1. Conceitos de Solidariedade

Segundo LÉVINAS (1969), A solidariedade pode ser definida de várias maneiras, dependendo do contexto em que é aplicada. Em seu sentido mais amplo, solidariedade refere-se à ligação interpessoal baseada na cooperação mútua, compaixão e apoio recíproco.

Outra abordagem conceitual é fornecida por Ricoeur, que descreve a solidariedade como um "sentimento ético" que une os seres humanos em uma comunidade moral, baseada na responsabilidade mútua e na preocupação com o bem-estar dos outros. Além disso, Lévinas enfatiza a dimensão ética da solidariedade, destacando-a como uma resposta à vulnerabilidade e ao sofrimento do outro.

  • Tipos de Solidariedade

Durkheim, em sua obra seminal "Da Divisão do Trabalho Social", propôs uma distinção entre solidariedade mecânica e orgânica. A solidariedade mecânica é caracterizada pela semelhança e homogeneidade entre os membros de uma sociedade, enquanto a solidariedade orgânica surge da interdependência e diferenciação funcional.

Solidariedade Mecânica - A solidariedade mecânica em uma sociedade vai além da soma dos indivíduos (suas consciências individuais), ela se constitui na consciência colectiva. Ela está presente em sociedades que são primitivas ou pré- capitalistas, consideradas mais “simples” como, por exemplo, as tribos indígenas. Conforme a força da consciência colectiva aumenta, mais intensa é a solidariedade mecânica. Essa sociedade possui a presença de um sentimento comum de pertencimento – a uma nação, religião ou família – que é então encontrado em todas as consciências individuais (DURKHEIM, 1893).

Solidariedade Orgânica - Nas sociedades industriais, bem como nas sociedades organizadas, a harmonia social deriva essencialmente da divisão do trabalho. O que a caracteriza essas sociedades é a cooperação que é produzida naturalmente, pois cada individuo persegue seus próprios interesses. Basta que cada um se dedique a uma função especial para se encontrar, pela força das coisas, solidário aos outros. Solidariedade orgânica é predominante nas sociedades ditas “modernas” ou “complexas”, do ponto de vista da maior diferenciação individual e social (sociedade capitalista) (Idem).

Solidariedade Social - Refere-se ao apoio e suporte oferecido por indivíduos, comunidades ou instituições a membros necessitados da sociedade. Isso pode incluir assistência financeira, alimentar, moradia e acesso a serviços básicos, como saúde e educação;

Solidariedade Comunitária - Este tipo de solidariedade surge dentro de comunidades locais ou grupos sociais específicos, onde os membros compartilham laços de identidade, cultura e objectivos comuns. A solidariedade comunitária fortalece os laços sociais e promove a cooperação para resolver problemas locais;

Solidariedade religiosa - É uma forma de coesão social que se baseia nos princípios e valores compartilhados por uma comunidade religiosa específica. As religiões têm desempenhado um papel significativo na promoção da solidariedade ao longo da história, unindo os crentes em torno de crenças comuns, rituais, práticas espirituais e obrigações morais;

Solidariedade Internacional - Envolve a cooperação entre nações e comunidades globais para enfrentar desafios comuns, como desastres naturais, pobreza, conflitos e mudanças climáticas. Organizações internacionais, como a ONU e a Cruz Vermelha, desempenham um papel fundamental na promoção da solidariedade global (Idem).

  1. As formas de solidariedade social

Visando analisar as formas de solidariedade social, Durkheim traça um método que visa identificá-las a partir da análise do direito. Considerando que o direito reproduz as formas principais de solidariedade social, ele classifica os diferentes tipos de direito para descobrir quais seriam as diferentes espécies de solidariedade social que correspondem a eles. Sua intenção era de descobrir uma espécie do direito que simbolizasse a solidariedade social propiciada pela divisão do trabalho. Com a preocupação em proceder de forma metódica, realiza sua análise através do estudo das sanções, pois sua intenção era a de encontrar uma característica que ao mesmo tempo em que fosse essencial aos fenómenos jurídicos fosse capaz de variar quando eles variam. Assim, classifica as normas jurídicas de acordo com as diferentes sanções que são ligadas a elas (DURKHEIM, 1983, p.40).

  • Solidariedade e desenvolvimento local

O processo de desenvolvimento participativo proposto pelas entidades da economia solidária envolve a comunidade e a participação igualitária ao nível do desenvolvimento local. As iniciativas locais de desenvolvimento social e emprego dinamizam a economia solidária, em domínios como os serviços de proximidade ou “serviços de solidariedade”, e a recuperação do património urbano. Para a execução destas metas, contribuíram um conjunto de instrumentos enquadrados no mercado social de emprego (escolas-oficinas; programas e actividades ocupacionais (BALLET, 1997).

A solidariedade desempenha um papel fundamental no desenvolvimento local, pois é um elemento essencial para promover a coesão social e a colaboração entre os membros de uma comunidade. O desenvolvimento local se refere aos esforços direccionados para melhorar as condições de vida em uma determinada área geográfica, priorizando a participação activa e o empoderamento das comunidades locais. A solidariedade, nesse contexto, pode se manifestar de várias maneiras:

  • Cooperação Comunitária: A solidariedade promove a cooperação entre os membros da comunidade, incentivando-os a trabalhar juntos para identificar problemas locais, desenvolver soluções e implementar projectos que atendam às necessidades locais;
  • Redes de Apoio: A solidariedade fortalece as redes de apoio dentro da comunidade, onde os membros se ajudam mutuamente em momentos de dificuldade. Isso pode incluir apoio emocional, compartilhamento de recursos e assistência prática;
  • Engajamento Cívico: A solidariedade inspira o engajamento cívico, encorajando os membros da comunidade a se envolverem em actividades voluntárias, grupos de defesa e processos de tomada de decisão local. Isso contribui para uma maior participação democrática e uma sensação de responsabilidade colectiva pelo desenvolvimento da comunidade;
  • Economia Solidária: A solidariedade também pode se manifestar na forma de iniciativas económicas solidárias, como cooperativas, associações de produtores e microempresas comunitárias. Essas formas de organização económica priorizam a equidade, a colaboração e o bem-estar colectivo, contribuindo para o desenvolvimento económico local de uma maneira sustentável e inclusiva (Idem).
    • O princípio da solidariedade

A solidariedade é um valor ético-moral; no âmbito jurídico ela é considerada u m princípio. O pensamento clássico não fez a distinção entre valor e fim. O valor é sempre bipolar porque a um valor se contrapõe um desvalor, por exemplo: ao bom se contrapõe o mau; ao belo, o feio; ao nobre, o vil, de forma que o sentido de um exige o do outro. Eles são entidades vectoriais que apontam para um determinado ponto reconhecível com o fim. Assim, o "fim é o dever ser do valor reconhecido racionalmente como o motivo do agir" Portanto, tudo aquilo que vale, vale para alguém. Outros definem a solidariedade como um sentimento, isto é, algo que pertence à ordem da existência, é um a relação concreta entre coisas (Gusmão, 2000, p. 211).

Este tipo conhecimento não se dá pela razão, mas nos é dado pela intuição. Assim, a solidariedade com o sentimento está ligada a valores que se aprendem intuitivamente. Segundo Pascal, os sentimentos podem ser negativos ou positivos, mas são apreendidos por meio do espírito àafinesse. Por exemplo, a indiferença consciente é um sentimento negativo (é o desprezo), mas a generosidade é um sentimento positivo (Idem).

  • O dever de solidariedade

Apesar da polissemia de sentidos, o princípio da solidariedade não se confunde com a compaixão ou com a caridade, porque na sociedade contemporânea ele se constitui com o um dever social. Este dever social se traduz nas Constituições modernas, e m primeiro lugar, com o dever de assistência entre os indivíduos, do Estado e demais organizações num a relação de reciprocidade (Ibidem:212).

N o âmbito do Direito Civil, a solidariedade está ligada à ideia de reciprocidade em virtude do vínculo biológico; por exemplo: avós que cuidam dos netos, filhos que se responsabilizam pelos pais, irmãos que assumem a tutela dos que possuem problemas de saúde, etc. Mas ela pode decorrer da situação social vinculada a um modelo de Estado do Bem-estar Social. Neste caso, a ideia envolve um a pluralidade de instituições e m que o compromisso é com a sobrevivência das futuras gerações. Se a reciprocidade ou equivalência das prestações é suficiente no âmbito do direito civil, ela deixa de ser suficiente quando se refere aos direitos ambientais (Idem).

  1. Conclusão

A solidariedade é um princípio fundamental que sustenta as relações humanas e promove a coesão social e o bem-estar comum. Através de diferentes formas e tipos, a solidariedade fortalece os laços interpessoais, fomenta a cooperação e ajuda a enfrentar desafios individuais e colectivos. Portanto, compreender e promover a solidariedade é essencial para a construção de sociedades mais justas, inclusivas e sustentáveis. m um mundo marcado por desafios sociais, económicos e ambientais, a solidariedade emerge como um farol de esperança e transformação. Ao reconhecermos a interdependência entre todos os membros da sociedade e ao nos comprometermos com os princípios de justiça, colaboração e responsabilidade compartilhada, podemos criar comunidades mais fortes e coesas. A solidariedade nos instiga a agir em prol do bem comum, a apoiar aqueles que estão em necessidade e a promover a inclusão e o respeito mútuo. Portanto, ao abraçarmos os princípios de solidariedade em nossas vidas diárias e em nossas estruturas sociais, podemos construir um mundo onde todos tenham a oportunidade de prosperar e onde ninguém seja deixado para trás.

5.      Referências bibliográficas

Ballet, J. (1997). Les entreprises d'insertion. Paris: PUF

Durkheim, É. (1893). Da divisão do trabalho social. Editora Martins Fontes.

Gusmão, Rute (2000). A Ideologia da solidariedade. Serviço Social e Sociedade. São Paulo: Cortez, v.21, n. 62.

Lévinas, E. (1969). Totality and Infinity: An Essay on Exteriority. Duquesne University Press.