CAPÍTULO 1: Introdução ao Direito Económico

 

Capítulo 1: INTRODUÇÃO AO DIREITO ECONÓMICO

 

  1. AS RELAÇÕES ENTRE O DIREITO E A ECONOMIA. 2
  2. CONCEITO DE DIREITO ECONÓMICO.. 3
  3. NATUREZA JURIDICA E OBJECTO DO DIREITO ECONÓMICO.. 4
  4. O DIREITO ECONÓMICO COMO DISCIPLINA JURÍDICA NOVA E AUTÓNOMA (AUTONOMIA DO DIREITO ECONÓMICO) 5
  5. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO ECONÓMICO.. 6
  6. AS RELAÇÕES ENTRE O DIREITO ECONÓMICO E OUTROS RAMOS DO DIREITO.. 7
  7. a) Direito Económico e Direito Constitucional: 8
  8. b) Direito Económico e Direito Administrativo: 8
  9. c) Direito Económico e Direito Criminal ou Penal: 9
  10. d) Direito Económico e Direito Financeiro: 9
  11. e) Direito Económico e Direito Fiscal: 9
  12. f) Direito Económico e Direito Internacional Público: 9
  13. g) Direito Económico e Direito Civil: 10
  14. h) Direito Económico e Direito Comercial: 10
  15. i) Direito Económico e Direito do Trabalho: 10
  16. j) Direito Económico e Direito Internacional Privado: 10
  17. ORIGEM E EVOLUÇÃO DO DIREITO ECONÓMICO.. 11
  18. SUJEITOS DO DIREITO ECONÓMICO.. 12
  19. FONTES DO DIREITO ECONÓMICO.. 13

9.1.      Noção. 13

9.2.      Complexidade e Diversificação. 13

9.3.      Tipos de Fontes. 14

  1. a) Fontes Internas. 14
  2. b) Fontes internacionais. 14
  3. c) Fontes de Origem Mista ou Privada (novas fontes do Direito Económico). 15

9.4.      Hierarquia das Fontes. 15

  1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PAPEL DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÓMICO.. 17

10.1.    O Estado Liberal 17

10.2.    O Estado Social 18

10.3.    O Estado Democrático de Direito. 19

  1. O DIREITO ECONÓMICO NO CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO.. 20

 

 

1.        AS RELAÇÕES ENTRE O DIREITO E A ECONOMIA

 

Tanto o Direito como a Economia têm por objecto comportamentos humanos e relações sociais.

 

a)      Economia - é a ciência social que estuda a produção, distribuição/circulação e consumo de bens e serviços.

 

Ela estuda as formas de comportamento humano resultantes da relação entre as necessidades dos homens e os recursos disponíveis para satisfazê-las.

 

A ciência económica está sempre analisando os principais problemas económicos: o que produzir, quando produzir, em que quantidade produzir e para quem produzir.

 

b)     Direito - é um sistema de normas de conduta social com protecção coactiva (impostas pelo Estado.

 

As relações entre o Direito e a Economia:

 

As relações entre o direito e a economia poderão ser definidas por uma interdependência, embora possuindo uma autonomia própria com funções e valores próprios, o que legitima o seu estudo segundo ópticas e metodologias distintas.

 

Entretanto, na interacção entre o Direito e a Economia há um verdadeiro encontro interdisciplinar, uma relação estreita que dá lugar ao ramo do Direito que se designa Direito Económico.

 

O Direito Económico é uma disciplina jurídica autónoma e tem como função enquadrar, reger e normalizar a economia.

 

A produção de normas de Direito, a sua aplicação, bem como a resolução de litígios por meio de processos e decisões judiciais, aspectos que são tidos como predominantemente (e até exclusivamente) jurídicos são, todavia, aspectos que contém também dimensões económicas.

 

Qualquer economia para funcionar de forma harmoniosa necessita inevitavelmente de regras que assegurem a adequada relação entre os agentes económicos no âmbito da actividade produtiva e na apropriação do uso de factores de produção.

 

O “Direito” considerado como o conjunto de normas jurídicas que regula as relações entre as pessoas na sociedade, “vai subsumir todos aqueles aspectos da vida económica, as actividades dos agentes económicos na norma jurídica, no sistema jurídico, de modo a estabelecer-se uma harmonia”.

 

O Direito quando influencia a actividade económica através das suas normas pretende induzir comportamentos aos agentes económicos vinculando-os a uma conduta dentro da norma jurídico-económica.

 

É o Direito que tem o objectivo de resolver conflitos entre os indivíduos no âmbito da actividade económica.

 

2.        CONCEITO DE DIREITO ECONÓMICO

 

A doutrina não é unânime quanto a definição do Direito Económico, pois existe uma pluralidade de concepções tais como:

 

  1. A concepção do Direito Económico como todo o Direito da economia;

 

  1. A concepção do Direito Económico abrangendo apenas alguns aspectos específicos do Direito da Economia, que compreende:

 

  • A concepção do Direito Económico como Direito da direcção da produção e da circulação da riqueza;
  • A concepção do Direito Económico como Direito da organização e do desenvolvimento económico;
  • A concepção do Direito Económico como Direito da concertação e colectivização dos meios de produção e de organização da economia pelos poderes públicos e privados;
  • A concepção do Direito Económico como Direito especial de intervenção do Estado na economia.

 

  • O Direito Económico identificado como todo o Direito da Economia (concepção lata)

 

Uma corrente identifica o Direito Económico como todo o direito relativo à economia (J. HAMEL e G. LAGARDE, Franceses).

 

Crítica: esta noção é bastante vaga ou imprecisa, por que assenta num conceito indeterminado ou de fronteiras imprecisas – o conceito de economia.

 

A identificação do Direito Económico como todo o direito relativo à economia afigura-se demasiado extensa e não exprime a sua especificidade, englobando desse modo, todas as regras de direito privado (ex: direito das obrigações, direitos reais ou patrimonial, direito comercial) e direito público (ex: Direito Financeiro) atinentes à actividade económica.

 

Ou seja, estender-se-ia a zonas de direito público que tenham incidência económica mas que devem estar fora do âmbito do Direito Económico como por exemplo a disciplina jurídica das obras públicas, o direito das expropriações, o regime jurídico do domínio público, bem assim a matérias contíguas ao Direito Económico em sentido restrito, como por exemplo o direito da segurança social.  

 

Pode-se assim concluir que esta noção de Direito Económico como Direito da Economia não é defensável, embora tenha vários seguidores, pois a doutrina que assim considera não aponta realmente quais as fronteiras que delimitam ou separam os vários domínios do público e do privado, do económico e do jurídico.

 

Na verdade, o Direito Económico dirige-se ao estudo dos problemas colocados pela intervenção do Estado na economia, analisando também os temas decorrentes desse assunto principal. É uma disciplina jurídica autonóma, com regras e principios próprios.

 

  • O Direito Económico abrangendo apenas alguns aspectos específicos do Direito da Economia (concepções restritas)

 

Afastada a definição do Direito Económico como Direito de toda a Economia, surgem várias concepções que procuram estabelecer a noção geral e o critério delimitador do Direito Económico:

 

  1. Para SAVATIER, o Direito Económico é um ramo do Direito que tem por missão dirigir a vida económica e em especial a produção e circulacão de riqueza.

 

  1. CHAMPAUD considera o Direito Económico como Direito da organização e desenvolvimento económico, quer estes dependam do Estado, da iniciativa privada ou do concerto de um e de outro tendo como objecto fundamental a empresa.

 

  1. FARJAT considera o Direito Económico como Direito da concertação e da colectivação dos meios de produção e de organização da economia.

 

  1. SAVY propõe uma concepção finalista do Direito Económico, e afirma que ele tem em vista o equilíbrio dos agentes económicos públicos ou privados e o interesse económico geral.

 

  1. ALEX JACQUEMIN e GUY SCHRANS consideram que o Direito Económico não se trata de um ramo autónomo do direito, mas de uma técnica de abordagem científica das relações fundamentais entre o direito e a economia.

 

DEFINIÇÃO ADOPTADA:

 

O Direito Económico é o ramo do Direito Público que tem por objectivo o estudo das relações entre os entes públicos e os sujeitos privados na perspectiva da intervenção do Estado na vida económica.

 

Esta posição é defendida pelo Professor Luís Cabral de Moncada e tem como vantagens especificar o campo do Direito Económico e delimitar o corpo das regras.

3.        NATUREZA JURIDICA E OBJECTO DO DIREITO ECONÓMICO

 

  1. Natureza jurídica: o Direito Económico afirma-se fundamentalmente como o Direito Público que tem por objectivo o estudo das relações entre os entes públicos e os sujeitos privados na perspectiva da intervenção do Estado na vida económica.

 

  1. Objecto: o Direito Económico tem por objecto as regras jurídicas que disciplinam a intervenção do Estado na economia.

 

Sobre a natureza jurídica do Direito Económico existe uma problemática da classificação do Direito Económico como Direito Público ou Direito Privado. Trata-se de saber qual é a posição do Direito Económico na sistemática geral do Direito.

 

Ora, é ponto assente que:

 

O Direito Económico é predominantemente Direito Público, não só pelas finalidades que prosseguem as normas que o corporizam, mas também pelos instrumentos e meios jurídicos em que se concretizam, expressão do jus imperi do Estado.

 

Enquanto ramo de Direito, o Direito Económico regula ou disciplina as relações que, no campo da economia, se estabelecem entre o Estado e os agentes económico, agindo o Estado como autoridade, porque investido do seu jus imperi e do seu jus puniendi.

 

O cerne do Direito Económico são normas jurídicas de Direito Público. É esta a orientação que melhor isola o seu conteúdo específico.

 

Qualquer que seja o critério adoptado para a distinção entre o Direito Público e o Direito Privado – seja o do interesse, o da posição relativa dos sujeitos ou da qualidade em que intervêm na relação jurídica – o Direito Económico é qualificado como um ramo do Direito Público, pois este ramo prossegue a realização de interesses colectivos com um dos sujeitos – o Estado – investido de garantias e poderes próprios.

 

Não se pode em nenhuma circunstância afirmar que o Direito Económico é um ramo do Direito Privado, pois, ele é por excelência um ramo do Direito Público, embora existam nele, mas em percentagem muito pequena, algumas normas de natureza privada.

 

Portanto, este é o seu posicionamento no sistema do Direito, esta é a sua natureza jurídica.

 

O Direito Económico surge-nos não como o direito geral da actividade económica, mas como o direito especial da intervenção Estadual.

 

Entretanto, o Direito Privado continua a ter um papel muito importante na configuração jurídica da intervenção económica. O Direito Económico é aplicado em combinação com elementos de Direito Privado, pressupostos da execução das normas de Direito Público. Trata-se do fenómeno da interpenetração do Direito Público e do Direito Privado, que ocorre intensamente no campo da actividade económica. Por exemplo, o facto do Estado privatizar as suas unidades económicas e actividades, permite o surgimento do direito do sector privado.

 

4.        O DIREITO ECONÓMICO COMO DISCIPLINA JURÍDICA NOVA E AUTÓNOMA (AUTONOMIA DO DIREITO ECONÓMICO)

 

Muito embora no Direito Económico não se encontram algumas das clássicas manifestações externas dos ramos de Direito (Codificação, autonomia processual, magistratura específica), isso não impede que se possa falar dele como um novo ramo de direito em formação.

 

O Direito Económico é um ramo de direito autónomo porque tem:

 

  1. Objecto próprio

 

É  o único ramo de direito que disciplina a actividade económica no seu conjunto. (estuda o enquadramento jurídico do circuito económico, os sujeitos do processo económico e os aspectos de produção  e distribuição).

 

  1. Função própria

 

Ordenar e regular a actividade económica no seu conjunto.

 

  1. Fim próprio

 

Garantir a satisfação do interesse económico geral.

 

  1. Conteúdo próprio

 

Conjunto de normas específicas às áreas a ser reguladas.

 

O Direito Económico possui características específicas que não permitiram a absorção das suas normas por ramos de direito já existentes.

 

Ele tem vindo a construir-se da reavaliação de certos núcleos temáticos oriundos de outros ramos de direito (relação entre a economia e a Constituição, intervenção económica do Estado, bens produtivos, etc.) e da consideração de novas realidades para as quais os ramos existentes se mostram insuficientes ou inadequados (empresa, concorrência, concertação social, etc.).

 

  1. Autonomia funcional-pedagógica

 

O Direito Económico é uma disciplina que se lecciona separadamente das outras.

 

A proliferação de estudos de cariz económico, e mais que isso, a inserção nos programas curriculares das Faculdades de Direito e de Economia, de uma cadeira de Direito Económico, parece dizer-nos claramente que há uma necessidade pedagógica, funcional, operatória de estudo de diversos temas não focados, ou tratados nas disciplinas curriculares tradicionais.

 

5.        CARACTERÍSTICAS DO DIREITO ECONÓMICO

 

  1. Carácter recente: o Direito Económico é jovem em relação ao Direito Público em geral.

 

  1. Mobilidade ou mutabilidade das normas jurídicas: pressupõe a transitoriedade da vigência de uma parte das suas normas, e na sua adaptação aos casos concretos, em parte justificada pela sua natural sensibilidade às mudanças sociais e pela sua ligação ás frequentes alterações da conjuntura política e económica do país. (ex: em 1975 após a independência nacionaliza-se e nos anos 90 privatiza-se).

 

  1. Dispersão e heterogeneidade: manifestam-se na diversidade das suas fontes de direito, com recurso simultâneo a regimes jurídicos de Direito Público e de Direito Privado que vão além das fontes tradicionais (ex: surgimento de fontes não Estaduais – Acordos de Concertação, Códigos de Conduta, Contratos-tipo), na abundância de legislação económica.

 

  1. Diversidade: o Direito Económico depende da estrutura económica dominante em cada país.

 

  1. Permeabilidade política: o Direito Económico é particularmente sensível aos valores e orientações políticas do poder legislativo e da Administração, e assenta em princípios valorativos que deixam uma ampla esfera de liberdade regulamentar que será preenchida chamando á colação critérios políticos ao sabor das maiorias Parlamentares ou das opções do Governo do dia.

 

A vontade política dos órgãos do Poder é, deste modo, um componente essencial e evidente do Direito Económico, porque a vontade política do legislador é essencial.

 

  1. Carácter concreto das normas: o Direito Económico é mais concreto do que os outros ramos de direito, pois cria normas  para regular certas situações em determinadas áreas, num determinado momento, com o fim de realizar o interesse económico geral.

 

O Direito Económico disciplina os fenómenos socioeconómicos concretos, vinculado aos factos históricos relevantes ao Estado e aos indivíduos.

 

  1. É um direito quadro: enquadra a actividade económica, através de normas que ao serem cumpridas, se realizam, deixando depois um espaço jurídico para outros ramos de direito.

 

  1. Exige uma interdisciplinaridade interna e externa: necessidade de grande conhecimento dos outros ramos de direito e de outros conhecimentos que de Direito.

 

  1. Declínio da imperatividade e coercibilidade das normas: com recurso crescente a incentivos, em detrimento das medidas de repressão.

 

Se o legislador pretender assegurar o cumprimento de metas económicas pela imposição de sanções penais corre o risco do incumprimento e da impunidade.

 

  1. Crescente autonomização científica e pedagógica dos sub - ramos do Direito Económico (por exemplo, o Direito Agrário, Direito dos Transportes, Direito Industrial, Direito da Energia).

 

6.        AS RELAÇÕES ENTRE O DIREITO ECONÓMICO E OUTROS RAMOS DO DIREITO

 

O Direito Económico é um ramo do Direito moderno e autónomo, com a  finalidade de conhecer e regular a actividade económica, e que se relaciona com os demais ramos do direito.

 

O facto do Direito Económico ter autonomia didáctica e científica, não significa que não haja uma interpenetração ou recepção de conceitos e técnicas provenientes de outras áreas jurídicas, podendo falar-se neste sentido de uma  interdisplinaridade interna que ultrapassa o campo jurídico.

 

O Direito Económico tem mais afinidades com os seguintes ramos, de que recebe importantes contributos: Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito Penal, Direito Financeiro, Direito Fiscal, Direito Internacional Público, Direito Privado.

 

a)    Direito Constitucional:

 

O Direito Constitucional ocupa-se da ordem jurídica e da ordem política do Estado. A Constituição é a lei-mãe.

 

A Constituição estrutura, por meio de seus princípios, as regras que irão nortear as relações entre o Estado e as actividades económicas, bem assim o enquadramento geral e o conteúdo das actividades económicas fundamentais, a serem seguidas pelo Governo e pelos cidadãos, considerada em termos de direitos e obrigações.

 

Ou seja, no caso específico do Direito Económico, o Direito Constitucional cuida da consagração do sistema e do regime económicos, bem como os grandes princípios das relações entre o Estado e os grupos de interesses ou a economia em geral.

 

O Direito Constitucional traça o quadro de princípios a que a economia se deve subordinar, e também fixa a organização económica, os direitos e deveres das pessoas no âmbito da actividade económica.

 

b)   Direito Administrativo:

 

O Direito Administrativo visa a prestação eficiente de determinados serviços públicos, enquanto o Direito Económico tem por escopo regular as atividades exercidas pelos agente económicos.

 

A interligação entre esses ramos reside no facto do Direito Administrativo também regular a intervenção do Estado no domínio económico quando edita normas atinentes ao serviço público (Serviços Administrativos do Estado e servem os cidadãos e agentes económicos que acorrem ao mesmos), bem assim quando o Estado intervém na economia como agente económico (praticando actividades económicas sob a sua própria gestão – ex: através de Empresas Estatais[1]), aí intervém as normas de Direito Administrativo a regular tais processos.

 

Por outro lado, os órgãos do Estado de licenciamento e inspecção da actividade económica exercem uma efectiva actividade administrativa. 

 

Entretanto, importa notar que o Direito Administrativo possui estrutura e teleologia distinta do Direito Económico, sendo certo que o conteúdo daquele está fincado em regras rígidas (calcadas na estrita legalidade), programadas (pois decorrem de comandos estabelecidos em lei) e com eficácia decorrente. Por seu turno, o Direito Econômico encerra critérios que possibilitam uma maior flexibilidade normativa, além de sua pragmaticidade.

 

c)    Direito Criminal ou Penal: 

 

Ao Direito Criminal compete tipificar as condutas consideradas criminosas, isto é, que se traduzem em infracções criminais, disciplinando a aplicação das penas e das medidas de segurança.

 

O Direito Criminal disciplina e garante a defesa da sociedade contra os actos individuais que a afectam na sua conservação, fixando as penas e os meios preventivos adequados.

 

Sucede que certas práticas de consequências económicas podem ter o carácter de crime e ou contravenção, neste caso incluem-se no Direito Criminal.

 

Por exemplo, a fraude, peculato, furto, roubo, especulação, açambarcamento, contrafacção, entre outras levam a a consequências económicas. Assim, quando normas legais de determinadas práticas económicas são violadas, caracteriza-se o ilícito económico. Refira-se neste âmbito, para além das disposições contidas no Código Penal, a Lei nº 9/87, de 19 de Setembro – Lei de Defesa da Economia.

 

A interligação entre entre o Direito Económico e o Direito Criminal reside no facto do Direito Criminal também regular aspectos de natureza económica, tipificando-os como crimes e contravenções. O Direito Penal Económico fixa os crimes económicos e as sanções aplicáveis aos respectivos infractores.

 

d)   Direito Financeiro: 

 

O Direito Financeiro é o conjunto de normas jurídicas que regulamentam as finanças públicas, isto é, as receitas e as despesas do Estado. Considerando o imposto como a forma clássica do Estado obter recursos para a sua manutenção e o orçamento como a peça chave na aplicação dos recursos financeiros do estado, vislumbra-se aí vários ellementos que aproximam o Direito Financeiro do Direito Económico.

 

e)    Direito Fiscal:  

 

O Direito Fiscal é o Direito Financeiro especial e consiste no conjunto de normas que regulamentam a relação jurídica de imposto. Neste sentido, são estreitas as relações entre o Direito Fiscal e o Direito Económico na medida em que a actividade de captação de receitas fiscais por parte do Estado processa-se no âmbito do Direito Económico.

 

f)     Direito Internacional Público:

 

O Direito Internacional Público é considerado como o conjunto de regras e princípios que regem as relações jurídicas entre Estados e outras entidades internacionais. Assim, o conteúdo económico do Direito Internacional Público está nos instrumentos de disciplina como as relações político-económicas entre os Estados irão processar-se.

 

A relação com o Direito Internacional fica evidente quando se verifica a influência que o mercado internacional exerce sobre a economia interna ou mesmo o impacto que as grandes fusões entre empresas, inclusive estrangeiras, causam no mercado interno.

 

Por outro lado, a internacionalização da economia e a crescente cooperação entre os Estados, manifesta-se no Direito Económico com a celebração de numerosos tratados, convenções e acordos de natureza económica quer a nível bilateral (entre dois Estados), quer multilateral (envolvendo vários Estados e no quadro de organizações económicas regionais, ex: SADC, ou internacionais, ex: OMC – Organização Mundial do Comércio).

 

g)   Direito Civil:

 

 O Direito Civil é o direito privado comum, e tem por objecto disciplinar os interesses entre particulares.

 

O direito civil patrimonial funciona como regra subsidiariamente aplicável nas relações jurídico-económicas.

 

As normas do Direito Civil apresentam conteúdo económico quando abrangem a parte correspondente aos bens, património e aos actos e factos económicos. O instituto jurídico-civil do “contrato” constitui um elemento fundamental das relações económicas.

 

h)   Direito Comercial: 

 

O Direito Comercial regula a situação dos comerciantes e as relações que tenham por objecto actos comerciais.

 

Existe uma vasta zona de matérias do direito comercial substancialmente atingidas pelo influxo do Direito Económico. Os argumentos apresentados no Direito Comercial são válidos para o Direito Económico com referência aos interesses privados regulamentados pelo contrato.

 

As relações entre o Direito Comercial e o Direito Económico podem ser definidas a partir do facto de que o Direito Comercial regulamenta a actividade do comerciante no exercício da troca e à base do contrato, enquanto que o Direito Económico vai traduzir e ordenar a política económica exercida no mercado. 

 

i)     Direito do Trabalho:  

 

A relação entre essas disciplinas tem uma origem histórica, na medida em que foram as mudanças no perfil económico do Estado que levaram ao surgimento do Direito do Trabalho. A forma de actuação do Estado na ordem económica continua a influenciar as normas relativas ao trabalho. Por outro lado, grande parte da regulamentação do Direito do Trabalho resulta da influência das normas de Direito Económico.

 

j)     Direito Internacional Privado: 

 

O Direito internacional Privado é o sistema de normas de conflitos que, nas relações privadas com conexões internacionais, determinam quais as normas nacionais que vão reger cada questão jurídica de cada relação. Nessa medida, as relações económicas privadas internacionais serão igualmente abrangidas pelo Direito Económico.

 

7.        ORIGEM E EVOLUÇÃO DO DIREITO ECONÓMICO

 

A sistematização doutrinal e científica do Direito Económico como disciplina autónoma teve  inicio na Alemanha, sob a Constituição de Weimar (1919), tendo sido esta a 1ª Constituição a inserir a vida económica como objecto da lei fundamental e a legitimar a intervenção do Estado na vida económica.

 

Foi a partir da 1ª Guerra Mundial (1914 - 1918), na crise económica de 1929, e depois da  2ª Guerra Mundial (1939 – 1945), que o Estado passou a intervir na economia, deixando de ser o Estado neutro típico do liberalismo.

 

O fenómeno que fez aparecer o Direito Económico foi a mudança para um Estado intervencionista (do liberalismo para o capitalismo), o fim da era liberal em que a relação do Estado com a Economia se alterou.

 

Em 1929 surge uma grande crise económica com uma elevada taxa de desemprego e de inflação, uma taxa de crescimento reduzida, perdurava a fome, a bancarrota, etc.

 

JOHN KEYNES, em 1936, escreveu a obra Teoria Geral do Emprego, Juro e Moeda, considerando que a intervenção do Estado na economia era a única forma de evitar crises económicas.

 

O Direito Económico evoluiu no mundo influenciado pelos seguintes factores:

 

  1. a) O papel activo do Estado na regulação da economia, que consistiu na progressiva criação de normas para disciplinar a actividade económica, de modo directo e indirecto;

 

  1. b) A passagem do capitalismo concorrencial para o capitalismo organizado;

 

  1. c) As crises económicas (1929) e os efeitos das Guerras Mundiais, que contribuiram para regulação pública da economia;

 

Com a 1ª e 2ª Guerra Mundial o Estado passa a intervir directamente e indirectamente na economia para satisfazer as exigências e as necessidades trazidas pelas Guerras.

 

A intervenção abarcou domínios de segurança social, política de emprego, protecção no trabalho, protecção à família, política educacional, política de saúde, etc. A crescente intervenção do Estado na economia permite encontrar formas de equilíbrio entre os poderes públicos e os poderes privados.

 

Foi depois da 2ª Guerra Mundial que se procedeu, em muitos países Europeus, as nacionalizações, criando-se um sector público económico importante e forte, tendo em vista o controlo mais eficaz do crescimento económico. Neste período ocorre a divisão dos Sistemas Económicos em dois grandes grupos principais: os denominados Ocidentais e os países Socialistas - Marxistas.

 

  1. d) A pressão sobre o Estado, feita por todos os que se sentiam prejudicados pelo funcionamento do mercado, nomeadamente organizações sociais, políticas, empresas nacionais face à concorrência estrangeira, as pequenas e médias empresas face às grandes empresas e os trabalhadores face aos empresários;

 

  1. e) As teorias sociais e políticas dominantes na época, que impulsionaram e legitimaram o processo de intervenção, nomeadamente as teorias Keynesianas, as neo-marxistas, as socialistas e as sociais-cristãs.

 

KEYNES dizia que o Estado deveria intervir para estabilizar a economia. Apareceu neste momento para defender, pela 1ª vez, a intervenção do Estado, no sentido do investimento público em tempos de recessão, defendendo que perante um aumento da procura agregada a oferta responderia;

 

  1. f) A integração regional das economias, com a formação de organizações regionais (na Europa a Comunidade Económica Europeia – CEE, hoje União Europeia, em África a CEDEAO, Convenção de Lomé, SADC, etc).

 

 

Em Moçambique, os primeiros sinais de um Direito Económico nascente surgem com a primeira Constituição da República Popular de Moçambique, em 1975. Foi institucionalizado o Sistema Económico Socialista.

 

Embora se tenha proclamado uma economia centralmente planificada, as normas do Direito Económico tinham como base a política económica traçada pela FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique).

 

A aplicação intensiva das normas do Direito Económico ganha forma a partir de 1987, altura em que se desenham os primeiros sinais de implementação de uma economia de mercado. Entretanto em 1990, com a aprovação da nova Constituição da República, no Capítulo IV – Organização Económica e Social, são claros os desígnios do Estado Moçambicano no que se refere à actividade económica e as novas relações que se passaram a estabelecer entre os agentes económicos e os poderes estaduais.

 

 

8.        SUJEITOS DO DIREITO ECONÓMICO

 

Os sujeitos do Direito Económico (que participam na ordem económica) são:

 

  1. O Estado: é considerado sujeito de Direito Económico em razão de ser responsável pela edição das normas que materializam a política económica e da sua prerrogativa intervir no domínio económico de forma directa e indirecta.

 

  1. Os Indivíduos: são agentes económicos em razão do seu trabalho (realizam a actividade económica) e são consumidores de bens e serviços.

 

  1. As Empresas: são agentes económicos enquanto unidades de produção de bens e prestação de serviços e também enquanto consumidores.

 

  1. A Coletividade: representa os sujeitos tomados num sentido indeterminando, titulares de direitos difusos, direitos colectivos e direitos individuais homogêneos.

 

  1. Os Órgãos, Organismos Internacionais ou Comunitários: os organismos internacionais (por exemplo, FMI – Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial, OMC - Organização Mundial do Comércio) e os Organismos comunitários (no caso Europeu temos a UNIÃO EUROPEIA, no caso Africano temos a UNIÃO AFRICANA, antiga OUA – Organização da Unidade Africana, e outros organismos regionais tais como: Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), Comunidade da África Oriental (em inglês: East African Community - EAC), Comunidade Econômica dos Estados da África Central (ECCAS / CEEAC), na América do Sul temos o MERCOSUL - Mercado Comum do Sul, ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático, etc. têm uma influência muito grande na sociedade moderna.

 

A Organização Mundial do Comércio, por exemplo, dirime controvérsias existentes sobre comércio internacional. Um organismo internacional pode interferir numa política do Estado. Então é importante a gente quando pensa na Ordem Econômica ter uma visão macro e uma visão micro, não pensar só na ordem interna. Mas ver também que existe uma ordem externa que acaba atuando diretamente sobre o Estado.

 

  1. As Associações, Comunidades, Massas, Entes Genéricos (investidor, Produtor, Consumidor, etc).

 

9.        FONTES DO DIREITO ECONÓMICO

9.1.    Noção

Entende-se por Fontes de Direito os modos de revelação das normas jurídicas, os órgãos políticos encarregados de as formular e definir, assim como os diplomas em elas se encontram.

Nos termos do nº 1, do artigo 1º do Código Civil, a Lei e as normas corporativas são fontes imediatas e primárias de formação e criação de normas jurídicas.

São normas corporativas as regras ditadas pelos organismos representativos das diferentes categorias morais, culturais, económicas ou profissionais no domínio das suas atribuições, bem como os respectivos Estatutos e Regulamentos Internos.

9.2.    Complexidade e Diversificação 

Falar das fontes de Direito Económico, isto é, das formas de revelação das normas jus-económicas é uma questão delicada. É que, cada vez mais, se questiona o tradicional monopólio dos poderes públicos na produção de normas jurídicas, ou seja, põe-se em causa o monopólio do Estado na criação de normas jurídico- económicas.

É verdade no entanto sque grande parte do Direito Económico, assenta em normas com origem nas autoridades públivcs, mas também é verdade que não se esgota nelas. Há normas desenvolvidas cada vez mais de forma negociada entre poderes públicos e privados – um direito de concertação económica – oau mesmo provenientes de entidades ou instituições privadas, desprovidas do clássico poder de supremacia (jus imperii), e que tem por objectivo a regulação de práticas económicas, negociais e profissionais, com particular relevância para os Códigos de Conduta.

A ordem jus-económica é assim eminentemente plural, sendo diversificado o elenco das suas fontes. Ao lado das tradicionais fontes formais de direito, é necessário considerar outras (“por vezes designadas fontes materiais”), quer de natureza mista, quer de natureza privada.

9.3.    Tipos de Fontes  

Constituem fontes de Direito Económico: a Constituição, Tratados e Acordos Internacionais, Lei, Decretos e Regulamentos do Governo e do poder local (Municípios) e outras instituições públicas.

Quanto à sua classificação, as fontes podem ser ordenadas em: a) Fontes Internas; b) Fontes Internacionais e c) Fontes de Origem Mista ou Privada (novas fontes do Direito Económico).

 

a)   Fontes Internas

  • A primeira fonte do direito é, por excelência, a Constituição da República pois é ela que contém um conjunto de preceitos basilares que se referem directamengte à economia e que constitui a essência da Constituição Económica.
  • As Leis Ordinárias da Assembleia da República, os Decretos-Leis (do Conselho de Ministros), as Resoluções da Assembleia da República com relevância económica.
  • Os Regulamentos do Governo, sob a forma de Decretos, Resoluções, Diplomas Ministeriais e Despachos Normativos que, directa ou indirectamente, regem determinados aspectos da ordem económica são fontes imdeiatas do direito económico.
  • Outros regulamentos de Municípios e outras instituições públicas (por exemplo, Avisos do Banco de Moçambique que são obrigatórios para o sistema financeiro) no âmbito da actividade económica.
  • Em matéria de legislação, a especificidade do Direito Económico está no papel peculiar das leis-directriz (como a Lei do Plano) e das leis-medida que se aplicam a um círculo restrito de  pessoas ou a um número limitado de casos.

b)  Fontes internacionais

As fontes internacionais do Direito Económico dizem respeito aos factos normativos com origem na ordem jurídica internacional, de cariz universal, continental ou regional (como por exemplo, os casos de FMI, Banco Mundial, SADC, etc), que têm vigência no ordenamento jurídico interno, encontrando-se nessa situação todas as convenções com incidência económica às quais Moçambique se vincule.

 

O caso específico da SADC – Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, foi formalmente constituída em Lusaka – Zâmbia, em Abril de 1980. Como objectivos principais que presidiram a criação da SADC podem apontar-se a promoção da implementação de políticas, programas e projectos nacionais, internacionais e regionais, com vista a integração económica.

 

Moçambique ratificou o Tratado e Protocolos de criação da SADC através da Resolução  3/93 da Assembleia da República.

 

Resumindo, as fontes internacionais são:

 

  • Convenções Internacionais;
  • Acordos Internacionais;
  • Contratos Internacionais;
  • E outros instrumentos legais de que o país é parte.

 

 

c)   Fontes de Origem Mista ou Privada (novas fontes do Direito Económico).

 

Para além da regulação de índole pública, é de realçar a existência de uma regulação de natureza mista ou privada, em regra com carácter suplectivo ou complementar àquela.

 

  • Fontes de natureza Mista: tem a ver com as decisões, acordos ou pareceres emanados dos organismos de concertação económica e social. Refira-se ainda a importância dos contratos-programa e de outras formas de contratação económica entre entes públicos e privados (por exemplo, ver o Decreto nº 7/94, de 9 de Maco – Comissão Consultiva do Trabalho).

 

  • Fontes de natureza Privada: tem a ver com a regulamentação das actividades económicas pelas Associações Profissionais, nomeadamenge através de decisões internas ou de Códigos de Conduta, os usos da actividade económica de carácter interno ou internacional, designadamente as práticas negociais que se traduzem em contratos-tipo ou contratos de adesão, sucessivamente reutilizados em determinados ramos de actividade económica (como nos seguros ou nos sectores da energia e das telecomunicações), as decisões vinculativas dos grupos da sociedade, etc.

 

Podemos encontrar um poder regulamentar exercido por organismos económicos privados, quando consentida por lei ou outro diploma regulamentar, sendo ou não homologado por organismo público.

 

9.4.    Hierarquia das Fontes  

 

As fontes normativas, no Direito Moçambicano podem ser ordenadas de acordo com a seguinte hierarquia:

 

1º)   Constituição da República

 

O nº 4, do artigo 2 da Constituição da República de Moçambique de 2004 estabelece que “as normas Constitucionais prevalecem sobre todas as restantes normas do ordenamento jurídico”.

 

É na Constituição onde se encontra o conjunto de preceitos basilares atinentes à economia. É o que constitui a essência da Constituição Económica, que se refere aos princípios, normas ou institutos jurídicos constituintes da ordem económica.

 

Na actual Constituição da República de Moçambique, aprovada em 16 de Novembro de 2004, o regime jurídico fundamental da ordenação da actividade económica encontra-se, no essencial, consagrado no Título IV – dedicado a Organização Económica, Social, Financeira e Fiscal, em especial nos artigos 96 a 111.

 

Todavia, existem muitos outros preceitos que contém normas que não regulam directamente a actividade económica mas cujo conteúdo tem uma aplicação indirecta ou mediata no que diz respeito à conformação da actuação dos vários agentes económicos no ordenamento jurídico moçambicano, como acontece, por exemplo, quanto ao reconhecimento e garantia do “Direito de Propriedade Privada” e sua protecção (artigos 82 e 83 da CRM), o “Princípio da Igualdade” (artigos 35 e 36 da CRM), “Liberdade de Associação” (artigo 52 da CRM), e ainda a “Garantia dos Direitos e Liberdades Fundamentais” (artigos 56 a 72 da CRM).

 

2º)   Convenções Internacionais[2] (Tratados e Acordos no âmbito da actividade económica, quer sejam de natureza bilateral, multilateral ou provenientes de organizações internacionais como o FMI, Banco Mundial, etc).

 

Segundo o nº 2, do artigo 18 da Constituição da República de Moçambique de 2004, “as normas de direito internacional têm na ordem jurídica interna o mesmo valor que assumem os actos normativos infraconstitucionais emanados da Assembleia da República e do Governo”).

 

3º)   Leis e Resoluções da Assembleia da República

 

A Lei da Assembleia da República é uma das mais importantes fontes do Direito em geral, e do Direito Económico em especial, pois em última instância, ela representa a vontade do povo manifesta através deste órgão.

 

De acordo com o nº 1 do artigo 169 da CRM de 204, “ a Assembleia da República é o mais alto órgão legislativo na República de Moçambique”, daí que grande parte das normas jurídicas que regulam a ordenação da actividade económica resultem da aplicação das leis emanadas da Assembleia da República.

 

No que diz respeito ao Direito Económico, o poder legislativo da Assembleia da República encontra-se claramente definido no nº 2, do artigo 169 da CRM de 2004, que indica que “a Assembleia da República determina as normas que regem o funcionamento do Estado e a vida económica  social através de Leis e deliberações de carácter genérico”.

 

É assim que, em matéria económica a Assembleia da República tem competência para: legislar sobre as questões básicas da política interna e externa do país (nº 1 do artigo 179 da CRM), deliberar sobre as grandes opções do Plano Económico e Social e do Orçamento do Estado e os respectivos relatórios de execução (alínea l) do nº 2 do artigo 179 da CRM).

 

Através destas disposições observa-se que irá caber à Lei da Assembleia da República, dotada de um elevado grau de generalidade e abstracção, estabelecer o regime jurídico básico, isto é definir os aspectos essenciais do enquadramento jurídico da actividade económica, cabendo por sua vez a outros actos normativos (como por exemplo, o Decreto do Conselho de Ministros, Aviso do Banco de Moçambique, etc), proceder à sua regulamentação, isto é, definir os aspectos específicos necessários à sua execução.

 

4º)   Decretos-Leis, Decretos e Resoluções do Conselho de Ministros

 

Além das Leis da Assembleia da República, são actos normativos os Decretos e as Resoluções do Conselho de Ministros (artigos 143 e 210 da CRM de 2004 e artigo 157 da CRM de 1990).

 

Em matéria económica o Conselho de Ministros tem competência para emitir normas que visem:

  • promover o desenvolvimento económico (artigo 203, nº 1 da CRM),
  • preparar o Plano Económico e Social (alínea e) do nº 1 do artigo 204 da CRM),
  • promover e regulamentar a actividade económica e dos sectores sociais (alínea f) do nº 1 do artigo 204 da CRM),
  • estimular e apoiar o exercício da actividade empresarial e da iniciativa privada e proteger os interesses do consumidor e do público em geral (alínea e) do nº 2 do artigo 204 da CRM),
  • promover o desenvolvimento cooperativo e apoiar à produção familiar (alínea e) do nº 2 do artigo 204 da CRM).

 

O Conselho de Ministros desempenha um papel fundamental de regulação, concretização e execução do regime jurídico básico estabelecido pela Assembleia da República, através da Lei.

 

5º)   Regulamentos do Governo e do poder local (Municípios) e outras instituições públicas (por exemplo, Avisos do Banco de Moçambique).

 

10.    EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PAPEL DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÓMICO

10.1.         O Estado Liberal

 

O liberalismo é uma “teoria económica” e uma “teoria política” que tem propiciado a compreensão do Estado liberal enquanto “Estado mínimo”, “Estado limitado”, “Estado polícia” ou “Estado guarda nocturno”, em suma, um “Estado mínimo” que se restringe “às funções de protecção contra a violência, o roubo e a fraude, bem como às funções que permitam o cumprimento de contratos.

 

O Estado Liberal tinha que garantir o direito à propriedade privada e assegurar as liberdades para que todos pudessem desenvolver as actividades económicas.

 

Caracterizado pela liberdade individual, defesa da propriedade privada, liberdade económica e  livre concorrência.

 

Os seus elementos caracterizadores são:

 

                                           de iniciativa

  • Liberdade de empresa

                                                de trabalho

                                                de consumo

 

  • Propriedade privada como princípio e instituição fundamentais;

 

  • Mercado como instituição instrumental de regulação espontânea;

 

  • Abstenção do Estado com eventual admissão de intervenção coerentes com a lógica do mercado ou ligeiramente correctivas.

 

As teorias económicas do Estado Liberal partiam do pressuposto que a nova ordem económica deveria assentar no princípio da liberdade. Assim, para os economistas (Adam Smith, Jean-Baptiste Say, etc.) o indivíduo era soberano e livre, deveria ter liberdade de iniciativa – poder utilizar e aplicar livremente os seus meios de produção na actividade económica. As empresas deveriam ter liberdade de concorrência – mas como seria assegurado o equilíbrio da actividade económica? A resposta encontrava-se no mercado. Os mecanismos do mercado (leis da oferta e da procura) eram auto-reguladores, determinavam o que produzir e em que quantidades, as remunerações dos factores produtivos, etc. Adam Smith afirmava que: “uma mão invisível regularia a ordem natural das coisas e permitiria conciliar o interesse individual e geral”.

 

A intervenção do Estado na esfera económica era considerada inútil, ou até mesmo prejudicial para o seu funcionamento. Deveria limitar-se a promover o consenso a nível da sociedade, de forma a garantir o desenvolvimento harmonioso da economia. Poderia também regulamentar juridicamente a actividade económica no sentido de fazer respeitar a livre concorrência, garantir a estabilidade monetária e orçamental, etc. – esta concepção de Estado costuma designar-se por Estado Liberal.

10.2.         O Estado Social

 

 

A seguir à 2ª  Guerra Mundial, numa fase de expansão capitalista caracterizada por um modelo de regulação político-social com o modelo de regulação económico o Estado-providência, o “intervencionismo”, o “Estado social” ou o “Estado dos serviços” começa a impor-se.

 

O papel jurídico do Estado alargou-se a todas as esferas de actividade, com destaque para a economia e a sua actividade assumiu finalidades próprias, distintas das dos indivíduos.

 

Os traços essenciais do Estado Social são: o esbatimento da distinção entre o direito público e o direito privado e a funcionalização crescente da autonomia privada à vontade dos poderes públicos bem como o papel positivo da norma jurídica na conformação da vida económica e social.

 

A ordem jurídica do Estado intervencionista atribui à norma jurídica um papel completamente diferente do que tinha anteriormente. A norma jurídica assume agora um conteúdo económico e social perdendo a neutralidade que a caracterizava na fase liberal.

 

O Estado não poderia continuar a ser inútil mas sim passar a intervir em áreas específicas da economia, tais como o investimento, o emprego, o consumo – Estado Intervencionista. Keynes propunha uma intervenção directa do Estado para combater a crise.

 

O Estado, para promover o bem-estar social da comunidade deverá:

- proteger os indivíduos dos riscos decorrentes da sua actividade (desemprego, doenças, acidentes, idade, etc.);

- garantir uma maior justiça social através de uma distribuição mais equilibrada dos rendimentos;

- satisfazer as necessidades colectivas;

 

Em termos Económicos:

O principal objectivo do Estado é estabilizar a actividade económica, evitar e corrigir desequilíbrios que possam provocar uma crise económica, ou seja, assegurar o crescimento, o pleno emprego, a estabilidade dos preços e o equilíbrio das relações comerciais com o exterior.

 

Para realizar com eficácia esta função o Estado deverá fixar as metas a atingir e escolher os meios que poderá utilizar para atingir esses objectivos. O Estado para isso dispõe de instrumentos de intervenção na actividade económica como a regulamentação jurídica da actividade económica, a elaboração de planos reguladores da economia, a produção de bens e serviços para satisfazer necessidades colectivas ou para serem comercializados (empresas públicas).

 

10.3.         O Estado Democrático de Direito

 

O “Estado de Direito”, representada pela vinculação jurídica do poder do Estado submetido ao Direito.

 

As características básicas do Estado Democrático de Direito, tendo em vista a correlação entre os ideais de democracia e a limitação do poder Estatal são as seguintes:

 

  1. soberania popular, manifestada por meio de representantes políticos;
  2. sociedade política baseada numa Constituição escrita, reflectidora do contrato social estabelecido entre todos os membros da colectividade;
  3. respeito pelo princípio da separação dos poderes, como instrumento de limitação do poder governamental;
  4. reconhecimento dos direitos fundamentais, que devem ser tratados como inalienáveis da pessoa humana;
  5. preocupação com o respeito aos direitos das minorias;
  6. igualdade de todos perante a lei, no que implica completa ausência de privilégios de qualquer espécie;
  7. responsabilidade do governante, bem como temporalidade e electividade (eleições) desse cargo público;
  8. garantia de pluralidade partidária;
  9. “império da lei”, no sentido da legalidade que se sobrepõe à própria vontade governamental.

 

Percebe-se, portanto, que a visão predominante nessas características implica as características que embasaram a formação do “Estado de Direito”, ou seja, a preocupação com a limitação do poder do Estado.

11.    O DIREITO ECONÓMICO NO CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO

 

O termo globalização ainda não tem uma definição acabada. Pode-se tentar definir globalização como um processo no âmbito internacional que visa o aprofundamento das relações entre Estados, no âmbito económico, culutural, político e social, tendo como fim último o bem estar mundial.

 

Alguns autores defendem que a noção de Globalização  tem um duplo sentido:

 

  1. No sentido material ou descritivo – globalização é a unificação do campo económico mundial ou a extensão desse campo na escala do mundo.

 

  1. No sentido normativo – globalização designa uma política económica que visa unificar o campo económico por todo um conjunto de medidas jurídico-políticas destinadas a suprimir todos os limites a essa unificação entre os Estados.

 

A globalização não se trata apenas de um conceito ou movimento económico, pelo contrário contém um fundamento político e ideológico deliberado com a finalidade de liberalizar o comércio e facilitar a circulação do capital.

 

Para a sua implementação ou concretização intervém o Direito Económico que disciplina o modo como as relações político-económicas entre os Estados irão processar-se, através de tratados, convenções e acordos de natureza económica.

 

As vantagens da globalização inferem-se no âmbito dos objectivos que o processo suscita e pretende atingir, os quais se traduzem no bem estar social. As economias adormecidas ou aquelas que, por qualquer razão não se mostram capazes de, sozinhas, poderem competir no mercado, encontram, na globalização, o meio de se relançarem partilhando as facilidades que o processo lhes concede.

 

O desenvolvimento de novas relações entre Estados, bem como a abertura das economias ao comércio internacional e ao investimento, constituem iuma das vantagens oferecidas aos Estados pela globalização, como forma de desenvolvimento de tecnologias de continuidade ou de ponta.

 

Toda a movimentação e articulação da globalização é inspirada no modelo económico neoliberal, e isso tem repercussão jurídica, na medida em que o Direito necessita dar suporte para esse modelo.

 

Alguns passos decisivos para a actual economia internacional podem ser identificados a partir da segunda metade do Século XX, sobretudo após a 2ª Guerra Mundial, quando começou a surgir a Ordem Económica Internacional, destacando-se: 

 

  1. Os acordos de Bretton Woods (1944), que criaram o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o sistema de pagamentos internacionais, e o Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), base dos sistemas de cooperação financeira internacional para o desenvolvimento;

 

  1. A criação do GATT (General Agreement on Tariffs and Trades), Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, em Genebra em 1974, que foi extinto em 1994, e substituído pela criação da Organização Mundial do Comércio (OMC);

 

  1. O Plano Marshall, nos Estados Unidos da América (EUA), em 1948, concebido para ajudar a erguer a economia dos países europeus em crise em virtude da 2ª Guerra Mundial;

 

  1. A criação da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento), visando a cooperação Europeia;

 

  1. A criação progressiva de organizações económicas e financeiras internacionais nas Nações Unidas (ONU);

 

  1. Tratado de Roma, em 1957, preconiza uma aproximação maior dos países europeus, estabelecendo o Mercado Único Europeu, e em 07/12/1992 é firmado o Tratado de Maastricht, formalizando o surgimento da Comunidade ou União Europeia (UE);

 

  1. Surgimento de blocos económicos: na Europa a União Europeia, na América do Sul o MERCOSUL - Mercado Comum do Sul, em África a SADC- Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, CEDEAO - Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental, Comunidade da África Oriental (em inglês: East African Community – EAC), etc.

 

[1] O Direito Administrativo se incumbe de dar corpo e de reger parte parte da administração interna das empresas criadas pelo Estado (Empresas Estatais e Empresas Públicas, que são criadas por Lei), para se identificar com a administração própria do Estado. Mas no momento em que essas empresas/entidades  começam a actuar como sujeitos da actividade económica e como instrumentos da política económica, observam os princípios da ideologia Constitucional económica (Direito Constitucional Económico). Assim o Direito Administrativo se insere na esfera do Direito Económico.

[2] Os tratados normativos têm um valor hierárquico inferior à Constituição e superior às Leis e Decretos-Leis.