Período Antropológico

Origens e significado

Com o desenvolvimento das cidades, do comércio, do artesanato e das artes militares, Atenas tornou-se o centro da vida social, política e cultural da Grécia, vivendo seu período de esplendor, conhecido como o Século de Péricles. É a época de maior florescimento da democracia, sec V antes do Cristo.

Ora, para conseguir que a sua opinião fosse aceita nas assembleias, o cidadão precisava saber falar e ser capaz de persuadir. Com isso, uma mudança profunda vai ocorrer na educação grega.

A transição da aristocracia para a democracia

Quando não havia democracia, mas dominavam as famílias aristocráticas, senhoras das terras, o poder lhes pertencia. Essas famílias, valendo-se dos dois grandes poetas gregos, Homero e Hesíodo, criaram um padrão de educação, próprio dos aristocratas. Esse padrão afirmava que o homem ideal ou perfeito era o guerreiro belo e bom.

  • Belo: seu corpo era formado pela ginástica, pela dança e pelos jogos de guerra, imitando os heróis da guerra de Tróia (Aquiles, Heitor, Ájax, Ulisses);
  • Bom: seu espírito era formado escutando Homero e Hesíodo, aprendendo as virtudes admiradas pelos deuses e praticadas pelos heróis, a principal delas sendo a coragem diante da morte, na guerra. A virtude era a Arete (excelência e superioridade), própria dos melhores, os aristoi.

Características da democracia do período antropológico

A democracia grega possuía, entre outras, duas características de grande importância para o futuro da Filosofia.

  • Em primeiro lugar, a democracia afirmava a igualdade de todos os homens adultos perante as leis e o direito de todos de participar directamente do governo da cidade, da polis.
  • Em segundo lugar, e como consequência, a democracia, sendo direta e não por eleição de representantes, garantia a todos a participação no governo, e os que dele participavam tinham o direito de exprimir, discutir e defender em público suas opiniões sobre as decisões que a cidade deveria tomar. Surgia, assim, a figura política do cidadão. (Nota: Devemos observar que estavam excluídos da cidadania o que os gregos chamavam de dependentes: mulheres, escravos, crianças e velhos. Também estavam excluídos os estrangeiros.)

Educação no período antropológico

Quando, porém, a democracia se instala e o poder vai sendo retirado dos aristocratas, esse ideal educativo ou pedagógico também vai sendo substituído por outro. O ideal da educação do Século de Péricles é a formação do cidadão. A Arete é a virtude cívica.

Ora, qual é o momento em que o cidadão mais aparece e mais exerce sua cidadania? Quando opina, discute, delibera e vota nas assembleias. Assim, a nova educação estabelece como padrão ideal a formação do bom orador, isto é, aquele que saiba falar em público e persuadir os outros na política.

Para dar aos jovens essa educação, substituindo a educação antiga dos poetas, surgiram, na Grécia, os sofistas, que são os primeiros filósofos do período socrático. Os sofistas mais importantes foram: Protágoras de Abdera, Górgias de Leontini e Isócrates de Atenas.

Contradição entre Sócrates os Sofistas

Sócrates dizia que os ensinamentos dos filósofos cosmologistas estavam repletos de erros e contradições e que não tinham utilidade para a vida da polis. Apresentavam-se como mestres de oratória ou de retórica, afirmando ser possível ensinar aos jovens tal arte para que fossem bons cidadãos.

Os sofistas ensinavam técnicas de persuasão para os jovens, que aprendiam a defender a posição ou opinião A, depois a posição ou opinião contrária, não-A, de modo que, numa assembléia, soubessem ter fortes argumentos a favor ou contra uma opinião e ganhassem a discussão.

O filósofo Sócrates, considerado o patrono da Filosofia, rebelou-se contra os sofistas, dizendo que não eram filósofos, pois não tinham amor pela sabedoria nem respeito pela verdade, defendendo qualquer idéia, se isso fosse vantajoso. Corrompiam o espírito dos jovens, pois faziam o erro e a mentira valer tanto quanto a verdade.

Como homem de seu tempo, Sócrates concordava com os sofistas em um ponto: por um lado, a educação antiga do guerreiro belo e bom já não atendia às exigências da sociedade grega, e, por outro lado, os filósofos cosmologistas defendiam ideias tão contrárias entre si que também não eram uma fonte segura para o conhecimento verdadeiro.

Sócrates propunha que, antes de querer conhecer a Natureza e antes de querer persuadir os outros, cada um deveria, primeiro e antes de tudo, conhecer-se a si mesmo. A expressão “conhece-te a ti mesmo” que estava gravada no pórtico do templo de Apolo, patrono grego da sabedoria, tornou-se a divisa de Sócrates.

Por fazer do autoconhecimento ou do conhecimento que os homens têm de si mesmos a condição de todos os outros conhecimentos verdadeiros, é que se diz que o período socrático é antropológico, isto é, voltado para o conhecimento do homem, particularmente de seu espírito e de sua capacidade para conhecer a verdade. O retrato que a história da Filosofia possui de Sócrates foi traçado por seu mais importante aluno e discípulo, o filósofo ateniense Platão.

O uso da retórica

A retórica é o ato de falar bem, de convencer e de ser eloquente, ou seja, de orquestrar as palavras de um modo que o emissor da fala transmita ao receptor um sentido preciso, organizado, consistente e, consequentemente, convincente.

Sócrates era homem que andava pelas ruas e praças de Atenas, pelo mercado e pela assembleia indagando a cada um: “Você sabe o que é isso que você está dizendo?”, “Você sabe o que é isso em que você acredita?”, “Você acha que está conhecendo realmente aquilo em que acredita, aquilo em que está pensando, aquilo que está dizendo?”, “Você diz”, falava Sócrates, “que a coragem é importante, mas: o que é a coragem? Você acredita que a justiça é importante, mas: o que é a justiça? Você diz que ama as coisas e as pessoas belas, mas o que é a beleza? Você crê que seus amigos são a melhor coisa que você tem, mas: o que é a amizade?”

Sócrates fazia perguntas sobre as ideias, sobre os valores nos quais os gregos acreditavam e que julgavam conhecer. Suas perguntas deixavam os interlocutores embaraçados, irritados, curiosos, pois, quando tentavam responder ao célebre “o que é?”, descobriam, surpresos, que não sabiam responder e que nunca tinham pensado em suas crenças, seus valores e suas ideias.

O pior é que as pessoas esperavam que Sócrates respondesse por elas ou para elas, que soubesse as respostas às perguntas, como os sofistas pareciam saber, mas Sócrates, para desconcerto geral, dizia: “Eu também não sei, por isso estou perguntando”. Donde a famosa expressão atribuída a ele: “Sei que nada sei”.

A consciência da própria ignorância é o começo da Filosofia. O que procurava Sócrates? Procurava a definição daquilo que uma coisa, uma ideia, um valor é verdadeiramente. Procurava a essência verdadeira da coisa, da ideia, do valor. Procurava o conceito e não a mera opinião que temos de nós mesmos, das coisas, das ideias e dos valores.

Opinião e conceito

A opinião varia de pessoa para pessoa, de lugar para lugar, de época para época. É instável, mutável, depende de cada um, de seus gostos e preferências. O conceito, ao contrário, é uma verdade intemporal, universal e necessária que o pensamento descobre, mostrando que é a essência universal, intemporal e necessária de alguma coisa.

Sócrates perguntava: Que razões rigorosas você possui para dizer o que diz e para pensar o que pensa? Qual é o fundamento racional daquilo que você fala e pensa?

Ora, as perguntas de Sócrates se referiam a idéias, valores, práticas e comportamentos que os atenienses julgavam certos e verdadeiros em si mesmos e por si mesmos. Ao fazer suas perguntas e suscitar dúvidas, Sócrates os fazia pensar não só sobre si mesmos, mas também sobre a polis. Aquilo que parecia evidente acabava sendo percebido como duvidoso e incerto.

Sabemos que os poderosos têm medo do pensamento, pois o poder é mais forte se ninguém pensar, se todo mundo aceitar as coisas como elas são, ou melhor, como nos dizem e nos fazem acreditar que elas são. Para os poderosos de Atenas, Sócrates tornara-se um perigo, pois fazia a juventude pensar. Por isso, eles o acusaram de desrespeitar os deuses, corromper os jovens e violar as leis. Levado perante a assembléia, Sócrates não se defendeu e foi condenado a tomar um veneno – a cicuta – e obrigado a suicidar-se.

O julgamento e a morte de Sócrates são narrados por Platão numa obra intitulada Apologia de Sócrates, isto é, a defesa de Sócrates, feita por seus discípulos, contra Atenas.

Características gerais do período socrático

  • A Filosofia se volta para as questões humanas no plano da ação, dos comportamentos, das ideias, das crenças, dos valores e, portanto, se preocupa com as questões morais e políticas.
  • O ponto de partida da Filosofia é a confiança no pensamento ou no homem como um ser racional, capaz de conhecer-se a si mesmo e, portanto, capaz de reflexão. Reflexão é a volta que o pensamento faz sobre si mesmo para conhecer-se; é a consciência conhecendo-se a si mesma como capacidade para conhecer as coisas, alcançando o conceito ou a essência delas.
  • A Filosofia está voltada para a definição das virtudes morais e das virtudes políticas, tendo como objecto central de suas investigações a moral e a política, isto é, as ideias e práticas que norteiam os comportamentos dos seres humanos tanto como indivíduos quanto como cidadãos.
  • A opinião, as percepções e imagens sensoriais são consideradas falsas, mentirosas, mutáveis, inconsistentes, contraditórias, devendo ser abandonadas para que o pensamento siga seu caminho próprio no conhecimento verdadeiro.

Diferença entre os sofistas, Sócrates e Platão

Os sofistas aceitam a validade das opiniões e das percepções sensoriais e trabalham com elas para produzir argumentos de persuasão, enquanto Sócrates e Platão consideram as opiniões e as percepções sensoriais, ou imagens das coisas, como fonte de erro, mentira e falsidade, formas imperfeitas do conhecimento que nunca alcançam a verdade plena da realidade.

Conclusão

Com fim do trabalho concluiu se que Período a filosofia Socrática marca um momento também conhecido por Período Antropológico. Mais uma vez temos uma palavra de origem grega composta por outras duas: Antropos e Logos. Já sabemos que Logos significa ciência ou estudo de determinado assunto; Antropos significa Homem, no seu sentido genérico, marcando a qualidade de Ser Humano enquanto espécie destacada das demais. “Antropológico” ou “Antropologia” resulta em ciência ou estudo do homem e de suas qualidades intrinsecamente humanas.

Enquanto os pré-socráticos estavam preocupados em definir a essência da natureza, a phisis, Sócrates estava preocupado com questões absolutamente relacionadas às qualidades humanas. Portanto, a justiça, a honra, a beleza, a bondade, não são qualidades que se encontram na natureza, não possuem a phisis como sua essência. São, na verdade, qualidades estritamente relacionadas com a capacidade de julgar do ser humano. Assim, por exemplo, se uma pessoa acha uma paisagem bonita, a beleza desta paisagem não está nela mesma, mas no julgamento daquele que assim a considera.

Deste modo, a natureza não pode ser nem bela nem feia, nem justa nem injusta, nem boa nem má. A natureza apenas contém objetos físicos que, para Sócrates, não passavam de cópias defeituosas das idéias que são perenes e que habitam um mundo que só pode ser visitado pelo espírito racional.

Assim, se desloca o eixo das investigações filosóficas da natureza para o homem. Enquanto os Pré-Socráticos pretendiam entender e explicar o universo por meio da compreensão de sua essência atômica, os elementos, Sócrates pretendia conhecer o universo a partir daquele que o pensa, por meio da essência humana que ele acreditava ser a Razão ou o Espírito.

 

Bibliografia

GEQUE Ed e BIRIATE. Manuel, Filosofia 11a classe, Longamn Ed Moçambique, 2010.