No princípio do século XIX, quando as restrições ao tráfico praticamente não existiam, uma média de 10 a 15 mil escravos saíam anualmente da costa oriental de África. Por volta de 1860, quando os britânicos já patrulhavam parte da costa, essa cifra chegou a 20 mil. Números que continuaram elevados nas duas décadas seguintes.

O século XIX assistiu-se importantes acontecimentos que pareciam apontar para o fim do trabalho escravagismo, mas não obstante todas as mudanças legais e as novas nomenclaturas, a exploração do homem africano prosseguiria por praticamente um século e meio para além das primeiras leis anti-tráfico aprovadas por países europeus. O trabalho forçados nas colónias portuguesas ou os libres engagés franceses foram outras formas de dar continuidade à exploração desta mão-de-obra. O alvorecer de uma legislação que procurou mediar o fim do tráfico com o início da colonização não foi capaz de romper definitivamente com o peso da escravidão no continente. Nesse sentido, a historiadora Isabel Castro Henriques afirma que a escravidão, em Angola, e podemos generalizar para Moçambique também somente terminou com a independência em 1975. Os “serviçais de São Tomé”, por exemplo, continuaram sendo recrutados em Moçambique até os últimos anos da dominação colonial.

Para o funcionamento do tráfico clandestino de escravos era fundamental o contato com as redes ao longo da costa. No norte, as comunidades islâmicas desempenharam esse papel, enquanto que, mais ao sul, as famílias afro-portuguesas, geralmente detentoras dos prazos, garantiram o abastecimento, sempre contando com a benevolência dos governadores.

Moçambique sofreu diretamente as consequências das políticas abolicionistas a partir do fim do século XVIII, mas diferente do que se podia esperar, o tráfico conheceu na África Oriental um importante aumento a partir daí. Ao menos em Moçambique, ainda que em menor intensidade, o tráfico permaneceu até o início da colonização portuguesa no fim do século XIX, quando sistemas idênticos à escravidão foram criados para dar continuidade à exploração da força de trabalho dos africanos.