Os portugueses chegaram a Moçambique nos finais do século XV (1498) chefiados por Vasco da Gama, movidos por motivos económicos, sociais, políticos e religiosos. Interessados pelo ouro e marfim de Moçambique, embarcaram pela primeira vez no rio Inharrime (Inhambane – 1948), Sofala (em 1505), Quelimane (em 1544) e Ilha de Moçambique (em 1507) e começaram a fundar feitorias locais, quer de comércio quer de defesa contra os ataques árabes e dos chefes locais rebeldes. Fundaram também Sena e Tete em 1530.

No século XVIII, alguns portugueses e indianos foram enviados para a região do Zambeze. Os comerciantes portugueses tinham que pagar aos chefes africanos um imposto anual conhecido por CURVA, o qual podia ser pago em tecidos ou outros artigos. Desta maneira, todos os anos uma embaixada do Mwenwmutapa ia até Tete receber os impostos sobre o comércio que os portugueses eram obrigados a pagar.

Período/fase do ouro: XV – XVI (1505 – 1693)

Antes da presença portuguesa em Moçambique, a actividade mercantil era exercido pelos “mouros” (árabes-swahili) no Império do Mwenemutapa. O ouro era o principal artigo do comércio, daí que podemos afirmar que foi o ouro que trouxe os portugueses a Moçambique.

O ouro permitia aos portugueses comprar as especiarias asiáticas com os quais entravam no mercado europeu de produtos exóticos. Daí que Moçambique passou a constituir uma espécie de reserva de meios de pagamento das especiarias – razão pela qual os portugueses se fixaram no nosso país, primeiro como mercadores e depois como colonizadores efectivos.

A sua fixação nas zonas costeiras e noutras regiões era não só para controlar as vias de escoamento no interior do Mwenemutapa mas também para controlar o próprio acesso às zonas produtoras do ouro e do marfim. Até 1530-1537, os portugueses e árabes e swahilis lutavam pela hegemonia mercantil.

Acordos de 1607 E 1629

De modo geral, estes tratados garantiam os portugueses a livre circulação de homens e bens isentas de qualquer tributo. O Mwenemutapateve também de ceder terras ricas em ouro, o que se traduziu na quase total alienação das terras e da produção aurífera.

A primeira comunidade portuguesa permanente surgiu em 1541, próximo da capital do Mwenemutapa. Numa primeira fase a coexistência era pacífica, e este período durou até o assassinato do Padre Gonçalo de Silveira, dando inicio ao primeiro conflito entre Portugal e o Mwenemutapa.

De salientar que o controlo e o acesso às zonas produtoras do ouro foi possível com a aliança dos portugueses com a classe reinante local (GATSI RUCERE). Em 1560/61 foi organizada e enviada uma expedição missionária à corte do imperador chefiada pelo Padre Jesuita GONÇALO SILVEIRA com o objectivo de converter a classe dominante à religião católica.

Neste contexto, o Mwenemutapa reinante (Lucere) assinou o primeiro acorde em 1607 com os portugueses e é baptizado com o nome de SEBASTIÃO.

► Com o acordo, o Mwenemutapa comprometeu-se a ceder todas as suas minas de ouro, de cobre, de ferro, de estanho e de chumbo aos portugueses.

Com esta acção os portugueses pretendiam:

► Influenciar as decisões políticas do imperador em seu benefício;

► Promover manobras no sentido de se alargar o período em que os camponeses dedicavam à produção do ouro em detrimento da produção de valores de uso (agricultura);

► Marginalizar os mercadores asiáticos. A expedição não teve êxitos e o padre acusado de feitiçaria foi morto em 1561.

Em 1572 em resposta do sucedido em 1561, os portugueses enviaram uma expedição militar chefiado por Francisco Barreto e outros ao império, para conquistar as zonas produtoras, punir e submeter o imperador. Mas graças à coesão no seio da classe dominante, à combatividade dos guerreiros e doenças tropicais, os portugueses foram derrotados.

A primeira década do século XVI marcou o início de uma era no Estado dos Mwenemutapa, pois a classe reinante envolveu-se em profundas contradições com Mathuzianye. Gatsi Lucere sentindo-se impotente de debelar a revolta Mathuzianye pediu ajuda militar aos portugueses, em 1607.

Assim, em 1607 a rebelião foi vencida e Gatsi Lucere, o mwenwmutapa, cedeu as minas do seu Estado aos portugueses, no entanto não divulgou todas as minas, para tal acesso o chefe das feiras portuguesas (capitão) tinha que pagar um tributo ao Mwenemutapa, chamado CURVA.

Com a morte de Lucere, sobe ao trono seu filho Caprazine/Kaparasidze (1627), após este ter derrotado seu tio MAVURA. Caprazine representava uma facção oposta aos portugueses, expulsando-os do império, recuperando desse modo todas as terras e minas que estavam sob poder dos portugueses.

EM 1629 CAPRASINE foi deposto do poder pelo seu tio Mavura que pediu apoio aos portugueses. Os portugueses baptizaram Mavura por D. Filipe II e este declarou-se vassalo de Portugal. No mesmo ano, Mavura faz amplas concessões militares, políticas e comerciais aos portugueses, e pelo tratado a aristocracia dos Mwenemutapa foi obrigada a:

  • Não exigir aos funcionários e mercadores portugueses a observância das regras protocolares (descalçar, tirar o chapéu, etc.) quando recebidos pelos altos dignitários da corte;
  • Não obrigar os portugueses a pagarem impostos inerentes à sua actividade (Curva)
  • Aceitar uma força militar de 50 soldados na corte; Expulsar os mercadores asiáticos do seu império;
  • Facilitar o estabelecimento da igreja, ou seja, a autorização dos missionários dominicanos pregarem a sua religião; Permitir a criação de Prazos;
  • Livre circulação dos portugueses e seus bens; Abertura de minas sem mandar tapá-las;
  • O Mwenemutapa passa a consultar o capitão de Massaca antes de tomar qualquer decisão;
  • Tinha que visitar ou mandar visitar o governador da Ilha de Moçambique de 3 em 3 anos pagando lhe um tributo em ouro.

As repercussões deste acordo foram graves: o comércio com os árabes terminou; aumentou o número de comerciantes e de aventureiros portugueses nas terras do Imperio Mutapa; a exploração dos recursos naturais do território aumentou bastante; a população campesina que antes dedicava-se no trabalho agrícola, agora agora é desviada para o trabalho mineiro; abriu a porta para a formação de novas unidades políticas, fundadas por mercadores portugueses estabelecidos como proprietários de terras, OS PRAZOS.

Este conjunto de concessões atentava contra o direito consuetudinário shona que defendia de que a terra não podia ser alienada, era uma falta de respeito com os espíritos dos antepassados.

Assim, em 1693, o Mwenemutapa Afonso Nhacunimbiti insatisfeito com o procedimento dos portugueses, convidou o chefe ButuaCHANGAMIRE DOMBO para dirigir um levante armado contra a presença portuguesa. Esta revolta significou o inicio do desmoronamento do Estado dos Mwenemutapa porque as regiões que não eram controladas directamente pelo imperador aproveitaram-se clima para conquistar a sua autonomia; significou também na periodização da História de Moçambique o fim da fase do ouro e início da fase do marfim.

Consequências do levante de Changamire Dombo

As consequências imediatas do levante compreenderam a destruição de prazos, igrejas e estabelecimentos portugueses localizados ao Sul do rio Zambeze. A revolta significou igualmente o início do desmembramento e declínio do império, porque as regiões que não eram directamente controladas pelo imperador aproveitaram o clima de instabilidade para contestar a sua autonomia.

O ano de 1693, entra na periodização da Historia de Moçambique como marco que assinala o fim do ciclo do ouro e o início do ciclo do marfim porque na margem esquerda do rio Zambeze, onde os portugueses foram procurar refúgio, não abundava o ouro mas sim o elefante.

Decadência do Império de Muenemutapa

A decadência do Estado de Muenemutapa iniciou por volta de 1480, após a morte de Matope devido a vários factores dos quais se destacam:

  • A luta pelo controle do comércio;
  • A fixação de mercadores portugueses na costa moçambicana a partir de 1505, com a ocupação de Sofala, introduzindo profundas transformações na estrutura sócio-política e económica da sociedade Shona, contribuindo para a decadência do estado Muenemutapa;
  • As lutas pela independência dos Mambos sobre influencia dos árabes favoráveis a tais independências uma vez que eles obteriam vantagens no comercio do ouro com o território do império;
  • Traições de certos Muenemutapas, especificamente o acordo de Mavura com os Portugueses;
  • A invasão dos povos Nguni provenientes da Zululândia, liderados porZuangendaba e Mzilikazi;
  • Intervenção dos Portugueses nos assuntos internos do Estado e a intensa cristianização prosseguida pelos missionários;
  • Desenvolvimento dos Prazos do Vale do Zambeze.

Consequências do Ciclo do Ouro

A presença estrangeira em Moçambique, e particularmente a portuguesa, trouxe graves consequências para as populações moçambicanas, a saber:

.● Contribuiu para a erosão da economia natural das mushas – milhares e camponeses passaram a dedicar mais tempo à mineração do ouro, abandonando as principais actividades produtivas;

  • Contribuiu para a existência de lutas clânicas e interdinásticas pelo controlo do comércio com os portugueses, e daí o desmembramento dos Mwenemutapas;
  • Contribuiu para o surgimento de novas unidades políticas, onde a classe dominante era formada por mercadores portugueses e indianos estabelecidos como proprietários de terras que haviam sido doadas, compradas ou, em muitos casos, conquistadas – os Prazos.

 

Referencias

DHUEM. História de Moçambique: Parte I- Primeiras Sociedades Sedentárias e Impacto dos mercadores, 200/300-1885; Parte II- Agressão Imperialista, 1886-1830. 1ª Edição, Vol. I, Maputo, 2000.

KI- ZERBO, Joseph. História de África Negra. Mira Sintra, Publicações Europa – América; Vol. I, 3ª ed. 1999.

NEWITTI, Malyn. História de Moçambique. Edição, Publicações Europa – América, 1997

SOUTO, Amélia de Neves. Guia Bibliográfico para Estudante de História de Moçambique. (200/300-1930), Maputo, 1996.