originárias do capitalismo.

Uma das principais características do feudalismo, enquanto regime de exploração, era a apropriação directa, pelo senhor (o aristocrata, o nobre), do produto excedente do trabalho dos camponeses. Estes tinham suas ferramentas e trabalhavam nas terras do senhor ou em pequenos lotes para sua subsistência. A exploração consistia no recebimento pelo senhor de parte da produção realizada pelo camponês, seja em espécie ou em trabalho nas terras do senhor. Esse excedente era consumido pelos senhores ou vendidos, quando não eram consumidos.

As características principais do capitalismo são a propriedade dos meios de produção detida por uma classe social, a burguesia, e a exploração do tempo de trabalho do trabalhador assalariado. Essa exploração é fundada na utilização da capacidade de trabalho, na força de trabalho, durante um determinado período de tempo em troca de um salário. O salário teria um valor menor do que o valor produzido pelo trabalhador durante sua jornada de trabalho.

O excedente

O excedente entre o valor pago em salário e o produzido pelo trabalhador seria a origem do lucro da burguesia, também chamada de mais-valia. Esta seria ainda a base para a acumulação de capital, que seria reinvestido na compra de matérias-primas, instrumentos de trabalho e inovações tecnológicas.

Historicamente, isso ocorreu com a ida para as cidades de um número cada vez maior de camponeses, principalmente na Inglaterra, com as restrições de uso das terras comunais, através das Leis de Cerceamento. Nas cidades e sem disporem de instrumentos para o trabalho, os camponeses passaram a vender sua força de trabalho, transformando-se em assalariados. Alguns dos antigos artesãos (principalmente os mestres das corporações), que contratavam esses assalariados, passaram a acumular capital e a constituírem-se enquanto burguesia, contribuindo, assim, para a génese do capitalismo.

Renascimento Comercial

Outro factor importante da origem do capitalismo foi o chamado Renascimento Comercial. A abertura das rotas de comércio no mar Mediterrâneo e a intensificação das trocas no interior do continente europeu, principalmente com as feiras que eram realizadas em várias localidades, possibilitaram ainda a realização de forma mais intensa das trocas dos excedentes produzidos.

A mercantilização da produção contribuiu para a desintegração da sociedade feudal, interligando aos poucos os centros urbanos e escoando a produção agrícola. Possibilitou ainda o desenvolvimento de práticas financeiras que garantiam a comercialização, além de formar um capital bancário. Este serviria para a abertura de crédito às trocas comerciais e também às manufacturas. As Grandes Navegações, com as longas rotas comerciais e a obtenção de metais preciosos, contribuíram, dessa forma, como um agente externo para desintegrar a sociedade feudal e dar origem ao capitalismo.

 

Bibliografia

FREITAS, Gustavo. Vocabulário de história. Lisboa, 1ª edição, 2004;

MATTOSO, António. Compendia a história universal, livraria de arte Lisboa, 1951;BLOCH, Marc. “A sociedade feudallugar da história”, 1ª edição, Portugal, 2009.