Desde sempre, Moçambique foi um país rico em diversidade cultural e recursos naturais, por essa razão, foi palco de intercâmbio entre povos oriundos de várias partes do mundo. Assim, penetração mercantil estrangeira é o período em que as relações entre as comunidades moçambicanas e outros povos se traduziram em trocas comerciais a partir das quais se verificou uma penetração estrangeira gradual em todas as esferas da vida daqueles, no período que se estendeu desde aos anos 800 até 1886 (séc. IX-XIX). Estas relações conheceram duas etapas: a de Penetração mercantil afro-asiática e a de Penetração mercantil Europeia e a Indiana.
É preciso destacar 3 fases ou ciclos de penetração mercantil, de acordo com os produtos mais traficados, a saber:
– Ciclo de ouro (1505-1693);
– Ciclo de marfim (1693-1762); e
-Ciclo de escravos (1762-1836) em termos de tráfico legal; e
– A partir de então, entrou em vigor o Comércio de Oleaginosas, que se iniciou em 1860, onde amendoim e o gergelim eram vendidos a partir de casas comerciais e feitorias da Ilha de Moçambique, Quelimane, Inhambane, Lourenço Marques e Ibo.
Fora destes produtos, também foram comercializados os seguintes produtos: pele de animais, penas de alguns animais, carapaças de tartaruga, cerra de abelha. As três fases de penetração são caracterizadas pelo forte impacto qua a procura de cada uma destas mercadorias teve sobre as comunidades locais.
É importante referir que a penetração mercantil estrangeira corresponde a grande etapa de integração da costa oriental africana no comércio internacional.
Contexto Geral da Penetração Mercantil Árabe-Persa em África
Antes do século XVI, o comércio no Oceano Indico era controlado pelos muçulmanos. No sub-continente asiático as suas actividades eram dominantes ao longo da costa de Malabar até baixo Calicute . A indicação mais antiga a cerca de Sofala
ncontra-se em Al-Masud, viajante árabe do século X que refere, que “os marinheiros de Oman, da tribo de Alazd, viajavam nos mares de Zanga até Kambala (Congo) e Sufalh”. A principal mercadoria era o ouro e o marfim. No século X (ano de 930), instalaram-se na costa africana, refugiados árabes criando as cidades mercantis de Bravo e Mogaxo (Somália).
Os árabes foram os primeiros povos estrangeiros que chegaram a Moçambique no séc. IX, provenientes da Pérsia (península arábica), ou seja, do Golfo Pérsico e fixaram se primeiramente na região costeira, concretamente na Ilha de Moçambique e Quelimane, e mais tarde, a partir do século XIII maior número de asiáticos fixaram-se em entrepostos comerciais na costa oriental africana no vale do Zambeze e no planalto do Zimbabwe.
Geógrafos referem que no séc. X (943 n.e) desenvolveu-se um comércio activo nas terras de Sofala (Zanj).Al–Massudi por exemplo viajante e geógrafo que descreveu sobre o comércio de Sofala.
Portanto, a actividade mercantil asiática na conta norte de Moçambique teve início por volta o séc.IX. O OURO produzido no interior e o MARFIM inicialmente fornecido pelos caçadores macuas foram os primeiros produtos de troca em Moçambique. Em troca, os chefes moçambicanos recebiam tecidos de seda, louça de vidro e porcelanas.
O contacto permanente entre as populações moçambicanas da costa norte e os mercadores asiáticos contribuíram para o desenvolvimento de formações sociopolíticas, económicas, religiosas e culturais.
NB: No séc. XII, indonésios juntaram-se aos árabes comerciando com os povos do litoral, trocando produtos orientais por ouro, marfim, pele de leopardo, carcaça de tartaruga, âmbar cinzento e alguns escravos. Indianos e chineses também frequentaram a costa oriental africana. Portanto, a actividade mercantil asiática na costa norte de Moçambique teve início por volta do século IX. Relatos de viajantes e comerciantes árabes apontam Sofala como tendo sido o limite extremo ao sul, visitado por mercadores proveniente do Golfo Pérsico e da Península Arábica, muito antes da chegada dos portugueses nos finais do século XV.
Exportavam: o ouro produzido no interior e o marfim, inicialmente fornecido pelos caçadores macuas da costa de Nampula, foram os primeiros produtos asiáticos em Moçambique.
Importavam: tecidos de seda, louça de vidro e de porcelana, artigos que as populações africanas ainda não produziam apareceram nas formações sociais moçambicanas como resultado directo dos contactos comerciais com os mercadores asiáticos.
Os árabes usufruíram-se de vários factores de ordem técnica, geográfica, económica e ideológica, uma das suas grandes motivações para proclamar e espalhar a sua fé, a fé no islão.
Fatores da penetração mercantil árabe-persa
Fatores geográficos ou naturais
A Península arábica apresenta-se como um território maioritariamente árido e infértil. Maior parte da paisagem na península arábica é desértica, o que levou a seus habitantes a procurarem novos territórios habitáveis e propícios para a prática de actividades económicas.
O outro factor geográfico é a proximidade geográfica entre Moçambique e a Península Arábica, era relativamente
alcançável por mar e por terra.
Fatores Técnicos
A expansão árabe-persa e do islão foi possível porque os árabes tinham um grande conhecimento da arte de navegar, da
cartografia, e consequentemente conheciam bem a costa leste do continente africano. Para realizar uma boa navegação, os árabes tinham conhecimentos consolidados e astronomia.
Fatores Económicos
Os árabes tanto em ouros tempos, como na actualidade, foram sempre bons comerciantes. Moçambique no século VIII, apresentou-se como um bom mercado tanto para a venda de produtos asiáticos como para a compra de produtos africanos.
Factores Ideológicos
Um dos pressupostos da expansão árabe para alguns consiste na expansão do islamismo a fim de cativar e converter mais fiéis. Este fenómeno expansionista conheceu a sua fase forte de expansão logo após a ascensão de Maomé. Neste sentido, os árabes expandiram-se para Moçambique também com a motivação de difundirem o islão.
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Os contactos ao longo da costa e suas repercussões
Desde o século IX, marcas da presença árabe na costa oriental moçambicana são evidentes. Esta presença foi movida essencialmente pela vontade de fazer comércio. populações oriundas do Golfo Pérsico estabeleceram-se principalmente na Ilha de Moçambique e em Quelimane.
A presença árabe em Moçambique trouxe melhorias na arte de navegação, na criação de entrepostos comerciais, na definição dos produtos a produzir/comercializar, no aparecimento de outros povos prontos para o comércio. contudo, esta ligação árabe-persa e habitantes do actual território de Moçambique teve as suas interrupções devido a presença portuguesa em Moçambique a partir do século XV.
Consequências da Presença Árabe-Persa em Moçambique
Os contactos com carácter permanente entre as populações moçambicanas na costa norte e os mercadores asiáticos contribuíram para o desenvolvimento de transformações sócio-políticas, económicas, religiosas e culturais.
A nível político
Emergiram e desenvolveram-se unidades políticas nas costas de Cabo Delgado e de Nampula com sistemas políticos árabes. Tais unidades políticas foram os Sultanatos de Angoxe e os Xeicados de Sangage, Quitangonha e Sancul.
A nível económico: foram introduzidas plantas alimentícias como o arroz de regadio, o coqueiro, a bananeira, o inhame, os citrinos, etc. detêm ainda hoje certa influencia no comércio e na indústria hoteleira: Hiper Maputo (Maputo), Hotel Milénio (Nampula), Pemba Beach Hotel (Pemba), Hotel Executivo (Nampula), etc.
No plano cultural: os casamentos, os contactos comerciais e o surgimento de novos hábitos e línguas resultantes da fusão de hábitos e línguas africanas e árabe, resultaram, por exemplo, na cultura Swahili na Tanzania e no Quénia e Cabo Delgado.
Em Moçambique resultaram os seguintes núcleos linguísticos: Mwani – na costa de Cabo Delgado; o Nahara – na Ilha de Moçambique e na costa de Nampula, e os Koti em Angoxe. O uso de brincos no nariz, o modo de vestir, nas construções, nos casamentos, no enterramento dos mortos, etc.
Importa realçar também a Dança Tufo, praticada e executada com mestria na província de Nampula, sobretudo nas regiões costeiras como Morna, Angoxe, Ilha de Moçambique, Mossuril, Nacala Porto entre outros locais. Outras evidências de penetração árabe encontram-se nos nomes das pessoas, particularmente na zona costeira moçambicana onde existem nomes como Atumane, Mussa, Saide, Ornar, Gulamo, Cassamo, Patel, entre outros..
A nível Ideológico: a islamização da população (a construção de islamismo no actual território de Moçambique que até aos nossos dias tem se verificado a expansão desta religião.
Interrupção na penetração árabe-persa em Moçambique
No século XII Mogadíscio (capital da actual Somália) assume-se também como centro de absorção dos rendimentos do comércio do ouro vindo de Sofala. A hegeminia comercial de Mogadíscio termina com o surgimento de novos centros comerciais no Índico: Quiloa, Komores, Wamizi, Querimba, Ilha de Moçambique e Sofala.
Este período da presença árabe (Primeiro) em Moçambique foi interrompido pela chegada dos portugueses, nos finais do século XV. Dois séculos mais tarde viu-se um renascimento da presença árabe, precisamente em fins do século XVII e princípios do século XVIII. Neste período, foram tomadas as cidades que se encontravam sob o domínio português, como por exemplo, Mombaça.
Referencias
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KI- ZERBO, Joseph. História de África Negra. Mira Sintra, Publicações Europa – América; Vol. I, 3ª ed. 1999.
NEWITTI, Malyn. História de Moçambique. Edição, Publicações Europa – América, 1997
SOUTO, Amélia de Neves. Guia Bibliográfico para Estudante de História de Moçambique. (200/300-1930), Maputo, 1996.
https://sopra-educacao.com/2021/02/11/a-penetracao-mercantil-estrangeira/
https://www.escolamz.com/2021/06/Os-Estados-em-Mocambique-e-a-Penetracao-Mercantil-Estrangeira.html
https://www.portaldogoverno.gov.mz/por/Mocambique/Historia-de-Mocambique/Penetracao-Colonial
http://ead.mined.gov.mz/site/wp-content/uploads/2020/03/Historia6-2%C2%BA-Ciclo.pdf